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sexta-feira, outubro 31, 2025

Halloween: 3 ‘poções’ do folclore das bruxas que realmente têm significado medicinal hoje em dia

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Com a aproximação do Halloween, histórias de bruxas e suas poções ressurgem, frequentemente envolvendo plantas sinistras como beladona, mandrágora e artemísia. Essas plantas, envoltas em mitos e folclore, há muito são associadas a feitiços e bruxaria. No entanto, por trás de sua reputação assustadora, esconde-se uma fascinante história farmacológica e, em alguns casos, uma relevância médica contínua.

A beladona (Atropa belladonna), também conhecida como “erva-moura mortal” ou “nightshade mortal”, tem uma longa e contraditória história como veneno e remédio. Seu nome, que significa “mulher bonita” em italiano, faz referência ao uso cosmético que teve no Renascimento, quando mulheres aplicavam o suco de suas bagas para dilatar as pupilas e parecer mais atraentes.

Mas essa beleza vem com perigo. A beladona é altamente tóxica — a ingestão de apenas algumas folhas ou bagas pode ser fatal, e tocá-la pode irritar a pele. Ela também foi usada por diversas culturas por suas propriedades alucinógenas.

O poder da planta vem dos alcaloides tropânicos, como a atropina e a escopolamina. Essas substâncias bloqueiam a ação da acetilcolina, um neurotransmissor responsável por enviar mensagens entre as células nervosas do sistema nervoso parassimpático, que regula funções corporais essenciais como batimentos cardíacos, respiração, memória, aprendizado, transpiração, digestão e micção.

Na medicina moderna, a atropina é usada para dilatar as pupilas em exames oftalmológicos, tratar bradicardia (batimentos cardíacos lentos) e como antídoto para envenenamentos por organofosforados, presentes em pesticidas e agentes de guerra química. Já a escopolamina é prescrita contra enjoo de movimento e náusea pós-operatória.

A pesquisa científica continua destacando a relevância médica da beladona, mas os alertas sobre segurança persistem. Diversas agências de saúde emitiram avisos sobre produtos homeopáticos contendo beladona, especialmente os destinados a bebês (para dentição e cólicas), após relatos de convulsões e dificuldades respiratórias. A planta também deve ser usada com cautela por pessoas que tomam medicamentos que potencializam efeitos colaterais, como antialérgicos, antidepressivos e antipsicóticos.

Outra planta da família das solanáceas é a mandrágora (Mandragora officinarum), cuja raiz, de formato semelhante a um corpo humano, inspirou séculos de mitos — dos textos gregos antigos à Bíblia. O folclore advertia que arrancar uma mandrágora do solo liberava um grito mortal, uma lenda tão marcante que até apareceu na série Harry Potter.

Na bruxaria, acreditava-se que a mandrágora era um ingrediente essencial em unguentos para voar, além de amuleto de fertilidade e proteção, e até componente de poções do amor, possivelmente por seus efeitos alucinógenos. Historicamente, também foi usada como anestésico, sedativo e auxiliar da fertilidade.

Assim como a beladona, a mandrágora contém alcaloides tropânicos como a atropina e a escopolamina, que possuem propriedades psicoativas. Um estudo de 2022 catalogou 88 usos medicinais tradicionais para a mandrágora, que vão desde alívio da dor e sedação até o tratamento de problemas digestivos e de pele.

No entanto, nem todas essas aplicações são confirmadas pela ciência. A escopolamina, por exemplo, tem efeito antiespasmódico, podendo aliviar cólicas intestinais e ajudar em distúrbios digestivos. Ela também causa sonolência ao bloquear receptores cerebrais do tipo M1. Mas os extratos das folhas de mandrágora mostram resultados mistos, com algumas evidências de que podem causar dermatite, em vez de tratá-la.

A artemísia (Artemisia spp.) é outra erva frequentemente associada à magia e à cura. Tradicionalmente, era usada para intensificar os sonhos e afastar maus espíritos. Em 2015, um Prêmio Nobel foi concedido pela descoberta da artemisinina, um composto antimalárico derivado da Artemisia annua, também chamada de artemísia anual.

Na medicina tradicional chinesa, a artemísia é usada na moxabustão, terapia que consiste em queimar a erva próxima a pontos de acupuntura para estimular a cura. Fitoterapeutas também a utilizam para tratar irregularidades menstruais e problemas digestivos. A artemísia-comum é listada na Farmacopeia Europeia como ingrediente homeopático para aliviar sintomas de menopausa, transtornos menstruais e condições nervosas como sonambulismo, epilepsia e ansiedade.

As partes aéreas da planta são usadas para produzir óleo essencial, que contém cânfora, pineno e cineol. Essas substâncias são compostas com propriedades antioxidantes, antibacterianas e antifúngicas. A artemisinina pode estimular levemente o útero, ajudando a regular o ciclo menstrual. Estudos em animais sugerem que o extrato das folhas de artemísia pode reduzir inflamações cutâneas, inibindo substâncias químicas liberadas por células imunológicas.

As evidências clínicas ainda são limitadas, e é preciso mais pesquisa para confirmar sua segurança e eficácia. A artemísia também pode causar reações alérgicas, como irritação na pele e dificuldade para respirar, e deve ser evitada durante a gravidez, pois pode provocar contrações uterinas.

Os mitos em torno dessas plantas podem soar como fantasia, mas a verdade é igualmente fascinante. Não é bruxaria, é química — compostos complexos que influenciaram tanto a medicina antiga quanto a moderna.

À medida que a ciência continua a explorar seu potencial, essas ervas nos lembram que muitas lendas têm raízes na farmacologia real. Então, ao mexer nossos caldeirões neste Halloween, vale lembrar: a verdadeira magia da beladona, da mandrágora e da artemísia não está na superstição, mas na ciência.

* Dipa Kamdar é professora sênior em Prática Farmacêutica na Universidade de Kingston, no Reino Unido.

[Fonte Original]

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