A Agência Brasil completa, neste sábado (10), 35 anos como a principal agência pública de notícias do país, desempenhando um papel fundamental na promoção da cidadania, na cobertura de políticas públicas e na garantia do direito à informação. Com uma trajetória marcada pelo compromisso com a transparência e a democratização do acesso às notícias, a Agência tem sido uma fonte de informações confiáveis e de qualidade, abastecendo jornais, rádios e veículos de comunicação de todo o país e do mundo.
Diariamente, a Agência Brasil produz mais de 100 notícias e fotos, distribuídas de forma gratuita. Também possui um canal de distribuição de matérias por WhatsApp e uma comunidade na mesma rede social onde são disponibilizados três boletins diários de segunda a sexta-feira. As principais matérias do dia também são traduzidas para o inglês e o espanhol, ampliando o alcance e o público leitor da agência pública.
Em março de 2025, a Agência Brasil atingiu mais de 5,5 milhões de usuários e mais de 9,4 milhões visualizações em sua própria página. Matérias de economia, educação, direitos humanos e saúde estão sempre as mais procuradas no site cuja audiência é bastante jovem – 36% têm entre 25 e 34 anos e 20%, de 18 a 24 anos.
Além disso, o material é reproduzido em centenas de sites, jornais e outros veículos de imprensa. Apenas em abril, mais de 10,8 mil sites utilizaram as matérias da Agência Brasil.
Outra importante vertente da Agência Brasil está na oferta de conteúdo de credibilidade para livros didáticos. Ao longo de 2024, mais de 160 obras educacionais incorporaram textos e áudios produzidos pelo veículo da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), reforçando o papel do jornalismo público na disseminação do conhecimento.
Para atender melhor os usuários e ampliar as funcionalidades para acesso via mobile, o site da Agência Brasil passou por uma reformulação de layout em setembro de 2024. O intuito da mudança foi facilitar o acesso às informações, melhorar a leitura e o compartilhamento das notícias, além de oferecer mais conteúdo para o internauta. Também foram lançadas duas novas editorias: meio ambiente e cultura, alinhadas com a estratégia editorial voltada para temáticas urgentes como as mudanças climáticas.
Na avaliação da diretora de Jornalismo da EBC, Cidinha Matos, uma agência de comunicação pública como a Agência Brasil é vital para a democracia.
“A Agência Brasil desempenha um papel essencial na comunicação pública brasileira ao atuar como uma fonte confiável de informações, promovendo a transparência, democratizando o acesso às notícias e fortalecendo a cidadania. Uma agência de comunicação pública forte contribui para uma sociedade mais bem informada, participativa e democrática.”
Já para o presidente da EBC, Jean Lima, a Agência Brasil é um serviço relevante para a população brasileira, pelo seu alcance e gratuidade.
“É uma agência que fornece informações verídicas, checadas. Em tempos de desinformação isso é muito importante”, afirmou.
“A agência é reconhecida pelos diversos prêmios que já ganhou, tanto no jornalismo quanto no fotojornalismo. Então, é muito importante a gente comemorar os 35 anos, reconhecer o trabalho valoroso de todos os empregados e empregadas que já passaram pela agência. É um veículo que precisa ser alçado e reconhecido pelos serviços que presta à sociedade brasileira.”
Um pouco de história
A Agência Brasil surge no contexto de redemocratização do Brasil em 1990. Mas foi durante a gestão de Carlos Zarur, iniciada em 1998, que a Radiobrás – empresa que, posteriormente, passou a se chamar Empresa Brasil de Comunicação (EBC) – deu o primeiro passo na busca pela independência editorial necessária para uma agência pública de notícias.
“Quando fui convidado para presidir a empresa pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, deixei claro que só aceitaria o convite se tivesse autonomia para indicar todos diretores, sem indicações políticas”, lembrou Zarur, que, na época do convite, era um dos jornalistas do quadro da Radiobrás.
Para chefiar a Agência Brasil, Zarur escalou, como diretora de notícias, a jornalista Marizete Mundim. “Quando eu cheguei na Radiobrás, a agência de notícias praticamente não existia. Não tinha nenhuma relevância”, relembrou Marizete.
“Para se ter uma ideia, na época, o apelido da Radiobrás era Titanic. Por aí, você tira uma ideia [da situação]. Ela estava afundando, restrita a um galpão. Tudo estava sucateado, com suas equipes desestimuladas”, acrescenta a ex-diretora de notícias.
Segundo Marizete, a aproximação de Zarur com Ana Tavares, então responsável pela comunicação social no governo Fernando Henrique Cardoso, foi crucial para começar “a grande revolução dentro da Radiobrás”.
“Para começar, adotamos um novo conceito, não de agência de governo, mas de agência pública de notícias”, afirmou.
“Nossa referência, para fazermos uma comunicação pública de qualidade, era a BBC de Londres que, a meu ver, é a melhor do mundo. Claro que a gente estava muito longe disso, mas era nosso espelho; nosso molde”, explicou.
