Com apenas 27% do território mapeado na escala cartográfica 1:100.000 – mínimo adequado para iniciar a prospecção mineral – o governo quer avançar no detalhamento geológico do subsolo. Para isso, o Ministério das Minas e Energia (MME) e o Serviço Geológico do Brasil (SGB) lançaram em setembro, após consulta pública, o Plano Decenal de Pesquisa de Recursos Minerais (PlanGeo 2026-2035), que prevê a execução de 145 projetos.
O foco está nos minerais críticos e estratégicos, como terras raras, lítio, cobre, níquel, manganês, grafita, estanho, fosfato e potássio. Esse conjunto de projetos considera que o trabalho será realizado com pessoal e recursos financeiros equivalentes à média dos últimos cinco anos.
Um segundo cenário, também apresentado no plano, eleva para 259 o número de projetos. Mas essa opção exigiria um aumento de pelo menos 50% na equipe e de 100% nos investimentos anuais.
O Serviço Geológico do Brasil informa que o investimento em 2025 para levantamentos geológicos sistemáticos, aerogeofísica, prospecção geoquímica e pesquisa mineral aplicada é de cerca de R$ 48 milhões. Empresa pública vinculada ao MME, o SGB faz parcerias com Estados e iniciativa privada para troca de conhecimento e de dados. Algumas dessas parcerias se inserem no contexto do Marco Legal de Ciência e Tecnologia, para captação de recursos da iniciativa privada, reduzindo a dependência do Tesouro Nacional.
Estudo divulgado ano passado pelo Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) com a consultoria EY mostra que, enquanto 50% dos investimentos globais para exploração de minerais não ferrosos estão em países com alto mapeamento geológico, o Brasil responde por 3% desse valor. Aqui, segundo o estudo, faltam políticas nacionais de atração de investimentos e de mecanismos compensatórios de risco. Mesmo assim, houve aumento de 85% no aporte para a prospecção mineral no Brasil entre 2020 e 2023, como foco em ouro, cobre, níquel e lítio.
Projetos ajudam setor, mas não são suficientes para salto disruptivo, diz o consultor da EY Afonso Sartorio
Apesar do baixo conhecimento sobre o potencial de exploração, o relatório aponta que há minerais críticos mapeados permitindo que o Brasil se destaque no cenário global. Onze dos principais minerais produzidos no país (ferro, ouro, cobre, níquel, alumínio, estanho, manganês, nióbio, zinco, cromo e vanádio) somam aproximadamente 90% do valor da produção total, além de lítio, níquel, grafite e minerais terras raras.
Afonso Sartorio, líder de energia e recursos naturais da EY, diz que os 145 projetos previstos no PlanGeo contribuirão para o crescimento do setor, mas não para promover um salto disruptivo. A falta de investimentos contínuos em pesquisa, diz, é um dos principais gargalos para expandir o conhecimento geocientífico do Brasil.
A Amazônia, lembra o consultor, representa o território com menor conhecimento geológico: menos de 40% possui cobertura cartográfica na escala 1:250.000. “A área com maior cobertura de mapeamento geológico detalhado no Brasil é a região Sudeste, especialmente no Estado de Minas Gerais”, observa, lembrando que as regiões Norte e Centro-Oeste têm alto potencial mineral.
João Raso, advogado de mineração do escritório BMA, salienta que o mapeamento em alta resolução tem assimetrias regionais significativas. “Fechar essas lacunas reduz incertezas, fomenta novos investimentos, melhora a alocação de capital e encurta o ciclo entre prospecção e produção”, observa Raso.
Ele defende, para atrair investimentos, oferta de dados confiáveis e segurança jurídica. Depois, licenciamento com previsibilidade de prazos máximos, “sem abrir mão de salvaguardas socioambientais”.
Mateus Figueiredo, sócio da KPMG, lembra que pesquisas geológicas requerem décadas de recursos aplicados consistentemente. “Muitas vezes, os investimentos, privados ou públicos, são interrompidos por mudanças nos ciclos de preços de commodities e tendências econômicas globais.”
Aline Nunes, gerente de assuntos minerários do Ibram, nota que o PlanGeo atual foi adaptado, em relação ao anterior, para acompanhar as mudanças geopolíticas, novas descobertas e avanços tecnológicos e alterações nos mercados nacional e internacional. “O plano mais recente prioriza áreas que visam atender demandas ligadas à mobilidade elétrica, renováveis, TI, agricultura e química”, afirma.