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terça-feira, julho 8, 2025

Amplas reformas de Trump são aposta de risco

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Se os primeiros seis meses de governo de Donald Trump nos EUA tivessem o título de um filme, o mais adequado seria “Velozes e Furiosos”. Poucos presidentes americanos fizeram tantas reformas, e tão transformadoras, em tão pouco tempo. Se der certo, ele realizará uma guinada conservadora profunda, possivelmente com efeitos globais. Se der errado, corre o risco de uma derrota importante nas eleições legislativas de 2026, o que poderia lançar o país numa crise institucional. Trata-se de uma das jogadas políticas mais arriscadas da história dos EUA.

Na economia, as apostas de Trump contrariam o senso comum de diversas maneiras. Seu protecionismo econômico ameaça elevar a inflação nos EUA, o que pode manter os juros altos por mais tempo, freando a economia. O recém-aprovado pacote orçamentário é fiscalmente regressivo, pois beneficia mais os ricos, deve manter elevado o déficit fiscal americano e aumentar a dívida pública. Se objetiva reduzir impostos das empresas para fazê-las investir e gerar empregos, o sentimento generalizado de insegurança econômica ameaça paralisar investimentos, tanto nos EUA como pelo mundo.

Socialmente, Trump contrariou os latinos (cerca de 19% da população dos EUA) e outras minorias ao iniciar uma agressiva campanha de deportação de imigrantes em situação ilegal, mas que vem atingindo também pessoas que lá vivem legalmente. Em junho, o Departamento de Justiça americano anunciou que vai acelerar a revogação da naturalização de estrangeiros que tenham cometido certos crimes. Tudo isso vem gerando pânico entre os imigrantes e está afetando a disponibilidade e o custo da mão de obra em vários setores da economia.

Trump faz outra aposta arriscada ao cortar benefícios sociais para a população de baixa renda. Os principais cortes afetam o programa nacional de alimentação (que subsidia alimentos) e o Medicaid, que fornece cobertura de saúde gratuita ou a baixo custo num país que não tem um sistema público universal de saúde. O Escritório de Orçamento do Congresso estima que 12 milhões de pessoas correm o risco de perder a cobertura médica. Esses cortes visam a compensar parte da redução de impostos.

Trump subverteu ainda a política externa americana. Contrariou os principais aliados dos EUA ao impor tarifas comerciais punitivas, ao retirar boa parte do apoio militar e financeiro à Ucrânia e ao humilhá-los, como quando subscreveu a ideia de que os europeus são “parasitas”.

Seu governo vem buscando também influenciar explicitamente a política pelo mundo. Apoiou, por exemplo, a extrema direita nas eleições alemãs. Ontem, Trump defendeu o ex-presidente Jair Bolsonaro, dizendo que ele “não é culpado de nada” e sugerindo que está sendo perseguido politicamente. No domingo, ele ameaçou aplicar uma sobretaxa de 10% a produtos de “qualquer país que se alinhe às políticas antiamericanas do Brics”.

Trump também se voltou contra a ciência. Segundo estimativas, o governo deve cortar até 50% do gasto federal com pesquisa. Houve ainda demissões em diversas agências, como a Administração Nacional Oceânica e Atmosférica (Noaa). Trump iniciou um embate contra muitas das principais universidade americanas, o que levou à suspensão de bilhões em ajuda federal. Essa ofensiva contra a ciência está causando uma saída sem precedentes de pesquisadores americanos rumo a instituições no Canadá, na Europa e na Ásia. Isso tudo ameaça a inovação.

O presidente também recuou de políticas climáticas e ambientais. Retirou novamente os EUA do Acordo de Paris, cortou a maior parte dos incentivos para energias renováveis e redução de emissões (aprovados no governo Biden), isentou usinas elétricas a carvão de metas de emissões e estimulou a exploração de petróleo, mesmo em áreas protegidas.

Para muitos, Trump atentou ainda contra a Justiça, com uma série de medidas que violariam a lei. É o caso, por exemplo, do decreto que barra a concessão automática de cidadania a todos os nascidos em solo americano, que vigora desde a reforma constitucional de 1868. O governo ignorou ainda uma decisão judicial que proibia a deportação de um imigrante salvadorenho e vem detendo pessoas que expressaram críticas a Israel sem, porém, cometer crimes. Trump já afirmou, em sua rede social, que “aquele que salva o seu país não viola nenhuma lei”.

Possivelmente o último presidente a promover uma série tão profunda e rápida de reformas nos EUA foi Franklin Roosevelt. No começo de seu primeiro mandato, em 1933, ele aprovou boa parte das políticas do chamado New Deal. Roosevelt, no entanto, agia sob a pressão gerada pela forte crise econômica e social da Grande Depressão dos anos 1930.

Trump possivelmente pisou no acelerador das reformas para permitir que elas deem resultado antes das eleições legislativas de 2026. Se a economia tiver um bom desempenho até lá, os republicanos poderão manter a atual maioria no Congresso. Mas, se a economia patinar, Trump e seu partido dependerão exclusivamente do resultado da sua agenda socialmente conservadora.

É difícil de vislumbrar, por enquanto, para onde essa onda transformadora levará a maior potência global. Várias das reformas parecem ter sido feitas de improviso e ameaçam causar mais dano que benefício, como os cortes sem critério de funcionários públicos. Muito da política econômica e social preocupa até mesmo aliados do presidente, tanto no Congresso como nos mercados. Pesquisas têm mostrado uma deterioração da aprovação de Trump, que caiu de 52% em janeiro para 46% agora, na média elaborada pelo site RealClearPolitics. Parte da mídia americana começa a debater o risco de um “crash”, isto é, de uma piora da economia associada a uma reação mais vocal na sociedade contra as políticas do presidente. O roteiro “velozes e furiosos” de Trump é um filme de suspense que manterá o mundo imerso em incertezas por um bom tempo ainda.

[Fonte Original]

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