A desaceleração da economia global, combinada à intensificação das tensões geopolíticas, tem aumentando a relevância de políticas industriais para promover o crescimento sustentável. No entanto, uma nova análise divulgada nesta sexta-feira (3) pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) alerta que, enquanto muitos países estão buscando remodelar suas economias usando o apoio público a empresas e setores específicos, os subsídios e outras políticas industriais podem custar caro e não ser eficazes.
A análise foi apresentada em um capítulo do próximo Panorama Econômico Mundial (WEO, na sigla em inglês), em que o FMI ressalta que as políticas industriais podem ajudar os países a atrair a produção e a se equipararem a outros participantes globais em um setor específico, mas também podem elevar os preços ao consumidor e levar a uma má alocação de recursos.
“Recentes políticas industriais assumem a forma de subsídios substanciais e buscam atingir múltiplos objetivos domésticos — desde ganhos de produtividade e avanço tecnológico até proteção de empregos e autossuficiência em setores-chave, incluindo energia“, diz o documento. “No entanto, a eficácia das políticas industriais não são garantida e depende do desenho, da implementação e das condições macroeconômicas mais amplas.”
Em meio ao aumento global da política industrial, o documento destaca que um terço de todas as políticas implementadas entre 2009 e 2022 foi voltado ao setor de energia. Segundo o FMI, muitos países estão buscando reduzir a dependência das importações de combustíveis fósseis promovendo a produção doméstica de tecnologias limpas.
O capítulo, que examinou políticas industriais na União Europeia (UE), China, Brasil e Coreia do Sul, alerta que mesmo quando bem direcionadas, as políticas industriais podem ser onerosas. A UE, por exemplo, poderá ter um custo de cerca de 0,4% de seu Produto Interno Bruto (PIB) no financiamento de um subsídio de tecnologia limpa suficiente para uma parcela significativa da produção onshore.
No bloco europeu, os auxílios estatais às empresas atingiram um pico de quase 1,5% do PIB em 2022, disse o FMI, observando que os fundos fornecidos pelos governos nacionais corriam o risco de distorcer a concorrência e corroer a igualdade de condições no mercado único da UE.
Segundo o FMI, a modelagem mostrou que o auxílio estatal proporcionou um impulso às empresas beneficiárias, aumentando as receitas e o emprego, mas apenas temporariamente. Além disso, o auxílio tende a excluir as empresas não beneficiárias que operam no mesmo setor.
“Se o auxílio estatal fosse necessário para tratar de falhas específicas do mercado, isso deveria ser feito em nível da UE, e não por estados-membros individuais, para mitigar as repercussões adversas”, disse o FMI.
O FMI também estima que a China, que há muito tempo usa ferramentas de política industrial para apoiar setores priorizados — como veículos elétricos e semicondutores — tenha gasto cerca de 4% de seu PIB em políticas industriais entre 2011 e 2023. Apesar de algum sucesso, a modelagem estrutural mostrou que essas políticas reduziram a produtividade agregada total da China em 1,2% e seu PIB em até 2%.
O estudo do FMI incluiu uma comparação da política industrial da Coreia do Sul e do Brasil na década de 1970, concluindo que o país asiático foi mais bem-sucedido em ajudar a expandir setores específicos, impulsionando a produção e o PIB.
“O Brasil enfatizou principalmente a industrialização por substituição de importações e recorreu a empresas estatais como principal veículo de implementação, enquanto a Coreia seguiu um modelo orientado para exportação, baseado em grandes conglomerados privados”, detalha o documento.
“Estudos empíricos recentes sobre a experiência coreana fornecem evidências causais de que a política industrial promoveu a expansão das indústrias-alvo, aumentou sua competitividade internacional e gerou efeitos de transbordamento positivos para outros setores”, completa.
A Coreia do Sul também criou uma supervisão estruturada e uma análise de desempenho de seus esforços, com metas de exportação que garantiam que as empresas que não atingissem as metas corriam o risco de perder o acesso ao apoio estatal. O Brasil não dispunha de salvaguardas comparáveis, segundo o relatório.
“Os casos demonstram o papel habilitador vital das reformas estruturais e da estabilidade macroeconômica”, diz o FMI. “No Brasil, um processo orçamentário fragmentado, a forte dependência de endividamento externo e a persistente instabilidade macroeconômica — incluindo períodos de câmbio sobrevalorizado e aceleração inflacionária — culminaram, na década de 1980, na crise da dívida externa e corroeram a efetividade da estratégia do país.”
O relatório não menciona os EUA, onde o governo do presidente Donald Trump adotou algumas ferramentas de política industrial nos últimos meses, incluindo a aquisição de participações acionárias em empresas com problemas, como a fabricante de chips Intel.
Por fim, o capítulo do FMI concluiu que, para serem bem-sucedidas, as políticas industriais devem ser cuidadosamente avaliadas, recalibradas e buscar melhorar o ambiente geral de negócios.
“Essas conclusões ressaltam a importância de um desenho e de uma implementação cuidadosa das políticas. Os governos devem estar atentos aos riscos de gastos ineficientes, especialmente quando a dívida está elevada e o espaço fiscal é limitado”, diz o Fundo. “Dessa forma, aumenta-se a probabilidade de que a política industrial cumpra sua promessa — sem comprometer a sustentabilidade fiscal ou a eficiência econômica.”