O ataque reacende o fantasma dos magnicídios que marcaram o país – um ciclo trágico iniciado em 1948 com o assassinato do líder liberal Jorge Eliécer Gaitán e intensificado entre 1987 e 1990, quando quatro pré-candidatos presidenciais foram mortos por pistoleiros supostamente contratados por chefes do narcotráfico que declararam guerra ao Estado e à democracia.
Esses casos envolveram como supostos responsáveis o falecido Pablo Escobar e outros narcotraficantes, além de políticos e agentes do Estado aliados a eles.
Naquela época, as vítimas eram líderes da esquerda e progressistas. Desta vez, com o atentado contra Uribe, trata-se de um jovem senador conservador e de direita, de 39 anos, que anunciou há alguns meses sua intenção de substituir o presidente Gustavo Petro nas eleições de 2026.
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Embora a campanha ainda não tenha sido oficialmente iniciada, ele se reunia em um bairro popular com possíveis eleitores. Quando estava com o microfone na mão, abriram fogo contra Uribe, que foi atingido por três tiros, segundo a equipe médica que o atendeu no local. Um adolescente de 15 anos é suspeito de ser o autor dos disparos e foi capturado.
— A história se repete e, portanto, nosso dever é impedir essa repetição — disse Petro em um pronunciamento, sendo apontado por setores da direita como responsável por supostamente incentivar discursos de ódio contra a oposição — acusações que ele considera “oportunistas”.
— Os grandes marcos políticos na Colômbia têm sido infelizmente marcados pela violência. Essa tem sido uma característica que atravessa décadas — disse à AFP Laura Bonilla, pesquisadora do centro de estudos Fundación Paz y Reconciliación.
Em 1948, o popular líder liberal e candidato à presidência Jorge Eliécer Gaitán caiu morto em uma avenida de Bogotá, vítima de três tiros. Esse assassinato mergulhou o país em uma onda de violentos protestos e marcou o início de uma era de violência bipartidária entre liberais e conservadores.
Quatro décadas depois, o sangue continuou a correr: foram assassinados o comunista Jaime Pardo Leal, em 1987, o liberal Luis Carlos Galán, em 1989, e os esquerdistas Bernardo Jaramillo e Carlos Pizarro, em 1990, este último um comandante da guerrilha M-19 que havia assinado um acordo de paz.
Com a chegada de Petro ao poder em 2022, tornando-se o primeiro presidente de esquerda do país, acreditava-se que essa prática havia sido deixada no passado.
Entretanto, sem que ainda se conheçam os motivos do ataque contra Uribe, analistas lamentam o retrocesso, especialmente às vésperas das eleições de 2026.
“O atentado contra Miguel Uribe marca um retorno aos piores momentos da violência política no país”, condenou Juanita Goebertus, diretora para as Américas da Human Rights Watch, na rede social X.
— Achávamos que essa época (de violência) havia sido superada. Muitos de nós analistas considerávamos encerrado um ciclo, e aparece esse atentado justamente agora, em uma campanha que já se antecipava (…) como uma campanha violenta.
“Turbilhão de violência”
Os tiros contra Uribe são um déjà vu para a maioria dos colombianos adultos.
— Isso me lembra a violência de muitos anos atrás — declarou à AFP Rafael Navarro, ex-ministro da Justiça, que foi até a clínica onde Uribe foi atendido.
Muitos dos crimes dos anos 1980 e 1990 ficaram impunes, aprofundando divisões em um país onde grupos armados ilegais historicamente eliminaram vozes que ameaçavam seus interesses.
— A morte de um dirigente político, qualquer que seja seu pensamento, pode originar um turbilhão de violência se não nos controlarmos, se deixarmos que nossos corações se encham de vingança, preconceito e ódio — declarou Petro, após desejar a recuperação de Uribe, que passou por uma cirurgia.
O próprio presidente denunciou recentemente que narcotraficantes colombianos e estrangeiros, que vivem em Dubai, tentaram assassiná-lo com foguetes.
Em 2002, o ex-presidente Álvaro Uribe — líder do partido ao qual Miguel Uribe pertence — saiu ileso de um ataque com explosivos perpetrado pela então guerrilha das FARC, que tentava impedir sua chegada à Presidência. Em sua biografia, o ex-presidente afirma ter escapado de 15 atentados.