O ex-presidente dos Estados Unidos Barack Obama foi a estrela neste sábado em comícios na Virgínia e em Nova Jersey, às vésperas das únicas duas eleições para governador no país este ano. Os americanos vão às urnas na terça-feira, dia 4. Nova York, a maior cidade do país, também elegerá um novo prefeito. Embora aconteçam em redutos do Partido Democrata, elas funcionam como termômetro sobre o início do Donald Trump 2.0, além de oferecer pistas importantes para as eleições de meio de mandato de 2026, quando o Congresso será renovado.
Nos comícios, Obama criticou duramente Trump. E alertou para o risco que a democracia enfrenta no país.
— Não precisamos mais especular sobre os perigos para a nossa democracia. Não precisamos nos perguntar se pessoas vulneráveis serão prejudicadas, ou nos questionar o quão mais grosseira e cruel nossa cultura pode se tornar. Já vimos isso acontecer. Eleições importam! — afirmou o ex-presidente, durante comício em Norfolk, na Virgínia, observando que “agora as consequências estão claras”.
Obama, de 64 anos, reconheceu que muitos americanos, “preocupados com o aumento da inflação, os custos de energia e o aumento de aluguéis e hipotecas”, “arriscaram” ao apoiar Trump contra a ex-vice Kamala Harris nas eleições do ano passado, pois ele prometera atacar esses problemas. “Mas, nove meses após o início do segundo mandato do republicano, algo melhorou?”, perguntou Obama em discurso em Norfolk, na Virginia. A plateia respondeu, em alto e bom som: “Não”.
Até este fim de semana, Obama vinha desempenhando papel discreto nas campanhas. Mas anúncios televisivos comprados pelo Partido Democrata na Califórnia, que decidirá sobre uma controversa mudança no desenho dos distritos eleitorais do mais populoso estado do país, em Nova Jersey, e na Virgínia, passaram a destacar o ex-presidente e funcionaram como uma prova de sua influência, mais de uma década depois da última vez em que venceu as eleições para presidente. Por outro lado, também escancaram, apontam analistas, a falta de uma liderança nacional capaz de unificar o partido desde então.
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O ex-presidente tem buscado usar sua influência no Partido Democrata, especialmente após a derrota de Kamala, para reforçar posição de peso e unificadora. Mas, desde que deixou a Presidência, Obama fez campanha nas ruas apenas a uma candidata à prefeitura — Karen Bass, que é negra, em Los Angeles, em 2022 — e, assim mesmo, no último minuto, em uma disputa na qual ela corria o risco de perder as primárias democratas para um bilionário ex-republicano, Rick Caruso.
Tanto Nova Jérsei quanto Virgínia não votam há décadas em um candidato republicano, mas alternam governadores dos dois partidos, com a segunda tendo hoje um mandatário republicano. No geral, o partido que não ocupa a Casa Branca durante a votação tende a ter melhor desempenho nessa eleição.
‘Dose de maldade e loucura’
Na Virgínia, na noite deste sábado (1/11), Obama foi ovacionado por mais de 7 mil pessoas quando subiu ao palco. Ao lado da ex-deputada e candidata democrata ao governo do estado, Abigail Spanberger, que enfrenta nas urnas a vice-governadora Winsome Earle-Sears, do Partido Republicano, tratou da economia, um dos pontos centrais da campanha de Trump no ano passado, e bateu na tecla do “nós contra eles”, com políticas do novo governo voltadas, argumentou, para os mais ricos, e não para a maioria dos cidadãos:
— A economia está melhor para vocês? Porque certamente está melhor para Trump e a família dele. Para os cidadãos comuns, os custos não diminuíram, aumentaram, graças a essa política tarifária desastrosa — acrescentou Obama, referindo-se aos tarifaços que Trump impôs a diversos países para entrarem no mercado americano, o maior do planeta.
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Obama disse que era “difícil saber por onde começar”, pois “todos os dias a atual Casa Branca oferece às pessoas “uma nova dose de ilegalidade, imprudência, maldade e pura loucura”. Criticou também os republicanos no Congresso, dizendo que “eles se recusam a contradizer o presidente, mesmo quando sabem que ele está ultrapassando os limites”, e disse estar preocupado com a Suprema Corte que, em sua visão, demonstra “nenhuma disposição para conter os excessos desta administração”.
‘Com Trump, é um Halloween diário, e sem gostosuras’
A segunda parada de Obama foi em Newark, cidade mais populosa de Nova Jersey e com significativa população brasileira. O comício aconteceu em uma universidade local. O ex-presidente apresentou a deputada e candidata ao governo do estado, Mikie Sherrill, como “uma lutadora comprovada”. Sherrill concorre contra o republicano Jack Ciattarelli, apoiado por Trump, e, embora esteja à frente nas pesquisas, a diferença tem diminuído na reta final da disputa.
— Todos estamos sendo testados neste momento. Nossas convicções estão sendo testadas. Donald Trump e os republicanos querem que vocês acreditem que a mudança só pode vir de cima — disse o ex-presidente à multidão, que reagiu com uma intensa vaia à menção do republicano. — Não vaiem. Votem.
O democrata usou tom sarcástico para alfinetar o presidente. Aproveitando o fim de semana do Dia das Bruxas no país, Obama afirmou que, com Trump no poder, “é como se todo dia fosse Halloween, só que tudo assustador, sem gostosuras”. Também mencionou a reforma na Casa Branca, ironizando que o magnata “tem se concentrado em algumas questões críticas, como pavimentar o Jardim das Rosas para as pessoas não sujarem seus sapatos de lama e construir um salão de baile ao preço de US$ 300 milhões”.
Nos últimos anos, os republicanos do estado têm se animado com algumas disputas estaduais. Ainda que os democratas tenham uma vantagem de 2 para 1 em número de eleitores registrados, Ciattarelli, em Nova Jérsei, perdeu por apenas três pontos percentuais a disputa para governador em 2021. Trump, por sua vez, perdeu por apenas seis pontos percentuais para Kamala no estado na em 2024.
Outras eleições e esquerda em NYC
Além das eleições para governador nesses estados e a dos distritos eleitorais na Califórnia, também ocorrerão no próximo dia 4 eleições para a manutenção de cargos na Suprema Corte da Pensilvânia e disputas para diversas prefeituras em todo país, além de Nova York.
Apesar de não ter declarado formalmente seu apoio ao democrata de esquerda e socialista em Nova York, Zohran Mamdani, o ex-presidente Obama telefonou para o candidato a prefeito, elogiando sua campanha e oferecendo-se para ser um “conselheiro” para o futuro. A conversa telefônica privada teve duração aproximada de 30 minutos, segundo duas pessoas sob condição de anonimato, e ocorreu enquanto Obama viajava a caminho dos comícios em Virgínia e Nova Jérsei.
A ligação é a segunda entre os dois desde as primárias democratas e representa um importante sinal de apoio de Obama a líderes mais jovens e à esquerda do Partido Democrata, enquanto cabeças coroadas da velha guarda da sigla, inclusive em Nova York, têm mantido distância de Mamdani, visto como herdeiro da esquerda socialista representada pelo senador Bernie Sanders, independente de Vermont, e a deputada federal Alexandria Ocasio-Cortez, conhecida como A.O.C., virtual candidata ao Senado por Nova York no ano que vem.