Uma descoberta astrofísica surpreendente desvendou um mistério que por muito tempo cercou Betelgeuse, a estrela avermelhada que brilha intensamente no ombro do Caçador da constelação de Órion e que está prestes a explodir em uma supernova.
Contrariando as expectativas de que sua elusiva companheira fosse um remanescente estelar denso e antigo, pesquisadores da Universidade Carnegie Mellon, em Pittsburgh, EUA, revelaram que “Alfa Orionis B” é, na verdade, uma estrela jovem com massa comparável à do nosso Sol.
Publicado na quarta-feira (8) no periódico The Astrophysical Journal, o achado redesenha dramaticamente a compreensão sobre a evolução deste fascinante sistema binário.
O que se sabe sobre a companheira de Betelgeuse:
- A existência da companheira de Betelgeuse (Alfa Orionis A), nomeada oficialmente como Alfa Orionis B, foi confirmada em julho;
- Ao contrário do que se pensava, “Betelbuddy” (apelido que, em inglês, faz referência à expressão “amigo de Betelgeuse”) não é uma anã branca (último estágio na vida de uma estrela) ou estrela de nêutrons (um dos resultados possíveis de uma explosão estelar);
- Segundo o novo estudo, trata-se de uma estrela jovem em pleno vigor, com massa estimada em cerca de 1,5 vez a do Sol;
- A intensa luminosidade e o tamanho gigantesco de Betelgeuse tornavam a observação da companheira um desafio técnico imenso;
- A interação entre as duas estrelas pode ser a chave para entender os estranhos períodos de escurecimento observados na supergigante vermelha.
Desvendando os segredos de Alfa Orionis B – uma estrela surpreendente
Há muito se suspeitava que Betelgeuse, uma supergigante vermelha cerca de 700 vezes maior e milhares de vezes mais brilhante que o Sol, não estava sozinha. Após a confirmação dessa suspeita em julho deste ano, com a descoberta oficial de sua companheira, um novo estudo traz agora detalhes surpreendentes sobre a natureza dessa parceira estelar.
Conhecer as características da segunda estrela é fundamental, pois a interação entre as duas é a principal hipótese para explicar os intrigantes ciclos de escurecimento de Betelgeuse. No entanto, o desafio era imenso: para superar o brilho ofuscante da supergigante, que tornava a observação quase impossível, os pesquisadores precisaram aproveitar raras janelas de visibilidade, momentos em que a companheira não estava completamente imersa na luminosidade da irmã famosa.

Equipamentos de ponta no espaço – como o Observatório de Raios-X Chandra e o Telescópio Espacial Hubble – e em solo – como o Telescópio Gemini Norte, instalado no topo do vulcão adormecido Mauna Kea, no Havaí, EUA – foram direcionados para o sistema, coletando dados cruciais em um esforço meticuloso, que exigiu precisão e agilidade.
Em um comunicado, Anna O’Grady, autora principal do estudo, destacou a complexidade da missão. “Acontece que nunca houve uma boa observação em que Betelbuddy não estivesse atrás de Betelgeuse”, explicou. “Esta representa as observações de raios X mais profundas de Betelgeuse até hoje. A diferença de brilho entre Betelgeuse e esta pequena companheira é absolutamente insana. O fato de agora podermos confirmar que algo está lá demonstra o quanto nossa ciência avançou.”
As observações revelaram que a companheira é uma estrela jovem, com cerca de 1,5 vez a massa do nosso Sol. Essa descoberta surpreendeu a comunidade científica, que esperava encontrar uma “casca” estelar no fim de sua vida, como uma anã branca ou uma estrela de nêutrons.
O’Grady enfatizou a importância dessa distinção. “Poderia ter sido uma anã branca. Poderia ter sido uma estrela de nêutrons. E esses são objetos muito, muito diferentes. Se fosse um desses objetos, apontaria para uma história evolutiva muito diferente para o sistema.”

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Descoberta abre novas portas na astrofísica
A presença de uma estrela jovem em vez de um remanescente estelar tem implicações profundas para a astrofísica. Além de oferecer uma nova perspectiva sobre a história evolutiva de Betelgeuse, a companheira pode desempenhar um papel crucial nos períodos de escurecimento da supergigante. Os cientistas agora teorizam que Alfa Orionis B pode “varrer” a poeira que ocasionalmente bloqueia a luz de Betelgeuse, causando suas flutuações de brilho.
Esse par incomum também desafia as concepções tradicionais sobre sistemas binários. Muitas das duplas conhecidas consistem em estrelas com massas mais próximas. A grande assimetria entre Betelgeuse e sua jovem companheira abre um “novo regime de binários de razão de massa extrema”, segundo O’Grady. “É uma área que não foi muito explorada porque é muito difícil encontrá-los ou mesmo identificá-los, como conseguimos fazer com Betelgeuse”, concluiu a pesquisadora.
Assim, a resposta a um antigo mistério sobre Betelgeuse deu origem a um desafio ainda maior: encontrar e entender outros “pares impossíveis” como este. A gigante de Órion e sua irmã menor se tornaram um laboratório natural para testar os limites da formação estelar, forçando os astrônomos a procurar por parceiras semelhantes que, até hoje, escaparam à detecção, encobertas pela luz de suas companheiras dominantes.