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quinta-feira, novembro 13, 2025

Crítica | The Walking Dead – Vol. 2: Caminhos Trilhados – Plano Crítico

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O segundo volume de The Walking Dead, intitulado Caminhos Trilhados, é onde a série de Robert Kirkman começa a expandir de fato o alcance da sua narrativa. Se o primeiro arco, Dias Passados, é uma excelente introdução da figura de Rick Grimes despertando em um mundo já arruinado, aqui a história se firma com o protagonista assumindo o papel de líder com todas as ambiguidades morais que começou a aprender no final do arco anterior. É uma progressão natural para a narrativa apresentada pelo autor, com tramas sobre como sobreviver em comunidade e o quanto isso cobra de cada indivíduo.

Boa parte da narrativa visual enfatiza a construção impiedosa da sobrevivência nesse universo, com viagens constantes, marcadas pela neve, pelo frio, pela insegurança e pela constante escassez. É nesse cenário de hostilidade que Robert Kirkman coloca seus personagens em situações-limite, onde decisões pequenas, como confiar ou não em um estranho, dividir ou não suprimentos, arriscar-se ou se proteger, têm peso de vida ou morte. O roteiro nunca suaviza, com a promessa de um refúgio seguro surgindo e se desfazendo em um ciclo de esperanças e decepções, como no ótimo núcleo do famoso all dead, do not enter.

Paralelo a esse avanço narrativo, acontece uma transformação estética decisiva: a saída de Tony Moore e a entrada de Charlie Adlard como desenhista regular. A mudança é perceptível de imediato. Moore trazia um traço mais limpo, com forte apelo cartunesco, quase carismático, que dava às cenas de horror uma ironia latente. Já Adlard imprime um estilo mais cru, sombrio e áspero. Seus personagens têm feições duras, seus zumbis são mais repulsivos e as composições ganham uma rusticidade que dialoga com o espírito da série. Essa transição não é apenas formal: ela ajuda a consolidar The Walking Dead como um drama de longo fôlego, mais interessado em transmitir peso, desgaste e melancolia. Gosto bastante do trabalho de Moore, que segue aqui nas capas, mas a arte mais “suja” de Adlard torna-se parte da identidade da HQ, refletindo a própria degradação desse universo.

É também nesse arco que Lori revela estar grávida, adicionando mais uma camada de complicação para as dinâmicas familiares nesse cenário. Ao longo da jornada, o grupo se depara com novos aliados e com a sombra persistente da violência. Cada encontro é um microcosmo das tensões sociais: o medo de traições, os códigos de lealdade, os limites da moral quando tudo colapsa, com muitos diálogos de qualidade, em especial as conversas de Rick com Tyrese, uma ótima adição ao grupo. Kirkman sabe que o verdadeiro motor do drama não são os zumbis, muitas vezes deixados em segundo plano como adversários esparsos (sem nunca renegar o terror e o perigo das criaturas, vale ressaltar), mas a forma como os vivos negociam sua humanidade. O horror, aqui, nasce tanto das mandíbulas dos mortos quanto das escolhas desesperadas dos sobreviventes.

É nessa busca de refúgio que um dos momentos centrais da HQ aparece: a chegada à fazenda de Hershel Greene. Ali, Kirkman introduz mais questionamentos, dilemas morais e problemáticas que garantem uma nítida profundidade à história. Hershel é um homem de fé, que insiste em manter zumbis trancados no celeiro, acreditando que ainda são pessoas que um dia podem ser curadas. A fazenda traz, por um breve instante, o vislumbre de uma vida mais próxima da normalidade: refeições à mesa, espaço para descanso, a ilusão de uma rotina. Mas é justamente essa ilusão que implode quando o celeiro é aberto, levando a mais conflitos e desesperança. 

Quando o grupo encontra a prisão abandonada, há um contraste quase irônico. O espaço, que deveria simbolizar punição e reclusão, surge como promessa de segurança e de lar no sorriso cansado de Rick. Essa inversão — viver atrás de grades para estar livre do perigo externo — é uma ótima metáfora pós-apocalíptica. O sonho de comunidade sobrevive, mas sempre às custas de sacrifícios cada vez mais pesados.

Caminhos Trilhados consolida The Walking Dead como mais do que uma HQ de zumbis. É um estudo sobre liderança, responsabilidade, sobrevivência e o custo psicológico de tudo isso. Rick emerge como figura central, mas não como herói idealizado; sua liderança é construída no atrito, no improviso e no peso esmagador das decisões que ninguém gostaria de tomar. Entre travessias difíceis, novas realidades sombrias e muitos dilemas morais, Kirkman aprofunda seu trabalho, abrindo um novo capítulo para a saga, tanto narrativo, quanto estético, com a chegada de Adlard. 

The Walking Dead – Vol. 2: Caminhos Trilhados (The Walking Dead – Vol. 2: Miles Behind Us)
Contendo:
The Walking Dead # 7 a 12
Roteiro:
 
Robert Kirkman
Arte: 
Charlie Adlard
Capas: Tony Moore
Letras:
Robert Kirkman
Editora nos EUA:
Image Comics
Data original de publicação: 
novembro de 2004
Editora no Brasil:
HQM
Data original de publicação no Brasil:
novembro de 2006 (encadernado)
Páginas: 
148



[Fonte Original]

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