Trump assumiu o cargo com desejo de remodelar a economia global e vem fazendo críticas frequentes ao fato de Powell não ter derrubado os juros dos EUA para fomentar o consumo dentro do país. Um representante do republicano, inclusive, sinalizou que o presidente considerava demitir o banqueiro central.
Entretanto, sua determinação parece ter vacilado diante da turbulência nos mercados acionários e de títulos e dos apelos de executivos poderosos que temem que, além de suas tarifas abrangentes, a interferência no Fed possa desencadear uma calamidade econômica.
Nesta terça-feira, Trump disse que não tinha intenção de demitir Powell — apesar de ter tecido críticas contínuas sobre as políticas do Fed durante os últimos dias. A mudança de atitude de Trump aliviou as preocupações dos investidores que fomentavam uma queda nos principais índices acionários globais e que já durava semanas. Após o recuo do presidente, boa parte dos mercados ao redor do mundo encerrou em alta nestas terça e quarta-feira.
“Quer isso reflita a amostra brutal de segunda-feira do que aconteceria nos mercados se ele tentasse demitir Powell, quer fosse o plano desde o início, é claramente positivo” escreveu Krishna Guha, vice-presidente do Evercore ISI à agência Reuters.
“Isso reduz substancialmente a probabilidade dos piores resultados possíveis, incluindo a estagflação e a transformação da crise tarifária em uma crise da dívida soberana, embora esses riscos permaneçam”, completou Krishna Guha
— Trump está em pânico devido à queda dos mercados e aos rendimentos ainda muito altos do Tesouro dos EUA — afirmou à Bloomberg Alicia Garcia Herrero, economista-chefe da Natixis para a região Ásia-Pacífico.
Além da alta das ações, os rendimentos dos títulos de longo prazo do Tesouro americano caíram quando Trump dissipou os temores de que demitiria o presidente do Fed.
Ainda assim, a reviravolta ressalta que os mercados e a economia estão sujeitos aos caprichos do presidente dos EUA como nunca antes — um sinal de que mais turbulência está por vir.
Equipe econômica recomenda passo atrás
Recentemente, o secretário do Tesouro, Scott Bessent, aconselhou Trump a indicar que não estava querendo demitir Powell e a deixar claro para os mercados que ele acredita em um banco central independente, de acordo com o que uma pessoa familiarizada com o assunto disse à Bloomberg. O secretário de Comércio, Howard Lutnick, também tem sido uma voz de cautela em relação ao Fed, informou The Wall Street Journal.
Essas conversas antecederam a declaração de Trump a jornalistas, na terça-feira, de que ele “não tinha intenção” de demitir Powell, embora tenha declarado dias antes que a demissão do presidente do Fed “não poderia ocorrer rápido o suficiente!”.
Além disso, na última sexta-feira, o diretor do Conselho Econômico Nacional de Trump, Kevin Hassett, disse a repórteres que o presidente estava estudando a possibilidade de demitir Powell, após uma série de postagens nas redes sociais e comentários públicos criticando o Fed.

A mudança de direção foi um sinal de que ele se tornou mais sensível aos movimentos do mercado e às súplicas de consultores com experiência em Wall Street, como Bessent e Lutnick.
“Não discutimos as conversas particulares do presidente que podem ou não ter acontecido”, escreveu Taylor Rogers, porta-voz da Casa Branca, em um comunicado. “O presidente tem uma equipe excelente de assessores que o aconselham sobre vários assuntos, mas, no final das contas, o presidente é quem toma a decisão final.”
Os ataques de Trump a Powell no fim da semana passada jogaram gasolina nas Bolsas americanas e intensificaram a queima do valor dos ativos, já acentuada por causa do tarifaço, em uma tendência que já está sendo chamada em Wall Street de “vender América”.
Ações, dólar e títulos americanos despencaram, em uma ampla retirada de dinheiro do país.
— Se Powell for demitido haverá uma enorme injeção de volatilidade nos mercados financeiros e a mais dramática fuga de ativos dos EUA que se pode imaginar. Não só a independência do Fed estará claramente sob ameaça, como a perspectiva de desdolarização e afastamento da hegemonia dos EUA será cada vez mais realista — disse Michael Brown, estrategista sênior da corretora Pepperstone.
Na segunda-feira, pesquisa global de gestores do Bank of America mostrou o maior número registrado de investidores globais que planejam diminuir suas participações em ações dos EUA desde que a coleta de dados começou, em 2001: 73% dos entrevistados disseram acreditar que o excepcionalismo dos EUA atingiu o pico.
O quadro de crise nos mercados se instalou após Trump afirmar, na plataforma Truth Social, que não há “praticamente” nenhuma inflação e que era hora de “cortes preventivos” nos juros, reforçando suas críticas ao Fed. A última leitura do principal indicador de inflação acompanhado pelo banco central americano continua acima da meta perseguida pela autoridade monetária.
O medo vem sendo ecoado por elites dos fundos de hedge, dedicados a oferecer investimentos que ofereçam proteção contra a volatilidade dos ativos de mercado. Paul Singer, fundador da Elliott Investment Management, alertou recentemente em um evento privado em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos, que o dólar dos EUA pode perder seu status de moeda de reserva, segundo pessoas presentes.
Juristas afirmam que um presidente não pode demitir o presidente do Fed facilmente, e Powell já afirmou anteriormente que não renunciaria se fosse pressionado por Trump.