Se Fernanda Torres e Fernanda Montenegro entraram para o elenco de “Ainda estou aqui” a partir de convites do diretor Walter Salles, que já havia trabalhado com a filha em “Terra estrangeira” e com a mãe em “Central do Brasil”, muitos nomes do elenco precisaram participar de testes para seus respectivos papéis. Mas também teve quem só estava passeando pela praia.
Foi o caso do jovem Guilherme Silveira, de 14 anos, que interpreta Marcelo Rubens Paiva no filme. Ele estava brincando com a família na praia do Leblon, na Zona Sul do Rio, quando foi abordado pela equipe da produção. Em um primeiro momento, inclusive, ele conta que estranhou a abordagem.
— Uma pessoa perguntou pro meu padrasto se eu queria fazer um teste para um filme. Minha mãe ficou desconfiada, aí falaram que era do Walter Salles. A gente ainda achava que era golpe, mas fui fazer o teste e passei — lembra Guilherme, que tinha 12 anos durante as filmagens.
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Fernanda Torres, Selton Mello e Fernanda Montenegro são os nomes do elenco no cartaz de “Ainda estou aqui”. Mas é certo dizer que o filme de Walter Salles, indicado ao Oscar em três categorias (melhor filme, filme internacional e atriz), não seria o mesmo sem a participação de outros cinco atores, que dão vida aos filhos de Eunice e Rubens Paiva nos anos 1970: Valentina Herszage, Luiza Kosovski, Barbara Luz, Guilherme Silveira e Cora Mora.
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Do jovem quinteto, Valentina, de 26 anos, Luiza, 25, e Barbara, 22, já tinham experiência como atrizes, enquanto Guilherme, de 14, e Cora, de 12, tiveram sua estreia.
— Mais do que semelhança física, buscamos crianças com um ritmo diferente. Estávamos fazendo um filme que se passa em outra época, em que as crianças não eram hiperestimuladas — explica Letícia Naveira, responsável pela seleção do elenco. — Procuramos por crianças que falassem de suas emoções e tivessem muita imaginação. Fazíamos perguntas um pouco existencialistas e víamos como a criança desenvolvia a fim de encontrar os talentos ideais para essa história.
“Ainda estou aqui” reconta a história real de Eunice Paiva (Fernanda Torres), que em 1971 teve seu marido, o ex-deputado Rubens Paiva (Selton Mello), capturado e morto por agentes da ditadura militar. O longa se baseia no livro homônimo escrito por Marcelo Rubens Paiva.
Enquanto Guilherme foi descoberto na praia, a seleção de Cora para viver a caçula Babiu (apelido de Beatriz) foi feita a partir de uma pesquisa em escolas do Rio, na qual eram feitas perguntas e era tirado um retrato. A foto de Cora chamou a atenção de Walter, que ficou impactado com o olhar da menina, então com 10 anos.
— Tudo foi realmente incrível, eu não tinha a menor ideia de como a produção de um filme funcionava. Achei impressionante a quantidade de pessoas envolvidas, e como tudo era extremamente pensado e planejado, nos mínimos detalhes — conta a mais nova do elenco, que escreveu um livro (“Os deslocados”, editora Comemora, 2023) durante os intervalos de filmagens.
Após o processo de seleção, os cinco atores passaram por um mês de ensaios com a preparadora de elenco Amanda Gabriel. Ela recorda que tudo foi feioa na casa que serve de cenário ao filme e antes da chegada de Fernanda e Selton no set. Assim, quando os “pais” chegaram, foram recebidos por cada “filho” já com suas personalidades ficcionais formadas.
— Estabelecemos que o set não teria celulares, para ficarmos nos anos 1970 — lembra Amanda. — A Nanda e a Valentina começaram a fazer crochê e eu levava quebra-cabeças para os mais novos.
Amanda conta que a dupla de novatos não recebeu o roteiro do filme, rodado em ordem cronológica. Assim, eles foram descobrindo a história enquanto ela era filmada. Ou seja: a reação que vemos dos personagens e Marcelo e Babiu ao desaparecimento do pai Rubens é também a reação dos próprios atores Guilherme e Cora.
— Ficava impressionada com a espontaneidade dos dois. A câmera chegava neles e eles continuavam o que estavam fazendo normalmente. Nós atores sempre ficamos muito preocupados quando a câmera chega — diz Valentina, a mais experiente do elenco jovem, e que ajudou Walter em testes para a escalação de suas “irmãs”.
Parceira de crochê de Fernanda, Valentina, que interpreta Veroca, também lembra com carinho da preparação. Ela conta que o diretor pediu para que ela e Luiza, que dá vida a Eliana, decorassem o quarto de suas personagens a partir de uma pesquisa do que jovens ouviam e assistiam à época.
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Amanda recorda um caso para ilustrar a sintonia entre filme e elenco:
— Ficamos muito tempo pensando em como iríamos filmar e mostrar a personagem da Babiu perdendo o dente. Aí a Cora perdeu um dente muito próximo do dia que iríamos filmar — revela Amanda. — Ela deu o dentinho dela para o filme, ele foi para a areia e depois voltou para ela no final das filmagens. Esse tipo de magia também é parte de fazer um filme.
Luiza Kosovski fala sobre a experiência ao representar o filme no Festival de Cinema de Pingyao, na China.
— Foi das coisas mais loucas que aconteceu na minha vida — diz a atriz. — Fiquei sabendo uma semana antes e logo estava viajando sozinha pela primeira vez, no interior da China. Eu era parada o tempo inteiro na rua para tirar foto, dar autógrafo, foi muito especial.
Com “Ainda estou aqui” viajando pelo mundo, uma forma que a equipe encontrou de se manter informada sobre novas exibições, entrevistas e premiações é um grupo de WhatsApp da equipe, revela Barbara Luz, que interpreta Nalu:
— A gente tem um grupo e todo mundo é muito ativo. Às vezes eu acordo e tem cem mensagens. Ficamos torcendo muito.

Os cinco jovens atores falam com muito orgulho sobre participar do primeiro filme original Globoplay, que já chegou à marca de cino milhões de espectadores no Brasil. Todos também demonstram um carinho especial por Fernanda Torres, com quem gravaram a maioria de suas cenas.
— A Fernanda é a pessoa mais engraçada que eu conheci na minha vida. Ela conseguia transitar entre as cenas emocionalmente carregadas e uma convivência feliz com a gente no set — cita Luiza. — Se eu consegui ficar orgulhosa do meu trabalho no filme, é porque ela é uma atriz muito generosa na hora de compartilhar a cena. Merece todos os prêmios do mundo.

Barbara completa que “Fernanda foi uma das maiores escolas da vida, uma parceira sempre aberta a jogar em cena”, enquanto que Valentina cita sua “mãe” da tela grande como uma pessoa “viciante”:
— Você não quer sair de perto dela. De todos os trabalhos que já fiz, foi a pessoa que mais sofri sabendo que iria parar de conviver todos os dias.
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Agora, a expectativa é para a cerimônia do Oscar, no dia 2 de março.
— Acho que temos grandes chances de fazer o Brasil finalmente ganhar o Oscar tão merecido — fala Guilherme. — Estou torcendo muito.
Já sua “irmã mais nova”, Cora, avisa:
— Estou muito feliz, não importa o que aconteça.