O aumento do IOF anunciado pelo governo federal provocou reações no mercado financeiro e entre especialistas. As mudanças afetam desde aportes em planos de previdência privada até compras realizadas no exterior e operações com cartões internacionais, levantando questionamentos sobre os reais objetivos da medida — se busca maior justiça tributária ou, principalmente, elevar a arrecadação.
Cristiano Correa, professor de Finanças do Ibmec-SP, observa que a mudança mais expressiva incide sobre os aportes no VGBL. A partir de agora, o IOF passa de 0% para 5% nos aportes mensais acima de R$ 50 mil. Correa lembra que, após a tributação das aplicações offshore, em vigor desde o ano passado, muitos investidores migraram para o VGBL como forma de elisão fiscal — ou seja, planejamento legal para reduzir o pagamento de impostos.
– No VGBL, só se paga imposto de renda no momento do resgate e não há a incidência de come-cotas, como acontece em outros investimentos”, explicou.
Correa destaca que quem realiza aportes superiores a R$ 50 mil por mês dificilmente está preocupado com a aposentadoria tradicional, mas sim com estratégias para reduzir a tributação. Ainda assim, pondera que existem outras alternativas legais para evitar impostos, o que limita a eficácia da medida do governo.
Além da previdência, a elevação do IOF afeta diretamente o uso de cartões internacionais de crédito e débito. A alíquota subiu de 3,38% para 3,5%. Embora a variação pareça pequena, Correa lembra que a decisão contraria compromissos assumidos pelo Brasil com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que preveem zerar o IOF até 2029 como parte da adequação do país aos padrões internacionais.
A medida também atinge em cheio as operações com contas no exterior e compras de moeda estrangeira em espécie, que passaram de uma alíquota de 1,1% para 3,5%. Correa alerta que esse aumento significativo pode inviabilizar o modelo de negócios de empresas como Wise e Nomad, que popularizaram cartões internacionais justamente pelo custo reduzido do IOF.
Na avaliação de Correa, o impacto da elevação do IOF se soma à valorização recente do dólar, encarecendo ainda mais viagens e compras no exterior para os brasileiros.
A pesquisadora do núcleo de tributação do Insper Lorraine Messias chama a atenção para os efeitos mais amplos da medida sobre o crédito e a atividade econômica. As empresas passam a pagar mais IOF em empréstimos. A alíquota total subiu de 1,88% ao ano para até 3,95%. No Simples Nacional, vai de 0,88% para 1,95%. Segundo ela, ao tornar o crédito mais caro, o aumento do IOF pode ter um papel de freio em uma economia brasileira atualmente superaquecida.
No entanto, Lorraine faz críticas ao uso do IOF como um imposto regulatório com objetivos fiscais, o que, segundo ela, representa uma distorção econômica.
– Apesar de sua eficiência arrecadatória no curto prazo, é um tributo ruim quando analisado sob a perspectiva econômica de médio e longo prazo.
Para ela, o IOF tem baixa evasão e custo administrativo reduzido, mas, com o tempo, gera erosão da base tributária, pois contribuintes acabam buscando alternativas que não estejam sujeitas à incidência do imposto.
A pesquisadora considera que outra sinalização ruim é que, após a reforma tributária, o governo teria sinalizado um compromisso com a melhoria do sistema tributário, destacando a importância da sinalização que o Brasil deu ao mundo ao buscar um sistema mais eficiente, alinhado aos princípios do Imposto sobre Valor Agregado (IVA). Mas a decisão de aumentar o imposto sobre transações financeiras contradiz esse movimento.
– Houve todo um capital político por parte do governo para aprovar essa reforma. Não foi a reforma ideal, mas, perto do que a gente tinha, foi um grande salto. Agora, a gente vai usar um dos piores tributos que existem. Vamos elevar um dos piores tributos, que é o tributo sobre as transações financeiras. Ele é um imposto não neutro, afeta as escolhas econômicas.