A ideia era ampliar horizontes, em vez de fazer apenas matérias positivas para o governo. “Não é falar bem nem falar mal, mas falar os fatos. Claro que isso é um processo lento, porque havia muita resistência”, acrescentou.
Novas tecnologias
Segundo Marizete Mundim, o nascimento da Agência Brasil coincidiu com alguns fatos relevantes para o jornalismo. Com as novas tecnologias que surgiam, as agências de notícias começavam a produzir cada vez mais notícias em tempo real.
“Adquirimos computadores novos para esta que foi uma transição feita a duras penas. Foi uma epopeia, mas conseguimos colocar a Agência Brasil em tempo real”, acrescentou ao citar, também, a melhoria de infraestrutura proporcionada pela mudança da sede da empresa para um prédio mais bem estruturado.
Tudo isso com pouca verba, como lembra o, à época, presidente da empresa. “Tudo que precisávamos, em termos de equipamentos e infraestrutura, era criado e montado pela própria equipe da casa, que vestiu a camisa da empresa. Foi uma verdadeira ginástica financeira”, detalhou Zarur.
Segundo Zarur, o fato de o material ser apresentado em tempo real garantia uma independência editorial que até então não existia na empresa.
“A Agência era a cabeça da Radiobrás; o comando de todo conteúdo jornalístico a ser utilizado pela TV e pelas rádios. Tudo em tempo real”, disse Zarur.
“Ao dar de forma quase imediata a notícia, o tempo real dificultava qualquer censura prévia. As reclamações só vinham após a veiculação da notícia”, completou.
Foco no cidadão
Em 2003, no primeiro governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o jornalista Eugênio Bucci assumiu a presidência da Radiobrás com o intuito de ampliar o alcance e a relevância dos veículos públicos. Mais do que noticiar o que acontecia no governo, a nova gestão coloca o cidadão no centro da pauta jornalística da empresa.
“Quando cheguei à Radiobrás, a Agência Brasil já existia. O que fizemos foi dar um impulso muito grande para ela; uma nova configuração”, disse.
“Procuramos fazer com que a Agência Brasil passasse a fornecer informação de qualidade para todos os veículos de comunicação no Brasil, como faziam as agências privadas e comerciais. A diferença é que enquanto elas cobravam pelo serviço, nós o oferecíamos de graça”, explicou Bucci referindo-se à capilaridade das notícias produzidas pela Agência, muito republicadas por outros veículos jornalísticos, em especial do interior do país.
O quadro de empregados aumentou significativamente por meio de concurso público, possibilitando a ampliação de coberturas, dando a elas foco especial à sociedade civil. “Reconfiguramos o índice de assuntos para que ele contemplasse mais aquilo que é relevante para a cidadania”, disse Bucci.
“Nossa intenção era subir o patamar básico de informações disponíveis para [abastecer] todos os veículos jornalísticos e de comunicação no país. Com isso, o material da Agência Brasil passou a ser usado em grande escala”, completou.
Interesse público
Ele lembra que, entre os critérios para a produção de notícias estava o interesse público, “mesmo quando essas notícias contrariassem alguns interesses legítimos do governo”. “Isso aconteceu na cobertura das tropas brasileiras no Haiti e em alguns episódios da cobertura do caso do mensalão”, acrescentou.
Editor Executivo e editor chefe da Agência Brasil, no período entre 2004 e 2007, Rodrigo Savazoni detalha o plano editorial que norteava o veículo na época. A ideia, segundo ele, era cobrir o espaço público político brasileiro, a partir de um triângulo formado pelas três dimensões da República: governo, estado e cidadania, o que inclui os movimentos sociais.
“Também atuamos fortemente na modernização tecnológica, num momento em que a internet era ainda incipiente mas se projetava como a principal mídia do século 21. Fomos pioneiros na operação multimídia no Brasil, criando uma área específica para o desenvolvimento de narrativas interativas, que foi responsável por reportagens especiais fascinantes”.
Credibilidade
O volume de produção jornalística aumentou significativamente. “Chegamos a distribuir mais de 200 notícias por dia, para veículos de todo o país. Tudo aberto, livre e gratuito. O crescimento exponencial do uso de nossos materiais, inclusive por veículos da grande imprensa, se deu por conta da crescente credibilidade da agência”, complementou Savazoni.
Essa credibilidade era fortalecida na medida em que ficava mais clara a autonomia editorial em relação ao governo.
“Procuramos esclarecer [essa separação], estabelecendo uma comparação com uma universidade pública ou um hospital público. O argumento era simples: você acha que uma universidade deve ser partidarizada, um hospital deve perguntar em quem o cidadão votou para atendê-lo?”, explicou Savazoni ao ressaltar que “o dono da comunicação pública é o cidadão”.
Consolidação da EBC
Em 2007, é criada a Empresa Brasil de Comunicação (EBC). A estatal surge a partir da incorporação do patrimônio, do pessoal e concessões de radiodifusão da Radiobrás e dos bens públicos da União que estavam sob guarda da Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto (Acerp). A EBC é criada para fortalecer o sistema público de comunicação e dar efetividade ao princípio constitucional de complementaridade entre o sistema público, privado e estatal de comunicação.
