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quinta-feira, junho 19, 2025

‘Não precisa ser perfeita para funcionar, 5 minutos já bastam’, diz psicólogo sobre os benefícios profundos da meditação

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Ele levava uma vida muito comum. Nicolás Iglesias trabalhou durante sete anos no mundo das corporações multinacionais e outros sete em uma agência de contratação de talentos de Hollywood, pertencente a um dos maiores grupos publicitários do mundo. Lembra quase como uma anedota o fato de ter negociado com Cristiano Ronaldo e Lionel Messi. Morava em uma cobertura no coração de São Paulo (SP). Havia seguido o percurso perfeito do “dever ser”: formado em Administração de Empresas pela Pontifícia Universidade Católica da Argentina (UCA), com trabalho, bom salário e projeção profissional. Paralelamente, também havia estudado coaching organizacional e feito sua primeira formação em terapia Gestalt.

Tinha “tudo”, mas todas as manhãs era invadido por um vazio e uma tristeza, com a sensação de querer deixar aquele lugar que conquistara com tanto esforço. “Até aqui eu cheguei”, disse a si mesmo e aos acionistas do grupo. Convicto, decidiu dar uma guinada em sua vida.

Em 2015, foi morar em São Francisco, na Califórnia, para estudar no Instituto Esalen, a escola de referência mundial e berço da terapia Gestalt, o mesmo lugar escolhido, por exemplo, por Chopra, um renomado médico indiano conhecido por escrever sobre bem-estar, para lançar seus livros. Aproveitou a oportunidade para estudar budismo.

Em 2016, voltou para Buenos Aires, aprofundou sua conexão com o budismo e conheceu quem define como seu mestre: Gerardo Abboud, uma das principais referências do budismo na América Latina, que viveu 15 anos na Índia com grandes lamas, mestres espirituais do budismo tibetano. Dois anos depois, teve coragem de viver a experiência de morar em um monastério no norte da Índia.

Hoje, sente prazer por realizar um novo sonho: escrever seu primeiro livro, Meditación en zapatillas, (traduzido para o português: Meditação de Tênis), que foi lançado há poucas semanas na Feira do Livro de Buenos Aires.

Em seu livro, Nicolás (foto) fala sobre a importância de praticar a meditação no dia a dia — Foto: Reprodução/Instagram

Como foi a experiência de viver como um monge?

— A verdade é que foi muito difícil. Você acorda às quatro da manhã para começar a prática; às sete é servido o café da manhã, que é arroz com lentilhas. Continua praticando, ao meio-dia tem o almoço, que também é arroz com lentilhas. A prática segue até as sete da noite. Depois, o jantar: arroz com lentilhas. Foi assim que vivi durante um mês e meio.

Durante todo o dia, você pratica meditação sozinho, mas pode fazer o que quiser. Se quiser, pode sair, olhar o celular. A orientação do mestre é que, se for levar isso a sério, não contrate uma babá para te dizer quando meditar. A mensagem é: você mesmo é quem precisa reunir coragem espiritual.

Que aprendizado isso te deixou?

O primeiro foi: esquecer todo tipo de expectativa, e eu experimentei isso na pele. Na primeira semana em que estive lá, pedi uma entrevista com o lama mais importante do centro. Fui até uma casinha no alto da montanha onde havia um senhor alimentando um cachorro, achei que era um assistente. Quando me cumprimentou, ele disse que era o mestre.

Lembro que eu tinha mil perguntas, mas depois de 10 minutos de conversa, ele me disse: “100 perguntas, uma solução: meditar. Vá para o seu quarto e volte em algumas semanas.” Saí de lá com raiva, frustrado, e, depois de alguns dias, comecei a entender qual era a lição do mestre.

A prática do desapego: ter a capacidade de deixar para trás o que você achava que sabia e ficar com o que é. É um processo muito transformador que você tem que fazer sozinho, e só depende de você.

Quando voltou, não se sentia um peixe fora d’água?

No começo, sim. Como todo processo, há um tempo de decantação, e depois você integra. Mas sempre, a palavra-chave de todos esses trabalhos é o desapego. Sem renúncia, não há transformação. Sem renúncia, não há crescimento, não há mudança. Você precisa deixar um estágio para passar a outro.

É como o amor: não sei explicar. Eu sou judeu de berço, estudei em colégio alemão e depois fui para a Universidade Católica Argentina, onde tínhamos catequese, história das religiões. Não tenho uma explicação.

A praticidade. Embora tenha uma parte religiosa e espiritual, o núcleo do budismo é o treinamento da mente. E por mente não me refiro só ao cérebro ou à cognição, mas ao conjunto mente–emoção. Corpo e alma, corpo e cérebro: somos uma unidade.

Você fala em treinar a mente para não ser dominado pelas emoções?

