Embora a situação vivida hoje no Rio não seja nova e os efeitos dos problemas na segurança venham sendo sentidos há muito tempo, episódios como o desta terça-feira (28) levam investidores a pensar duas ou três vezes antes de tomar uma decisão de investimento, disse ao Valor o economista Arminio Fraga. “É uma crise que está conosco há bastante tempo.”
Arminio avaliou que a situação no Rio, tido como um cartão de visitas do Brasil, chama mais a atenção, embora os problemas de segurança tenham se tornando um questão não só nacional, mas “continental”. “A história de outras cidades, de outros países, sugere que o problema tem solução. O Estado pode, se organizando em uma ação estratégica, enfrentar essa questão. No caso do Brasil, tem jeito, mas é um desafio enorme”, reconheceu.
Visão semelhante tem a pesquisadora Juliana Trece, da Fundação Getulio Vargas (FGV), segundo a qual os problemas de segurança pública no Rio ajudam a “afugentar” investimentos no Estado. Trece acompanha estruturalmente a economia fluminense. Estudos conduzidos pela economista mostram que o Rio foi a unidade da federação com menor crescimento de Produto Interno Bruto (PIB) entre 1985 e 2022, com expansão média anual de 1,6%, no período.
O Estado, diz ela, passou por um processo de desindustrialização aguda, mais intensa que a nacional, além de ter sido o único com retração do emprego formal entre 1985 e 2024. “A segurança, obviamente, não é a única variável a explicar essa deterioração, mas ela colabora para afugentar investimentos”, disse. “Se você é um investidor e precisa tomar uma decisão de investimento hoje e vê o que acontece no Rio de Janeiro, não vai ser a sua prioridade investir aqui”, admitiu.
Os problemas de segurança acabam criando impactos indiretos em outras áreas, como de logística, acrescentou Trece. Hoje vias e avenidas do Rio foram fechadas por barricadas montadas por criminosos. Também houve fechamento de comércios e de universidades.”
Em nota, a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) afirmou: “É urgente garantir que as pessoas possam viver e trabalhar em um ambiente de paz. A segurança pública interfere diretamente no desenvolvimento de um território e das pessoas que nele vivem. Segundo pesquisa recente da Firjan, dois em cada três empresários fluminenses consideram questões de segurança na hora de decidir seus investimentos. O problema de insegurança é nacional e não exclusivo do Rio de Janeiro. Por isso defendemos uma integração e ações de inteligência dos governos federal, estadual e municipais para enfrentar o crime organizado.”
Josier Vilar, presidente da Associação Comercial do Rio de Janeiro (ACRJ), também defendeu uma atuação conjunta das autoridades: “Obviamente que uma crise como a que estamos vivendo hoje é muito ruim para quem aqui vive, trabalha ou deseja investir. Por isso, a ACRJ já se posicionou a favor da urgente avaliação e aprovação da PEC da Segurança pelo Congresso Nacional, bem como pela constitucionalização do SUSP. As forças de segurança de municipios, Estados e federal precisam atuar em conjunto e com dados e inteligência integrados.”
O setor hoteleiro tentava medir as consequências. Alfredo Lopes, presidente do HotéisRio, admitiu que a megaoperação policial e seus efeitos são negativos para a imagem do Rio: “É um desgaste. Talvez pudesse ter sido feito antes do início da alta temporada que vai se dar agora com o verão, no caso do turismo”. Lopes reconheceu, porém, que ações para melhorar a segurança são necessárias.
Fábio Bentes, economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), fez avaliação semelhante sobre os efeitos para a economia do turismo fluminense: “Essa imagem, até que seja esquecida pelos turistas estrangeiros, vai levar um tempo”, afirmou. E acrescentou: “Perdemos bastante [quando o turista estrangeiro desiste de vir ao Rio] porque o gasto do turista estrangeiro no Brasil, por viagens, é de cerca de US$ 1 mil em média”.
O economista lembrou ainda que o Brasil está registrando recordes de entrada de turistas estrangeiros este ano e deve ultrapassar a marca de mais de 8 milhões de visitantes internacionais. Até setembro, o país contabilizou mais de 7 milhões de turistas estrangeiros. “E isso [a operação policial] ocorreu às vésperas da alta temporada [de turismo, que começa em dezembro]”, acrescentou.
Mauro Osório, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), concorda que a desestruturação pela qual o Rio passa há décadas resulta em danos à imagem da cidade e do Estado e afasta investimentos. “É uma catástrofe. Não é à toa que o Rio é uma das economias que menos crescem no país. Enquanto o setor público do Rio não for reestruturado, não vai ser invadindo favelas que vai resolver [o problema].”