Os maiores desafios para o comando de companhias no Brasil são crescimento sustentável do negócio, formação de times de alta performance, definição e implemento de estratégias e gestão das finanças e da estrutura de capital, na visão dos próprios CEOs. As informações são do Painel de Governança & Remuneração, pesquisa elaborada pela consultoria LFG Governança e Gestão, com apoio da Idee Consultoria, do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) e do jornal Valor.
A sondagem é a primeira no país que envolve ações de governança e práticas de remuneração na liderança das empresas. Segundo Luiz Fernando Giorgi, sócio da LFG e responsável pelo trabalho, foram ouvidas 72 companhias por meio de 350 entrevistas com CEOs, presidentes de conselhos de administração, conselheiros, integrantes das áreas de RH e de governança corporativa. “Reunimos uma plataforma com mais de 11 mil informações”, afirmou Giorgi, durante o evento de divulgação da pesquisa, em São Paulo.
Pesquisa abordou 30 das 100 maiores companhias brasileiras
Os nomes das empresas que participaram são sigilosos, mas o grupo é responsável por uma receita líquida de R$ 2 trilhões em 2024, correspondente a 20% do Produto Interno Bruto (PIB) do país e 40% da capitalização de mercado das negociadas na B3. De acordo com ele, o grupo inclui 30 das 100 maiores companhias brasileiras. A maioria delas (68%) é de capital aberto, sendo que, do total, 22% têm capital pulverizado e 78% têm controle do capital definido, nas mãos de um grupo identificado de acionistas.
Na opinião dos presidentes de conselho, o desempenho do CEO da sua empresa está muito acima do esperado ou um pouco acima do esperado para 67% dos ouvidos na pesquisa. O trabalho mostra ainda que as empresas não estão preparadas para a sucessão, na média. Isso porque 65% dos presidentes de conselho dizem que o desafio de sucessão não será superado em dois anos, enquanto 60% dos presidentes fazem a mesma afirmação.
Um CEO é demandado para 42 reuniões por ano
Lidar com a estrutura de governança também é considerado um desafio, já que, pelas respostas, um CEO é demandado para 42 reuniões por ano entre encontros do conselho, dos comitês e reuniões com executivos fora do ambiente de trabalho para definição de estratégias, o que representa cerca de 20% do tempo útil de um presidente. “As demandas internas e externas de um CEO são muito grandes”, avaliou Giorgi.
Ainda conforme os presidentes de conselhos, os principais desafios enfrentados pelos colegiados estão relacionados a estratégia e competitividade, questões regulatórias e de compliance, riscos tecnológicos e reputação no mercado.
O PGR envolve ainda as políticas de remuneração do alto escalão das empresas. Foi avaliado o grau de confiabilidade dos dados públicos informados pelas companhias abertas à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que têm por finalidade dar transparência aos investidores.
Pelas informações coletadas com 46 das participantes, os dados do Formulário de Referência (FRE) entregues à CVM estão 25% acima de suas práticas em remuneração da liderança, levando-se em conta os salários, os incentivos de curto prazo pagos e os de longo prazo. Segundo a pesquisa, a remuneração anual dos CEOs varia entre um pouco abaixo de R$ 7 milhões e pouco mais de R$ 25 milhões.
“Definir políticas e o pacote de remuneração do CEO com base no FRE implica risco de inflacionar a remuneração”, afirmou Leonardo Salgado, sócio da Katálysi Consultoria, responsável pela área de remuneração na PGR.
De acordo com a consultoria, o modelo de pagamento mais utilizado, em 70% das empresas, é plano de unidades de ações restritas (RSU), unidades de ações de performance (PSU) ou uma mistura dos dois. No primeiro modo, as ações serão pagas após um determinado período no exercício do cargo, enquanto o segundo modo leva em consideração o desempenho do executivo e atingimento de metas.
“Remuneração fixa dos presidentes de conselhos é praticamente simbólica”
Para presidentes de conselho, a remuneração fixa tende a se aproximar do salário base na mediana dos salários dos CEOs. “A remuneração fixa dos presidentes de conselhos é praticamente simbólica”, conta Giorgi. Ele explica que a faixa salarial varia em função de fatores como porte da empresa, o nível de robustez e complexidade e tempo dedicado ao ofício, sendo que 50% dos conselheiros recebem adicionais por cada comitê que integram.
Os dados da consultoria mostram que a remuneração pode chegar a quase R$ 3 milhões por ano para presidentes de conselho e pouco menos de R$ 1 milhão anual para conselheiros – considerando o adicional por comitê. Do total, apenas 12% das companhias realizam pagamento da remuneração ao presidente do conselheiro baseada em ações, apesar de 56% ser a favor da prática.
Divulgação de balanços: trimestral ou semestral?
A ideia do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de empresas americanas de capital aberto mudarem a periodicidade da divulgação de seus resultados financeiros de trimestral para semestral pode criar dinâmicas negativas de diálogo entre as companhias e seus acionistas, disse Stanislav Shekshnia, diretor e professor do Instituto Europeu de Administração de Empresas (Insead, na sigla em inglês).
Segundo ele, as empresas deveriam decidir a frequência com que publicam seus balanços, mas é importante considerar que a divulgação a cada três meses reduz risco de a administração se apropriar da companhia, além de ser um bom método de manter a diretoria “sob controle”.
“[A medida] vai dar à administração mais discricionariedade sobre como as coisas acontecem. Em casos de uma administração pouco profissional e responsável, haverá riscos para os acionistas”, disse ele, ao Valor, após o evento para a divulgação do Painel de Governança & Remuneração, em São Paulo.
Para além dos resultados, o processo entre a temporada de balanços desempenha uma essencial função de organizar a empresa. E para isso, é preciso um presidente do conselho de administração capaz de gerir seus conselheiros, explica o especialista em governança corporativa.
Para Shekshnia, o líder do colegiado deve estar mais focado no modo como o conselho interage e contribui para determinada questão, e não no resultado final. “O bom presidente [do conselho] não se preocupa com as decisões, ele se preocupa com o processo”, opinou o professor. “É [preciso ter] a habilidade de estar perto, mas de não sujar as mãos.”
Questionado sobre as diferenças entre os conselhos de empresas brasileiras e estrangeiras, ele destacou que mais membros dos conselhos de empresas do Brasil são também acionistas da companhia. Outro fator que diverge entre as culturas é a maior formalidade entre os membros e mesmo nas reuniões de grupos internacionais.
Para otimizar os encontros, ele recomendou maior agilidade, mais colaboração com os diretores e maior uso de ferramentas de inteligência artificial.