- Author, Katty Kay
- Role, BBC Worklife
Ser jovem hoje em dia não é fácil. Vejo isso quando converso com meus filhos e os amigos deles.
Recentemente, venho relembrando minha época de jovem adulta.
Eu me formei na universidade em 1988 e saí direto para um emprego, com um bom salário.
No ano seguinte, eu já tinha economizado o suficiente para dar de entrada na minha primeira casa. E, antes de completar 30 anos, tive meu primeiro filho.
Quando olho para as experiências dos jovens de hoje, às vezes acho que cresci em outro planeta, não em outra geração.
De quem é a culpa por construir a vida ter ficado tão difícil?
Venho fazendo esta pergunta com frequência. E entrei em contato com Kyla Scanlon para ter algumas respostas.
Em 2022, ela cunhou o termo vibecession, em inglês, para definir o estado da economia americana durante o governo do ex-presidente Joe Biden (2021-2025).
Muitos dos seus seguidores são jovens que buscam respostas sobre suas finanças. Seu livro mais recente é In this Economy? How Money & Markets Really Work (“Nesta economia? Como o dinheiro e os mercados realmente funcionam”, em tradução livre).
Nossa conversa abordou justamente a questão de como a vida ficou tão insustentável para os jovens, financeiramente falando – especialmente nos Estados Unidos. E se existe uma resposta clara sobre os motivos e o que pode ser feito para resolver esta situação.
Se você é jovem, ou se tem um jovem na sua vida, você precisa ler nossa conversa abaixo, que foi editada por motivos de concisão e clareza.

Katty Kay (BBC): Vamos começar com o que parece ser uma espécie de tensão entre as pessoas sobre como a economia funciona para cada uma delas.
Este é o quadro: tenho 60 anos de idade. Você não tem 60 anos.
Eu me formei na universidade em 1988. Saí direto da universidade para um emprego com um salário razoavelmente bom, no serviço público britânico.
Com 29 anos, tive meu primeiro filho. Na época, não pensei ‘meu Deus, nunca vou conseguir sustentá-lo’. Mas, quando olho para os meus filhos e os amigos deles, é quase outro planeta.
Kyla Scanlon: Tenho 27 anos e me formei basicamente na pandemia.
O que você está contando parece muito distante de mim e das pessoas que conheço.
Para as pessoas com mais idade, havia meio que uma equação a seguir. As casas eram muito mais baratas. A educação tinha um retorno mais previsível. Não era tudo tão caro.
Por isso, acho que tem sido um desafio.
Kay: Você olha para o que eu tive e pensa ‘como assim? vocês simplesmente ficaram com tudo?’
Será que nós fomos a geração que tomou tudo para si e meio que deixou vocês sem nada? Nós fizemos algo deliberadamente para prejudicar vocês?
Se eu chegar e disser ‘oh, todos os boomers ficaram com todo o dinheiro’, não [é verdade]!
Alguns deles fizeram isso. Eles tiveram uma bela alta no mercado de ações, os custos da moradia provavelmente aumentaram quatro, talvez cinco vezes, nas últimas duas décadas e eles se recusam a vender aquelas casas.
A quantidade de baby boomers donos de três quartos é maior que o número de millennials [nascidos entre 1981 e 1995] que têm três quartos. E seria de se imaginar que os millennials fossem donos dessas casas, pois eles precisam delas para ter famílias, filhos e espaço.
Todos vocês também enfrentaram enormes batalhas, mas vocês começaram a vida, basicamente, em uma época perfeita que talvez nunca vejamos de novo na história. Vocês simplesmente tiveram muita, muita sorte.
Por isso, acho que precisamos mudar nossas expectativas e perceber que aquilo talvez não seja o futuro. Não podemos culpar os boomers por terem aproveitado a ocasião.
Kay: Então, a minha geração é a anomalia? Aquele período do pós-guerra simplesmente produziu um crescimento extraordinário e nós fomos os beneficiários – seja a geração dos meus pais ou a minha?
Scanlon: Sim, e também a mobilidade social ascendente.
[A economista francesa] Stefanie Stantcheva em Harvard fez uma ótima pesquisa sobre a mobilidade ascendente e ela simplesmente não existe na forma em que costumávamos observar.
Este é o sonho americano: comprar uma casa, ter filhos, ter um emprego e viver – e acho que isso desapareceu, principalmente, porque, agora, a economia está sofrendo as repercussões reais da expansão do pós-guerra, que beneficiou os baby boomers.

