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terça-feira, dezembro 2, 2025

Giselle Beiguelman discute: arte com IA é arte? ?Censura algorítmica? e obsolescência desprogramada

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Em entrevista a Deu Tilt, a artista visual, professora universitária e pesquisadora Giselle Beiguelman desmonta a ideia de que existe “arte criada pela máquina”. Para ela, o que chamamos de arte com IA é sempre arte com tecnologia, feita com a máquina, e não por ela. A grande novidade, inédita na história da arte, é que a tecnologia agora toma decisões durante o processo criativo. Nenhum artista controla 100% seus instrumentos, mas a IA interfere nos rumos da criação. Quando alguém pergunta se arte com IA “é arte”, Giselle responde olhando para o processo. O prompt não é só descrição; é uma experiência que tensiona os meios de produção. A IA muda o campo artístico ao mesmo tempo em que amplia e ameaça. Copiar ficou fácil, criar continua difícil. No lugar do desvio de padrão, que sempre foi motor da arte, o risco é ficarmos presos numa jaula cibernética onde tudo é retroalimentado pelos mesmos arquivos hegemônicos. Arquivos inexistentes podem ser apontados, mas referências que fogem do padrão podem desaparecer. O repertório coletivo corre o risco de se diluir. Para Giselle, o debate gira em torno da democratização do acesso à arte, mas também em torno de quem controla os meios para criar -afinal, os melhores recursos já são pagos. A cultura do padrão reforça repertórios hegemônicos, e os maiores problemas da IA continuam sendo humanos: a reprodução de nossos vieses e modelos culturais.

A artista visual Giselle Beiguelman explicou, em entrevista ao Deu Tilt, que seu processo criativo com IA mudou radicalmente nos últimos anos. Antes, tudo era muito manual: ela criava ou customizava modelos, montava “datasets” e construía um percurso quase artesanal para cada obra. Hoje, o processo se tornou anárquico. Criar com IA virou uma grande conversa: um bate e volta constante, uma negociação infinita de resultados, com várias plataformas ao mesmo tempo. Cada ferramenta tem semelhanças e particularidades, e o prompt virou o ponto decisivo. Escolher palavras, ajustar sentidos e driblar a censura algorítmica é parte do processo. Giselle procura, de fato, co-criar com a máquina. Recentemente, ela criou, com a plataforma de geração de vídeos Sora, da OpenAI, um filme distópico em que o Amazonas é tomado por lixo eletrônico. A ideia era terminar com o nascimento de uma flor, mas a IA produziu uma cena que a própria artista não teria concebido sozinha. Para Giselle, a frustração de muitas pessoas com arte feita com IA vem de uma visão romântica e antropocêntrica da criação. A ideia de que arte é dom, genialidade individual e toque divino é típica de uma visão eurocêntrica, que não se repete em outras culturas. A IA expõe o clichê e obriga a repensar a criação como processo compartilhado, não como expressão de um só sujeito.

Para Giselle, a pergunta “quem é o autor da obra criada com IA?” aponta uma questão importante. Em entrevista ao Deu Tilt, ela afirma que o autor continua sendo quem negocia com a tecnologia, quem orienta, refina, tensiona e decide os caminhos do processo. A IA não cria sozinha e o artista existe como mediador, exatamente como acontece no cinema, que é o grande paradigma da autoria distribuída: ali convivem diretores, roteiristas, produtores, atores, montadores, técnicos. A arte é resultado de uma cadeia de produção. Nas artes visuais, esse deslocamento é mais radical, porque a tradição sempre colocou o artista como um sujeito único, quase solitário, responsável por tudo. A IA abre um campo onde a autoria é compartilhada. Mas existe um lado sombrio do processo. Giselle vê com preocupação a consolidação de uma economia da solidão, onde tudo pode ser feito sozinho, em casa, sem troca, sem conversa e sem equipe. Ela questiona também o impacto desses sistemas na inspiração humana. Como fica o futuro da criação quando lidamos com ferramentas que ocultam suas regras e seus limites? Como promover letramento digital se os próprios dispositivos não expõem seus processos internos e são orientados por interesses comerciais? É um cenário que exige atenção constante, porque redefine o que entendemos por criação e participação humana.

A artista reforçou o potencial da IA para antecipar catástrofes ambientais justamente por trabalhar em relações e padrões que humanos não conseguem enxergar. Mas esse avanço convive com uma distorção profunda: a lógica de obsolescência e consumismo que move toda a indústria tecnológica. O impacto é brutal, porque o digital foi construído de maneira anárquica, desprogramada, sem pensar em futuro ou consequências. A cada ano precisamos de um novo equipamento, um novo serviço, um novo modelo, e isso já faz parte do nosso cotidiano.



[Fonte Original]

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