Por mais de um século, os Estados Unidos dependeram do trinitrotolueno (TNT) para armas militares e mineração comercial. Era abundante e barato, sendo vendido por apenas 50 centavos o quilo algumas décadas atrás. Produzido em milhões de toneladas durante as duas guerras mundiais e até a década de 1980, o TNT enchia projéteis de artilharia e bombas, ao mesmo tempo que tornava possível explodir rochas para construir estradas e fazer cimento para fundações de casas e grandes projetos de infraestrutura.
Mas a produção de TNT gera resíduos perigosos e, em meados da década de 1980, o Departamento de Defesa fechou a última instalação nos Estados Unidos que o produzia. Fornecedores estrangeiros — principalmente da China, Rússia, Polônia e Ucrânia — intervieram, oferecendo o explosivo a preços baixos e, ao mesmo tempo, lidando com os resíduos perigosos.
Uma segunda e importante fonte de suprimento para uso comercial era o TNT recuperado de munições como minas terrestres, projéteis e bombas que o Pentágono desativa regularmente. Embora as armas fossem consideradas velhas demais para uso pelas tropas americanas, os explosivos contidos nelas geralmente ainda eram totalmente viáveis e podiam ser reciclados.
Mas, de acordo com autoridades da indústria de detonação civil, essas fontes secaram, pois os militares dos EUA optaram por manter armas mais antigas em seu arsenal desde que a Rússia invadiu a Ucrânia em 2022.
A Polônia era a única fornecedora autorizada de TNT para o Pentágono. Mas tem enviado grande parte do que produz através de sua fronteira para a Ucrânia, que está usando toda a sua produção para seus próprios fins militares.
Isso ocorre porque duas das outras principais fontes de TNT, Rússia e China, pararam de exportar para os Estados Unidos, disseram as autoridades.
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Tudo isso colocou pressão na produção de armas dos EUA, bem como nas operações de detonação nas pedreiras que produzem grande parte da matéria-prima para pontes, estradas e edifícios nos Estados Unidos.
Em resposta, o Congresso autorizou a construção de uma nova fábrica de TNT administrada pelo Exército americano no Kentucky, que custará US$ 435 milhões (R$ 2,3 bilhões). A previsão é de que ela comece a operar no final de 2028, mas produzirá o explosivo apenas para uso militar, e não há planos de vendê-lo à indústria privada para ajudar a aliviar o déficit doméstico.
A escassez pode em breve retardar o progresso de projetos de construção nacionais e tornar certas matérias-primas mais caras.
— O mundo como o conhecemos não existe sem explosivos industriais — disse Clark Mica, presidente de uma associação comercial da indústria de explosivos, em uma entrevista.
Para quase tudo o que é minerado, acrescentou, “nove em cada dez explosivos estão envolvidos de alguma forma”.
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E esse processo geralmente começa em uma pedreira.
Em um desses locais na zona rural da Virgínia, o Mica estava no fundo de um poço de 91 metros de profundidade escavado na encosta de uma colina enquanto trabalhadores se preparavam para explodir mais de 100 mil toneladas de granito de uma só vez.
A indústria de detonação comercial aprendeu a tornar seu trabalho menos disruptivo. Levantamentos e cálculos antes feitos manualmente agora são produzidos com mais rapidez e precisão graças a drones, scanners 3D e computadores que planejam onde e quando detonar a quantidade necessária de explosivos para realizar o trabalho.
— Começa com a perfuração de um buraco e o preenchimento com explosivos — explicou.
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Enquanto Mica observava, caminhões especializados misturavam nitrato de amônio com outros produtos químicos para criar um agente de detonação espesso que era então bombeado para dentro dos buracos.
Pequenas quantidades de TNT são normalmente usadas para fazer essa mistura explodir. Pequenos detonadores eletrônicos, com tempo de ação de milissegundos, disparam cargas de TNT do tamanho de latas de refrigerante colocadas na parte superior e inferior de cada buraco, comprimindo e detonando o agente de detonação.
A explosão resultante, que teve mais que o dobro da potência da maior bomba lançada no Afeganistão, elevou brevemente o penhasco no ar e derrubou mais de 110 mil toneladas de rocha no fundo do poço cheio de água. Mas o barulho e o tremor do solo causados pela grande explosão eram insignificantes a 450 metros de distância.
Logo após a poeira baixar, tratores gigantescos, escavadeiras e caminhões basculantes começaram a mover o granito quebrado para máquinas de britagem logo acima da mina, para que pudessem ser triturados e usados pela indústria pesada.
Para manter operações de detonação como essa enquanto a guerra na Ucrânia se arrasta, as empresas estão buscando alternativas ao TNT.
Um candidato chamado tetranitrato de pentaeritritol, ou PETN, já é produzido por três fábricas nos Estados Unidos, mas não está claro com que rapidez a produção pode ser aumentada.
Nos últimos anos, o Pentágono tem contado com uma única fábrica na Polônia para o TNT de que necessita. Mas parece que o Departamento de Defesa também pode ter garantido outras fontes de TNT.
Uma porta-voz do Exército, que falou sob condição de anonimato porque não estava autorizada a falar publicamente sobre o acesso do serviço a explosivos, indicou que o serviço não depende mais apenas da fábrica na Polônia e destacou os esforços contínuos para aumentar a produção nacional de propelentes e explosivos nos Estados Unidos.