27 C
Brasília
terça-feira, outubro 7, 2025

Crítica | Black Science – Vol. 3: Padrão de Fuga – Plano Crítico

- Advertisement -spot_imgspot_img
- Advertisement -spot_imgspot_img

  • spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais volumes. 

Black Science é uma série em quadrinhos marcada por uma quase inacreditável consistência narrativa, seja ela escrita ou visual, graças aos minuciosos trabalhos de Rick Remender nos roteiros e de Matteo Scalera na arte. E isso apesar de ser um quebra-cabeças com peças repetidas ad infinitum em razão de sua premissa multiversal, o que em mãos menos hábeis poderia se tornar uma sucessão de histórias conectadas que correm atrás de seu próprio rabo em um eterno ciclo cansativo. O que se constata, em Padrão de Fuga, o terceiro arco da série compreendendo as edições #12 a 16, é o cuidadoso encaixe dessas peças e a respectiva movimentação graciosa no tabuleiro, o que transforma uma aventura de premissa fascinante em uma história que se preocupa em trabalhar seus personagens da melhor forma possível, elevando-os a muito mais do que mero peões criados para agradar leitores que só querem ação ininterrupta.

O arco começa com a revelação de que o Grant McKay “estilo Indiana Jones” que foi apresentado em Bem-Vindo, Lugar Nenhum na verdade é o McKay original (sob a perspectiva da HQ, lógico) que foi largado na Terra dos símios brancos hospedeiros de entidades fantasmagóricas de Como Cair para Sempre, entidades essas que, via os ditos símios, operaram o personagem de forma que ele consertasse o pilar quebrado, oportunidade que ele uso para, na verdade, consertar o pilar portátil que ele obtivera anteriormente, o que o permitiu viajar por uma infinidade de dimensões até finalmente encontrar a que estava sua família certa, ou seja, na Terra medieval controlada por criaturas lagartoides. E, semelhante a justamente ao arco da Terra medieval, Padrão de Fuga atem-se a uma única versão extradimensional de nosso planeta, versão essa em que quase toda a população foi dizimada por uma pandemia trazida de ainda outra dimensão por Dimensionautas liderados pelo McKay de lá, o que não só deixa evidente o quanto os comentários de Kadir estavam certos sobre o perigo da tecnologia, como entrega ao leitor a dimensão mais assustadora até esse ponto.

Afinal, como não imaginar o ciclo vicioso iniciado com a invenção do pilar – sem contar que não sabemos se o pilar do “nosso” McKay foi o primeiro – levando ao seu uso irresponsável ao ponto de um milagre científico ser, também, o apocalipse? E a coisa fica ainda mais interessante quando essa mais recente Terra é tomada não de monstros, mas sim de humanos que parecem vir de uma Roma Antiga tecnológica, quase cyberpunk, pronta para eliminar por completo a ameaça representada por hereges que trouxeram a doença para lá. Com isso, claro, Scalera tem seu espaço para criar seus visuais sempre impressionantes que valem o preço da HQ por si mesmos, seja por sua criatividade na extrapolação daquilo que conhecemos da Roma Antiga, ou pela forma como ele lida com os momentos de ação vertiginosa, especialmente a sequência alongada em que McKay, tomada pelo renovado propósito de fazer o bem custe o que custar, parte em um voo (com um jato portátil, tecnologia comum para esses “romanos”) desesperado para propagar a cura para a pandemia.

Em termos de desenvolvimento de personagens, há uma inegável movimentação pendular que pode chamar negativamente a atenção dos leitores. Kadir, que no primeiro arco é pintado como o grande vilão, torna-se um herói no segundo, somente para reverter novamente a vilão neste terceiro. McKay, desesperado para salvar seus filhos, havia há muito esquecido toda a ciência e o objetivo dela, sendo relembrado aqui e mudando completamente em um estalar de dedos. São, de fato, mudanças radicais demais para os personagens antagônicos centrais e que sem dúvida causa estranheza, mas tenho para mim que existem fatores que mitigam o problema. O primeiro deles é a pressão psicológica em cima de todos os personagens, outro é a forma como as revelações das intenções originais de cada um deles é revelada, sempre de maneira parcimoniosa, mas que justificam mudanças de raciocínio. Se Kadir começa como o empresário que quer que a invenção de McKay falhe, a revelação de que ele, na verdade, é apaixonado por Sara, esposa que McKay rejeitou por Rebecca faz com que tudo seja recontextualizado.

E, no caso do próprio McKay, ele carrega toda a responsabilidade pelo que aconteceu sobre seus ombros, aos poucos percebendo que não é uma responsabilidade sobre o que aconteceu somente com ele e seu grupo, mas sim com todas as dimensões afetadas pelo efeito dominó da invenção do pilar (mesmo se ele não foi o primeiro a inventá-lo, vale dizer). Ao ser chacoalhado por Shawn, McKay lembra de sua ciência ideológica em busca de um mundo melhor e parte para fazer tudo o que pode pelo mundo condenado onde está. O que, porém, não funciona direito para mim é a “caixa faz-tudo” do xamã que McKay se apropria para preparar o antivírus e soltá-lo na atmosfera. Mesmo entendendo que ela veio de uma dimensão onde isso existe – o que já é uma conveniência -, temos que imaginar que um kit de primeiros socorros desse tipo é uma facilitação extremada que parece ser tão poderosa que não há nada que ela não pode fazer, seja curar feridas convencionais ou, claro, eliminar a ação de um vírus mortal em todo um planeta.

Por outro lado, os momentos finais que esticam os segundos que faltam para o novo salto dimensional é coisa de cinema, com uma sucessão de eventos mal compreendidos que levam a ações errôneas e mortais que, claro, muda tudo novamente, com a cereja no bolo sendo Chandra, que fora tomada por um dos seres incorpóreos do planeta dos macacos (he, he, he…), chegando à Terra que McKay acabara de salvar trazendo toda sua legião de amigos fantasmagóricos para tomar posse dos “romanos” sobreviventes. Ah, a ironia do destino… Como disse, são peças repetidas, mas seus encaixes criam combinações infinitas que Remender e Scalera não se furtam em explorar.

Black Science – Vol. 3: Padrão de Fuga (Black Science – Vol. 3: Vanishing Point (EUA, 2015)
Contendo: Black Science #12 a 16
Roteiro: Rick Remender
Arte: Matteo Scalera
Cores: Moreno Dinisio
Letras: Rus Wooton
Editoria: Sebastian Girner
Editora original: Image Comics
Datas originais de publicação: entre março e julho de 2015
Editora no Brasil: Editora Devir
Data de publicação no Brasil: setembro de 2021
Páginas: 133



[Fonte Original]

- Advertisement -spot_imgspot_img

Destaques

- Advertisement -spot_img

Últimas Notícias

- Advertisement -spot_img