O terceiro volume de Slam Dunk segue com o arco narrativo do esquentado protagonista Hanamichi Sakuragi começando a entender — ainda que rudimentarmente — o significado do basquete como algo maior do que um meio de chamar a atenção de uma garota. Combinando humor, tensão e crescimento pessoal, O Complicado Arremesso Comum começa a colocar a obra em uma direção mais séria (tivemos nuances antes, mas aqui é mais perceptível), ainda que sem abandonar completamente o espírito cômico que definiu os primeiros capítulos. Ainda temos os blocos relativamente bobinhos em torno da sua paixonite por Hakuro, mas em termos de estrutura dramática, trata-se de um avanço claro rumo ao gênero esportivo e não tanto à comédia romântica.
Se os dois primeiros volumes foram essencialmente cômicos e apresentavam Sakuragi como um palhaço impulsivo e ignorante sobre o esporte, o terceiro começa a construir algo mais profundo, mesmo sem perder essa veia inicial. Aqui, pela primeira vez, vemos o protagonista querer melhorar por vontade própria. A chegada do jogo-treino contra o Ryonan serve como o catalisador dessa mudança, com boa parte dos oito capítulos condensando diversos treinos do protagonista, ao mesmo passo que também aprofunda a tensão entre Sakuragi e Kaede Rukawa como uma rivalidade saudável que deve puxar ambos os personagens para alçar novos patamares em suas habilidades. É um clichê básico de obras dessa ordem, mas também identificável e de muitas formas realista (rivalidades são a base de qualquer crescimento esportivo, como Magic x Bird para dar um exemplo basquetebolista).
Interessante pontuar como o roteiro de Inoue é mais sofisticado do que o maniqueísmo de um rival “vilão”. Rukawa não é arrogante — ele apenas é indiferente. Sua dedicação ao esporte, sua compostura e frieza em quadra, com momentos esporádicos de humor, consolidam-no como um personagem que é tanto um modelo para o protagonista superar, quanto um personagem com a gênese de um arco a ser construído. Ainda vejo-o como uma tábula rasa e talvez próximo demais do coadjuvante caladão de shounens, mas o arquétipo é funcional e há muito espaço para desenvolvê-lo nos próximos capítulos. Gostaria de ver um pouco mais de desenvolvimento de outras figuras secundárias da equipe, muitas escanteadas, com exceção do Akangi, que mais uma vez tem um papel definido de mentor e de alívio cômico em suas brigas com Sakuragi, todas divertidinhas, principalmente quando o protagonista quer só enterrar a bola.
Takehiko Inoue continua demonstrando seu domínio da linguagem visual do mangá esportivo e começa a entregar um pouco mais de personalidade estética. As cenas do jogo-treino são um laboratório técnico, com boa composição dos quadros — em especial o uso de planos fechados nos rostos suados, os olhos arregalados, os detalhes dos tênis raspando o chão — tudo colabora para uma experiência imersiva, sendo que estou ansiosíssimo para finalmente termos uma partida oficial. Mesmo quem nunca jogou basquete consegue sentir o peso das cenas, o ritmo dos passes, a envergadura dos arremessos e o espetáculo de um salto de enterrada (um bloco em especial de um “fã” do colégio é bacana nesse sentido).
O ritmo narrativo oscila um pouco entre momentos de mais ação com pausas cômicas menos engajantes, principalmente envolvendo as reações exageradas de Sakuragi, mas de maneira geral Inoue é competente nas alternâncias. Os melhores momentos continuam sendo quando os personagens estão treinando, com destaque para a manutenção da narrativa de “manual de basquete” do autor, que às vezes flerta um pouco demais com o didatismo, mas que segue eficiente em sua abordagem de ensinar sobre o esporte à medida que conta a história. O foco desse lado narrativo aqui está nas explicações sobre bandejas (o tal arremesso comum do título) e, mais superficialmente, na importância de rebotes, com esses momentos passando pelo filtro simbólico de Sakuragi errando e ainda sendo arrogante, mas aos poucos fazendo uma transição sutil de motivação pessoal para o coletivo.
Embora O Complicado Arremesso Comum não traga ainda as partidas épicas que, penso eu, consagrariam Slam Dunk como um clássico absoluto, ele é um volume que prepara bem o terreno e começa a mostrar sua real potência, sendo o arco que mais gostei até aqui. Gradualmente se afastando da comédia estudantil para um drama esportivo de formação, podemos ver o cenário de que esporte não é apenas palco para vitórias ou derrotas, mas um campo simbólico de amadurecimento, amizade e descoberta pessoal. Sakuragi tropeçando rumo à autossuperação é um mote esportivo que ressoa com facilidade no público-alvo (e pelo que tenho lido, até mesmo em uma parcela de leitores de mangá que não se interessam por esporte), então, outra vez, sigo animado para o que vem à seguir, especialmente depois de ver o grupo pela primeira vez de uniforme, pisando na quadra, sentindo o olhar do público e encarando os rivais. Que comecem os jogos!
Slam Dunk – Vol. 3: O Complicado Arremesso Comum (The Challenge of the Common Shot Shomin no Shūto wa Muzukashii / 庶民のシュートは難しい) – Japão, 1991
Contendo: Capítulos #19 a 26
No Brasil: Slam Dunk – Vol. 3 (Panini, agosto de 2005)
Roteiro: Takehiko Inoue
Arte: Takehiko Inoue
Editora: Shueisha
Revista: Weekly Shōnen Jump
248 páginas