É um treino que começa com o foco da atenção: meditar prestando atenção à respiração, a um mantra, uma música, ou o que for, sempre que você percebe que se dispersou do presente.

O exercício é esse: você se distrai, e volta. Sempre volta.

O que causa esse vai e vem entre passado e futuro?

O passado gera nostalgia e tristeza. Enquanto o futuro gera ansiedade e agitação. Ambos estão fora do nosso controle. Por isso as práticas contemplativas, chame como quiser: mindfulness, meditação, são fundamentais. Elas nos colocam no único lugar que realmente existe: o agora.

Por que você deu ao livro o nome Meditação de Tênis?

Sempre quis trazer essas práticas para o chão, tornar acessíveis os ensinamentos e estruturas psicológicas e psicoespirituais como o budismo. Você não precisa raspar a cabeça, virar budista nem vestir uma túnica laranja para praticar isso.

Para meditar, o mais simples é sentar, e, toda vez que a mente se dispersa, você volta. É entediante, não acontece nada, não tem mágica, você não se sente a Julia Roberts em Comer, Rezar, Amar. Mas é como ir à academia: você faz flexões, e os músculos não crescem de um dia para o outro.

Quanto tempo é preciso meditar?

Tecnica e cientificamente, cinco minutos por dia são suficientes. Quem diz isso são Daniel Goleman e Richard Davidson, duas das maiores autoridades em inteligência emocional, no livro Rasgos Alterados.

De manhã ou à noite? Sentado?

Pessoalmente, gosto mais de manhã: é como um pequeno ritual para começar o dia. O ideal é estar sentado, para não dormir. Mas não precisa cruzar as pernas como um pretzel. Pode ser numa cadeira. Não precisa de técnica perfeita. O importante é voltar sempre que a mente se for. É governar a presença.

Esse poder de estar presente leva também à parte mais “informal” da meditação: algumas vezes por dia, parar e habitar o presente, o que quer que esteja acontecendo. Pode ser olhando o céu, dirigindo, levando os filhos à escola…

Mas também se recomendam meditações longas. Para que servem?

A meditação é o primeiro passo. Treinar a atenção é como usar rodinhas na bicicleta — até que você ganha equilíbrio e pode tirá-las. Depois que sua atenção se fortalece, você pode treinar a compaixão, a generosidade, o altruísmo, a bondade, a empatia. São todas qualidades de um ser pleno.

Isso ajuda a ter menos apego?

Sim. Por exemplo, quando você se irrita porque te cobraram errado uma multa, esse treino te dá a capacidade de voltar para o presente. A prática impede que as emoções distorcidas te dominem.

O problema não é o que acontece com você, é o que você faz com o que acontece. Com essas práticas, você aprende a lidar de forma mais madura com suas experiências.

Quando falo em meditação de tênis, minha proposta é: faça o melhor que puder, mas faça alguma coisa. Você pode criar esse espaço de meditação no metrô, no ônibus…

Você já teve alguma experiência reveladora?

Essa pergunta é uma faca de dois gumes. Se estamos falando em soltar expectativas, em meditar de tênis, de forma simples… qualquer experiência mágica ou transpessoal já cria uma nova expectativa. E o nosso trabalho é habitar o presente sem expectativas.

Mas nunca sentiu nada extraordinário?

Na Índia, tive uma experiência de paz profunda, que não tinha nada a ver com felicidade. Era só paz, uma serenidade que eu nunca tinha sentido. Me senti iluminado. Fui ver o mestre, feliz, achando que tinha alcançado algo. Ele me olhou e, com uma simplicidade absoluta, disse:

“Continue. As experiências não importam. Deixe-as ir. Continue meditando.”

Conversei com meu mestre, Gerardo Abboud, e perguntei por que ele tinha “descartado” meu grande feito após dias e dias de meditação. E ele foi direto:

“Se você espera que a meditação seja uma espécie de lobotomia, vai se frustrar. Porque, como na vida de qualquer ser humano, há dias melhores e dias piores.”

O que sim está comprovado é que, com a meditação, você alcança um estado maior de calma, bem-estar e tranquilidade. E começa a perceber seus próprios relatos mentais. Você se torna consciente do que antes era inconsciente.

Isso é o que, na psicologia, chamamos de a tirania do perceber, a tirania da consciência. O verdadeiro salto de maturidade psicológica é quando paramos de esperar soluções mágicas. Não existe Papai Noel. Se eu quero um presente, vou lá e compro. E isso é duro de aceitar, porque o mapa da consciência é um território muito intricado.

Você falou também sobre compaixão. Qual a relação?

Somos tão exigentes conosco que, se fôssemos assim com os amigos, não sobraria nenhum. Precisamos ser compassivos com nós mesmos, e isso também se cultiva com a meditação.

[Fonte Original]

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