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Kay: Kyla, houve um momento em que tudo começou a piorar? Houve algo que os governantes fizeram ou deixaram de fazer para exacerbar esta mudança?
Scanlon: O que aconteceu, do lado político, é que os boomers votam e, como detêm alta representação na política, eles acabam projetando políticas que beneficiam a eles próprios.
É simplesmente este ciclo de décadas em que os que estão no poder querem permanecer – e estes são os incentivos colocados à sua frente. Eles irão projetar as coisas para que sejam desta forma.
Eles irão combater a moradia [a preços acessíveis] porque não querem que suas casas sejam desvalorizadas de alguma maneira.
Talvez eles não se aposentem com a idade que esperaríamos, para não perder sua posição de liderança. Eles simplesmente irão permanecer e isso cria um elemento de estagnação para quem tenta herdar o que vem depois.
Existem também muitas regulamentações e muitos entraves burocráticos, de forma que não podemos simplesmente colocar a culpa nos boomers por muitas coisas.
Mas, quando você olha para os Estados Unidos e realmente analisa [o PIB], este é o país mais rico do mundo e, às vezes, ele se recusa a ajudar seus cidadãos.
De fato, vimos muito apoio durante a pandemia, em termos de ajudar as pessoas com tolerância em relação aos aluguéis e suspender os pagamentos dos empréstimos estudantis.
Mas, nos Estados Unidos, existe uma luta mortal sobre como os cidadãos devem viver. E parte disso certamente vem de políticas que foram criadas pela população com mais idade.
Isso não é causado apenas pelos boomers, mas tem um grande impacto sobre como as pessoas enfrentam a economia.
Kay: Isso faz com que você e a sua geração queiram rever o sistema? Isso produz um grau de cinismo que, você acha, corre o risco de se tornar permanente?
Scanlon: Existe uma expressão chamada niilismo financeiro. Basicamente, é a ideia de que as pessoas desistiram totalmente de economizar para a aposentadoria.
Elas desistiram de avançar na sua carreira, por não acharem que haja um futuro para elas.
Isso me preocupa muito. Se perdermos a esperança, o que vem depois? O que você faz para que as pessoas a recuperem?
O que você pode dar a elas para que tenham esperança, se o sistema não fornece as oportunidades que elas esperavam?
[O jornalista e escritor americano] David Brooks publicou um ótimo artigo no The New York Times sobre a economia da rejeição – e a rejeição sem fim, dos aplicativos de namoro, das faculdades e dos empregos.
Simplesmente, a rejeição constante e a carga cognitiva que ela traz. E como ela realmente pode eliminar qualquer sentido de esperança nas pessoas.
Eu me preocupo muito com isso.

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Kay: Existe algum país no mundo que esteja agindo certo – ou pelo menos lidando melhor com a situação – e que poderíamos usar como exemplo?
Scanlon: Podemos aprender com todo tipo de países.
Acho que os Estados Unidos realmente precisam rever sua rede de segurança social e a Europa é um exemplo relativamente bom neste campo.
Muitos países enfrentam problemas para definir o que fazer com seus jovens, pois todos atualmente vivem por muito mais tempo nos países desenvolvidos.
A Áustria fez um trabalho muito bom na construção de moradias. Eles têm moradias sociais, apenas isso. Será que nós poderíamos simplesmente ajudar as pessoas a conseguir suas casas?
Kay: Quando você examina o que poderia mudar em termos de políticas, o que você gostaria de indicar?
Scanlon: É uma resposta simples, mas definir o zoneamento e a habitação. É preciso construir casas. Esta é apenas uma das formas de sairmos disso.
Outra questão são os custos das creches, que realmente dispararam nos Estados Unidos.
É muito difícil imaginar como cobrir estes custos, mas este é um ponto importante. Se quisermos incentivar as pessoas a ter filhos e continuar construindo suas vidas nos Estados Unidos, precisamos resolver a questão dos custos das creches.
Outra questão são os custos de assistência aos idosos. Cuidar de uma pessoa idosa [nos Estados Unidos] custa em média, eu acho, cerca de US$ 10 mil [cerca de R$ 55,5 mil] por mês. Também é muito difícil imaginar como bancar isso.
Se pensarmos simplesmente em meio que estabilizar a população, precisamos dar a elas um lugar para morar, ajudá-las a ter filhos e cuidar da nossa população de idosos, enquanto as pessoas caminham rumo ao que quer que venha depois disso. Eu me concentraria nestes três pontos.