A Groenlândia, ilha autônoma localizada no Ártico e numa posição estratégica entre a América do Norte e a Europa, se tornou um alvo na mira de Donald Trump: o presidente dos EUA tem ventilado a possibilidade de anexação ou mesmo compra da ilha. Nesta quarta-feira (26), ele declarou que o governo americano “tem que ficar” com o território, por motivos de segurança nacional.
Em outra ocasião, Trump havia declarado que o controle sobre a região seria de “necessidade absoluta”, pelo mesmo motivo.
Nesta sexta-feira (28), a delegação americana fará uma visita à Groenlândia, especificamente à Base Militar Especial dos EUA em Pituffik. Pela posição remota da base, ao norte da ilha, ela se torna um lugar altamente estratégico.
O vice-presidente dos EUA, J.D. Vance, anunciou que estará entre os visitantes da delegação americana. “Estou ansioso para visitar a Groenlândia na sexta”, escreveu Vance em seu perfil no X. Sua esposa, Usha Vance, estava entre o grupo original da ida à Groenlândia, para assistir à Avannaata Qimussersu, corrida de trenós realizada por cães groenlandeses na capital Nuuk. Como a visita à cidade foi cancelada, a delegação dos EUA deve ir somente à base militar.
Desde antes de sua posse, o presidente dos EUA havia declarado sua intenção de anexar a ilha. No começo deste mês, ele voltou a citar o plano, afirmando que a Groenlândia será dos EUA “de um jeito ou de outro”. Em resposta, o primeiro-ministro da ilha, Múte Bourup Egede, rebateu ao dizer que “não queremos ser americanos nem dinamarqueses, somos gronelandeses”.
Luiz Felipe Osório, professor de Direito e Relações Internacionais na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), pontua que o interesse de Trump na ilha pode estar além do seu pretexto de segurança nacional:
“A Groenlândia possui uma série de riquezas naturais, como petróleo e minerais importantes e, principalmente, reservas daqueles chamados de terras raras, elementos químicos utilizados para a fabricação de máquinas e motores elétricos, materiais envolvidos diretamente na segurança nacional dos países e no desenvolvimento tecnológico. Considerando a onda de transição energética e o acirramento das tensões comerciais pelo mundo, eles podem trazer vantagens consideráveis na concorrência”.
O professor destaca que o degelo do Polo Norte acelera e possibilita a exploração de regiões e rotas marítimas antes congeladas, o que faz da Groenlândia um ator importante no tabuleiro geopolítico atual.
Porém, ele não descarta que o plano de Trump em relação à ilha possa ser só mais uma cortina de fumaça do presidente: “um ponto não exclui o outro”.
A quem pertence a Groenlândia?
Localizada próxima à América do Norte e tendo 2/3 de seu território dentro do Círculo Polar Ártico, a Groenlândia é uma região autônoma desde 2008. A ilha se tornou independente do Reino da Dinamarca após 300 anos de colonização. Em 1953, a Groenlândia havia se tornado oficialmente parte do território dinamarquês, tendo se juntado a então Comunidade Europeia (atual União Europeia) por um breve período, de 1973 a 1985.
A saída foi motivada por questões ligadas à pesca: a Groenlândia queria uma maior autonomia sobre o setor, que responde por mais de 90% das exportações da ilha, segundo dados da empresa Royal Greenland, companhia de pesca gronelandesa. Apesar da saída, a Groenlândia é considerada um território ultramarino da União Europeia.
Mesmo com a autonomia que conquistou, a Groenlândia permanece sob controle dinamarquês em algumas esferas, como política externa, defesa e segurança.
“Ela foi ocupada por povos nórdicos desde o século XV, principalmente da Noruega e Dinamarca, enquanto estavam unidas até o Congresso de Viena de 1815. Com a separação dos dois reinos, ela ficou sob domínio apenas dos dinamarqueses. A distância geográfica e política de Copenhagen a manteve relativamente isolada, com um parlamento próprio e travando relações comerciais com os vizinhos mais próximos (Canadá e Estados Unidos), o que se mantém em maior ou menor medida até hoje” afirma Osório.
Segundo dados do Banco Mundial, o Produto Interno Bruto (PIB) da ilha foi de US$ 3,24 bilhões em 2021 (dado mais recente). No mesmo ano, o PIB da Dinamarca foi de US$ 408,38 bilhões.
A Groenlândia é a maior ilha do mundo, com 2.166.086 km ² de área. Desse total, cerca de 1.710.000 km² (80% do território) são cobertos de gelo. Por conta disso, e também por sua posição isolada, a densidade demográfica é baixíssima: apenas 57 mil pessoas vivem nesse território. A título de comparação, o Alasca, que possui clima semelhante e tem uma área aproximadamente 1.700.000 km², conta com 734 mil habitantes, segundo dados de 2022.
A maioria dos habitantes da Groenlândia vive em Nuuk, capital e maior cidade do país, com cerca de 19 mil habitantes. A cidade está localizada na costa oeste da ilha, onde a maior parte da população se concentra. O interior da Groenlândia é praticamente desabitado.