Crédito, Pablo Porciúncula/AFP
- Author, Rute Pina
- Role, Da BBC News Brasil, em São Paulo
No dia 28 de abril, sete dias antes do show de Lady Gaga que reuniu 2,1 milhões de pessoas em Copacabana, no Rio de Janeiro, o disque-denúncia recebeu uma ligação anônima sobre um plano de ataque a bomba no evento.
Às 9h19min, uma pessoa ligou para o número 181 e deu as informações que deram o pontapé para a investigação.
O denunciante relatou que um grupo criminoso atuante na plataforma Discord planejava lançar explosivos de forma coordenada contra o público, com foco em crianças e pessoas LGBTQIA+.
Segundo ele, seriam usados coquetéis molotov e mochilas explosivas, e menores de idade participariam do ataque.
A denúncia passou por triagem da Central de Inteligência, Vigilância e Tecnologia em Apoio à Segurança Pública (Civitas), da Prefeitura do Rio, que tem convênio com o disque-denúncia.
A central de inteligência vinculada ao Centro de Operações e Resiliência (COR) da Prefeitura do Rio foi inaugurada em junho de 2024.
Ela opera em três frentes: monitoramento de veículos suspeitos (cerco eletrônico), inteligência e análise de dados, e estudos sobre criminalidade.
Toda queixa anônima recebida pelo disque-denúncia entra automaticamente na base de dados da Civitas, que realiza buscas semânticas programadas com palavras-chave para filtrar conteúdos sensíveis.
No caso da ameaça ao show, os termos “bomba” e “Lady Gaga” dispararam o alerta.
Com isso, a equipe de inteligência da Civitas iniciou a triagem da denúncia. “Foi comprovado que o grupo era real e que os perfis estavam falando [sobre o atentado] no Discord”, disse uma fonte à BBC News Brasil.
Prints das conversas e links diretos para os perfis foram encaminhados à e foi repassada à Polícia Federal e à Agência Brasileira de Inteligência (Abin).

Crédito, Sergio Queiroz/Reuters
O Laboratório de Operações Cibernéticas (Ciberlab), órgão do Ministério da Justiça e Segurança Pública formado por policiais civis, militares e bombeiros, validou a ameaça. A menção à plataforma Discord e ao nome do grupo ajudou a confirmar a veracidade do alerta.
O coordenador-geral do Ciberlab, Alesandro Barreto, diz que as plataformas têm colaborado com as investigações e que o caso demonstrou integração entre diferentes forças de segurança.
“Isso também mostra a importância da checagem de informações, que não podem ser desprezadas”, disse.
“Mesmo que uma informação parecer estranha, ela tem que ser checada quando há algo que coloca em risco a vida de pessoas, principalmente de muita gente aglomerada. Isso garante a segurança das pessoas e evita tragédias. Foi o que ocorreu no caso desse show.”
Com o relatório, teve início a operação Fake Monster, em referência ao apelido dos fãs da cantora, chamados de little monsters.
A ação mobilizou 14 órgãos de segurança pública — majoritariamente da Polícia Civil — e resultou no cumprimento de 15 mandados de busca e apreensão contra nove alvos em dez municípios de quatro estados.
Foi “uma ação conjunta contra um grupo que disseminava discurso de ódio e preparava um plano, principalmente contra crianças, adolescentes e o público LGBTQIA+”, disse a polícia civil do Rio de Janeiro.
No Rio, os mandados foram cumpridos em Rio de Janeiro, Niterói, Duque de Caxias e Macaé. Em São Paulo, as ações ocorreram em Cotia, São Vicente e Vargem Grande Paulista. No Rio Grande do Sul, em São Sebastião do Caí e Novo Hamburgo. No Mato Grosso, em Campo Novo do Parecis.
No sábado (3/5), Luiz Fabiano da Silva, “líder do grupo”, foi preso em flagrante por porte ilegal de arma de fogo no Rio Grande do Sul. Além dele, um adolescente foi apreendido por armazenamento de imagens de abuso infantil.
Silva obteve liberdade horas depois da prisão mediante pagamento de fiança, mas foi preso novamente nesta segunda-feira (5/5).
Segundo as autoridades, o plano era tratado como um “desafio coletivo” para conseguir notoriedade nas redes sociais.
De acordo com a Polícia Civil do Rio, os envolvidos recrutavam adolescentes para participar de ações violentas em busca de notoriedade nas redes sociais.

Crédito, Daniel Ramalho/AFP

Crédito, Pablo Porciúncula/AFP
“Os alvos da operação atuavam em plataformas digitais, promovendo a radicalização de adolescentes, a disseminação de crimes de ódio, automutilação, pedofilia e conteúdos violentos como forma de pertencimento e desafio entre jovens”, informou a polícia em nota.
Segundo a polícia, nos endereços foram apreendidos dispositivos eletrônicos e outros materiais que ajudarão a robustecer as investigações.
“A operação foi deflagrada para neutralizar as condutas digitais que vinham sendo articuladas, com potencial risco ao público do evento, sem que houvesse qualquer impacto para os frequentadores.”