Para pavimentar o caminho em direção à comunicação pública, foram instituídos, na EBC, o Conselho Curador (com representantes do governo, da sociedade civil e do quadro de funcionários) e a Ouvidoria.
Primeira presidente da recém-criada EBC, a jornalista Tereza Cruvinel afirma que a Agência Brasil “era uma das melhores heranças que a nova empresa recebia da Radiobrás”.
Ela lembra que sua gestão tinha dois desafios para o veículo.
“Primeiro, consolidar sua gestão como agência pública e não governamental, o que já havia começado na gestão de Eugenio Bucci na Radiobrás. Depois, ela carecia urgentemente de investimentos em tecnologia, para melhorar e ampliar o acesso dos leitores e a oferta de conteúdos”, afirma, destacando que, à época, foram destinados importantes recursos financeiros para essa finalidade.
“Também era nosso desafio torná-la multimídia, com maior oferta de vídeos e áudios. Isso avançou um pouco mas creio que ainda falta muito fazer”, afirmou.
Tereza cita ainda os vários acordos de cooperação com agências públicas estrangeiras, como a argentina Télam, a portuguesa Lusa e a chinesa Xinhua.
A jornalista lamenta não ter conseguido avançar na criação da Ulan – a União Latino-Americana das Agências de Notícias Públicas -, uma articulação feita por ela e o então presidente da Télam Sergio Novoa.
“Fizemos uma reunião com 9 agências em Caracas [em 2014] e estávamos avançando para a criação do portal unificado. Nisso, acabou meu mandato na EBC e o de Novoa na Télam. O projeto morreu”, recordou.
Alguns anos depois, em 2016, sob a liderança do jornalista Paulo Totti, à época gerente executivo de Agências da EBC, a Agência Brasil fez seu primeiro programa de correspondentes e enviou repórteres concursados para cinco capitais: Fortaleza, Salvador, Porto Alegre, Belo Horizonte e Recife. O intuito era ampliar a cobertura nacional e dar mais destaque para notícias fora do eixo Rio, São Paulo e Brasília.
Entretanto, logo após o impeachment de Dilma Rousseff, no início do governo do ex-presidente Michel Temer, o Conselho Curador da EBC é extinto por meio de medida provisória e o programa de correspondentes, encerrado. Uma das primeiras coberturas afetadas pelas mudanças foi a do assassinato da vereadora Marielle Franco, que teve o acompanhamento da investigação restringido.
Durante o governo de Jair Bolsonaro, o diálogo com a sociedade civil também foi reduzido na esfera editorial, com uma série de temas relacionados aos direitos humanos interditada.
Após a retomada do projeto de comunicação pública, no terceiro governo Lula, a Agência Brasil reassumiu sua vocação de cobertura voltada para o debate e políticas públicas.
A jornalista Tereza Cruvinel reconhece a resistência dos funcionários da EBC como importante trincheira para a manutenção do jornalismo público.
“O que posso dizer hoje é que, apesar dos retrocessos e das violências sofridas no período Temer-Bolsonaro, a Agência Brasil resistiu, graças a seu corpo funcional, e continua honrando sua tradição de fazer bom jornalismo público.”
Prêmios
Além da reprodução das matérias por diversos veículos, a qualidade do jornalismo da Agência Brasil é chancelada pelos numerosos prêmios que o veículo recebeu ao longo de sua história.
Em 2008, a Agência ganha, pela primeira vez, o Prêmio Jornalístico Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos com o especial Nação Palmares. De lá para cá, dezenas de prêmios foram concedidos a reportagens especiais e aos profissionais que trabalham no jornalismo público.
Apenas em 2024, a Agência Brasil recebeu 6 prêmios jornalísticos pela excelência do seu material e reconhecimento do profissionalismo de seus repórteres e fotógrafos.
>> Veja lista de prêmios conquistados pela EBC
Aperfeiçoamento da democracia
Ouvidor adjunto da EBC de 2009 a 2012, o professor da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília (UnB), Fernando Paulino avalia que, enquanto agência pública de notícias, a Agência Brasil não é apenas um instrumento de acesso e circulação de informações.
É também, segundo ele, um instrumento de prestação de contas e, com isso, “de aperfeiçoamento da democracia, uma vez que promove mais transparência e contribui para o maior envolvimento da população nas tomadas de decisão”.
Na avaliação dele, a Agência tem, enquanto instrumento de comunicação pública, potencial “bastante significativo para tratar de assuntos e temas relevantes que, por vezes, não estão na agenda de outros veículos, com outros interesses e outras finalidades”.
Para Eugênio Bucci, é preciso que as autoridades compreendam que bons serviços de informação difundidos por veículos públicos podem ajudar o governo.
“Temos universidades custeadas por recursos públicos e não sofrem nenhuma interferência da autoridade do Executivo sobre aquilo que está ensinando ou pesquisando. É assim que tem de ser. O mesmo princípio vale para a comunicação pública. O resultado final é que isso é melhor para o próprio governo, que ganha credibilidade, ganha respeitabilidade”, afirmou Bucci.