A COP30 se aproxima, e o debate sobre o financiamento de soluções para a crise climática ganha força. Cada vez mais, projetos de empresas inovadoras têm entrado no radar de investidores privados, como os das chamadas climatechs, as startups do clima. Estima-se que o potencial de recursos a serem destinados a elas globalmente seja de US$ 80 bilhões até 2029, mas somente 4% são direcionados para América Latina e África juntas devido à imaturidade do setor, segundo projeções de mercado. O Brasil é o grande protagonista, recebendo mais de 60% dos investimentos de capital de risco destinados à América Latina.
Oportunidades para o Brasil nesse campo serão tema da 4ª edição do Brazil Climate Summit (BCS), que ocorre nesta sexta-feira, na Universidade Columbia, em Nova York. O evento ocorre às vésperas da semana climática de Nova York. Rico em biodiversidade e energia limpa, o país desponta como um dos principais provedores de soluções transformadoras, escaláveis e com potencial de alto retorno.
“A prosperidade passa por o Brasil liderar a transição para o modelo de economia descarbonizado, que vai depender do redirecionamento de capital do setor financeiro”, afirma a coidealizadora do BCS e fundadora da Converge Capital, Marina Cançado. “Estima-se que 80% virão do setor privado. O recurso público pode ter papel catalítico importante, como o BNDES está fazendo muito bem no Brasil, mas para alavancar. Depois, o recurso é do setor privado.”
Segundo ela, investimentos em clima e natureza já acontecem de forma significativa no Brasil. Mas soluções menos maduras demandam investidores sistêmicos, que, mais do que aportar recursos financeiros, precisam apoiar o desenvolvimento e a consolidação de novos modelos de negócio.
“A agenda de clima está fazendo com que os investidores tenham que ir além. Para que seus investimentos sejam bem-sucedidos, eles precisam ser orientados à construção de novas cadeias de suprimento, de novas cadeias de valor e de novos setores da economia”, defende Cançado.
Temos centenas de milhões de reais sob gestão e vamos levantar ainda mais fundos, grande parte para clima”
— Murilo Menezes
Segundo Marina, essa postura é fundamental para que tecnologias emergentes – como rações feitas com algas para reduzir o metano no gado – possam sair do laboratório e chegar às cadeias globais de produção.
“É o caso das climatechs, que buscam soluções tecnológicas para destravar processos produtivos, desenvolver novos materiais ou transformar uma descoberta científica em negócio. Há todo um tempo do desenvolvimento até a escala, com vários desafios nesse processo. É aí que entra o capital de risco, seja anjo, seed, depois, venture capital, private equity”, afirma.
O Brazil Climate Summit tem painel exclusivo sobre investimentos em climatechs, com a participação de grandes fundos – Collaborative Fund e TPG Rise – e da climatech Terradot, criada nos laboratórios da Universidade Stanford, mas com atuação no Brasil.
Com hubs em Mato Grosso do Sul, Paraná e São Paulo, a Terradot remove carbono da atmosfera de forma permanente, por intemperismo acelerado de rochas (ERW), tecnologia que promove uma reação geoquímica entre o pó de rochas silicáticas, espalhado sobre solos agrícolas, e a água da chuva. O processo mineraliza o carbono e ainda melhora a qualidade do solo para a agricultura.
“Além de chuva, o Brasil tem um agronegócio muito desenvolvido, em áreas sobrepostas às pedreiras necessárias, o que facilita a logística e reduz nossa emissão de carbono”, diz a cofundadora e diretora financeira da Terradot, Julia Sekula. “Nosso maquinário é elétrico, a matriz energética é limpa, temos a Embrapa, nossa parceira, e pesquisa de ponta.” Sekula é coautora do livro “Brasil: paraíso restaurável”.
Em duas rodadas de investimento, a Terradot levantou um total de US$ 58,2 milhões, de investidores como John Doerr; Climate Innovation Fund, da Microsoft; Google e Cisco, entre outros.
“Fomos a primeira empresa de clima do mundo na qual o Google investiu e a primeira [investida pelo Google] com atuação na América Latina”, comemora Julia Sekula.
Microsoft e Google são também clientes da Terradot. A remoção permanente de carbono atrai big techs, emissoras significativas de carbono com metas ambiciosas de neutralidade e carbono negativo.
A empresa é uma das 11 startups fundadoras do Fórum Brasileiro de Climatechs, criado em 2024 para identificá-las como novo setor econômico a ser desenvolvido. Hoje, são 20 associadas e mais de 50 em processo de adesão.
“A gente considera climatech toda empresa que está desenvolvendo inovação com base tecnológica, e isso significa hardware, software e biotech de alta escalabilidade para mitigação e adaptação climática”, diz a fundadora e diretora-executiva do FBC, Ana Himmelstein, que também estará no Brazil Climate Summit.
Segundo Himmelstein, só as startups fundadoras levantaram, juntas, mais de R$ 2 bilhões, captados de fundos de venture capital focados em tecnologia, com teses agnósticas (sem relação direta com clima). Já o acesso a recursos públicos, como o Fundo Clima, por associadas da FBC tem sido difícil, pois as climatechs têm modelo de negócio de startup, sem garantias para entrar num instrumento financeiro padrão.
“É preciso orquestrar stakeholders, financiadores com teses e apetites diversos, para que a gente consiga fazer este capital chegar nos mais variados estágios de desenvolvimento das climatechs, essenciais para o combate à crise climática”, afirma.
A startup Eureciclo já está num estágio mais avançado, com atuação também no Chile. Com recursos da Positive Ventures, uma entusiasta de tecnologias escaláveis que promovem impacto, a Eureciclo desenvolveu, com tecnologia própria, certificados de reciclagem rastreáveis e hoje é a maior operadora de logística reversa de embalagens do país.
A venture capital também investe em climatechs americanas centradas em inteligência artificial e as traz para o Brasil. A Funga, por exemplo, utiliza machine learning para calcular combinações microscópicas de fungos no solo que aceleram o crescimento de florestas, com o objetivo de sequestrar carbono. A startup faz ensaios de campo no sul do Brasil, e esse potencial de impacto direto no país foi determinante para o investimento.
“Temos centenas de milhões de reais sob gestão e vamos levantar ainda mais fundos. Grande parte será canalizada para clima”, diz Murilo Menezes, sócio gestor e diretor de investimentos da Positive Ventures.