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segunda-feira, novembro 24, 2025

Sem acordo sobre fósseis, COP se limita a adaptação

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Após impasses e uma longa plenária de encerramento, a COP30 terminou no sábado com a aprovação de 29 textos negociados ao longo das duas semanas de conferência em Belém – mas sem incluir o roadmap para a transição global dos combustíveis fósseis e para deter o desmatamento.

A presidência brasileira prometia que a COP30 seria a COP da adaptação e do multilateralismo climático. Logo nos primeiros dias do encontro, surgiu a ambição de um acordo histórico em relação ao afastamento dos combustíveis fósseis e da redução do desmatamento, dois temas que não estavam na agenda oficial. A falta de consenso sobre os temas frustrou a expectativa de mais de 80 países que apoiavam ambas as ideias, e a conferência terminou mesmo como a COP da adaptação.

O “mapa do caminho” para a transição fora dos combustíveis fósseis, apoiado por mais de 80 países, acabou excluído do texto final da COP30 depois de forte resistência de grandes produtores de petróleo, especialmente a Arábia Saudita. O mesmo ocorreu com a proposta de um plano de implementação para deter e reverter o desmatamento até 2030, que teve apoio de mais de 90 países.

As delegações ficaram reunidas aproximadamente das 11h de sexta-feira até às 8h do sábado tentar resolver os impasses. No entanto, diante do bloqueio, o presidente da COP30, André Corrêa do Lago, anunciou que conduzirá, por iniciativa própria da presidência brasileira da COP, consultas ao longo do próximo ano para elaborar dois roadmaps: um sobre desmatamento e outro sobre a transição justa, ordenada e equitativa para longe dos combustíveis fósseis.

Estão decepcionando a ciência, os compromissos do Acordo de Paris”

— Manuel Pulgar-Vidal

“Vamos reunir a maior inteligência possível sobre energia fóssil e organizar essas informações por meio de reuniões e estudos. Isso permitirá que, no curto período de 11 meses e meio da presidência brasileira, possamos produzir um documento substantivo, equilibrado e útil – que apresente os dados e mostre que é preciso enxergar a economia de outra maneira”, declarou em entrevista coletiva após a plenária de encerramento.

A ministra do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas, Marina Silva, afirmou que o mapa do caminho funcionará como uma espécie de Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) setorial para os países. “Nações ricas afirmam já ter seus próprios roadmaps e trajetórias planejadas para eliminar os fósseis. Mas países pobres e dependentes do petróleo não têm nada parecido – e é por isso que esse processo é tão importante”, disse, ressaltando que cada país deverá criar suas próprias metas para se afastar dos combustíveis fósseis.

Apesar da iniciativa brasileira, a ausência de um acordo formal foi criticada. Manuel Pulgar-Vidal, líder global de Clima e Energia do WWF e presidente da COP20, afirmou que a chamada “COP da Verdade” falhou em apresentar um roteiro e soluções reais para desafios urgentes.

“A falta de um plano crível para enfrentar a crise climática e a incapacidade de reconhecer suas principais causas, como os combustíveis fósseis, dizem muito. Falta vontade política. Estão decepcionando a ciência, os compromissos do Acordo de Paris e as pessoas que deveriam servir”, completou.

O avanço no fim da dependência aos combustíveis fósseis vem sendo uma discussão recorrente nas últimas COPs, mas que foi esquecida no ano passado, em Baku, na COP29. Antes disso, em Dubai, na COP28, foi a primeira vez que um texto mencionou a “transição para longe dos combustíveis fósseis”. Com isso, as expectativas para que o debate fosse retomado em Belém eram alto.

Viviana Santiago: “Países ricos se recusaram a fornecer recursos cruciais” — Foto: Osvaldo Forte/Valor

Mas com a ausência dos roadmaps nos textos finais da COP30, a atenção agora se volta para a Primeira Conferência Internacional sobre a Transição Justa para Longe dos Combustíveis Fósseis, anunciada pela Colômbia, durante a conferência em Belém, que recebeu o respaldo de Corrêa do Lago na plenária de encerramento. O evento está previsto para abril de 2026, na cidade de Santa Marta.

Além do tema dos combustíveis fósseis, outro resultado considerado aquém do necessário por especialistas foi o avanço no financiamento para que países pobres e em desenvolvimento possam se adaptar aos impactos da crise climática.

Em Belém, esses países defendiam que as nações ricas triplicassem, até 2030, os recursos anuais de US$ 40 bilhões acordados na COP26, em Glasgow – elevando-os para US$ 120 bilhões. Após impasses, especialmente envolvendo a União Europeia (UE), os negociadores chegaram a um consenso, mas com uma concessão significativa: o prazo para alcançar a triplicação foi adiado de 2030 para 2035.

“Pessoas do Sul Global chegaram a Belém com esperança de progresso real em adaptação e financiamento, mas países ricos se recusaram a fornecer recursos cruciais”, afirmou Viviana Santiago, diretora-executiva da Oxfam Brasil. “Esse fracasso deixa comunidades na linha de frente da crise climática expostas aos piores impactos e com poucas opções para sobreviver.”

Por outro lado, a agenda de adaptação ganhou destaque com adoção de 59 indicadores da Meta Global (GGA) – definição aguardada desde o Acordo de Paris – que orientarão como medir o avanço do planeta nessa agenda. A implementação começa em 2026, com um processo de dois anos, até a COP32, em Adis Abeba, capital da Etiópia, para que as políticas para os indicadores sejam elaboradas através do “Visão de Belém-Adis sobre adaptação”.

“Era uma necessidade que felizmente se confirmou. Ainda não estão prontos para implementação imediata, mas agora temos um processo claro, com a Visão de Belém até Adis Abeba, que abre dois anos para aprimorar tecnicamente os indicadores, alinhar políticas e fortalecer sua operacionalização”, disse Daniel Porcel, do Instituto Talanoa.

Já para Natalie Unterstell, presidente do Talanoa, o pacote é histórico. “Como ‘COP da Adaptação’, Belém finalmente entregou um conjunto de decisões sem precedentes. A adoção dos indicadores da GGA é progresso real. Pela primeira vez, mediremos ação climática não apenas em toneladas de carbono evitadas, mas em vidas protegidas e infraestrutura capaz de resistir ao que está por vir.”

A questão do GGA, porém, foi motivo de polêmica durante a plenária de encerramento. Corrêa do Lago precisou suspender a sessão temporariamente para retomar as consultas, após países como Colômbia, Suíça, Panamá, Uruguai, Argentina, Paraguai, Serra Leoa e Suíça criticaram a forma como o desenho foi feito, alegando que os indicadores foram modificados sem validação técnica adequada e que o texto final foi apresentado sem tempo suficiente para discussão.

O preâmbulo do texto da COP30 ainda traz citações históricas para uma COP, como o reconhecimento inédito da importância das comunidades afrodescendentes, dos territórios indígenas e de questões de gênero no enfrentamento da crise climática.

“Nossa maior força está no poder das pessoas. Nenhum outro acordo da COP enfatizou os direitos humanos com tanta força quanto este”, disse Santiago, da Oxfam Brasil. “Indígenas, comunidades quilombolas, defensoras dos direitos das mulheres e a sociedade civil no Brasil e no mundo seguem exigindo justiça climática – e continuaremos pressionando governos, a indústria fóssil e os super-ricos até que ela se torne realidade.”

[Fonte Original]

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