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quinta-feira, dezembro 18, 2025

Argentina ajusta sistema cambial em busca de dólares

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O governo de Javier Milei deu um passo que havia prometido não dar e mexeu no sistema de bandas cambiais. Após uma vitória clara nas eleições de meio de mandato, em outubro, conquistando uma posição de peso no Legislativo, Milei insistiu a princípio em que não havia nada errado com o esquema de correção do teto e do piso da variação da moeda diante do dólar em 1% ao mês. Mas a escassez de dólares quase o fez ser derrotado nas eleições, com valorizações fortes do peso, além de escândalos nas hostes governistas e erros políticos eleitorais que fizeram os prognósticos de desastre iminente se abater sobre o governo. A rejeição dos eleitores aos peronistas, principal partido de oposição, foi mais forte, e o Liberdade Avança oficialista ganhou musculatura no Congresso.

O Banco Central anunciou anteontem que a partir de janeiro a banda cambial variará de acordo com a inflação de dois meses antes, o que pelo ritmo da evolução atual dos preços, um pouco acima de 2%, significa que a desvalorização da moeda será acelerada. O principal temor do governo com deslizamento maior no câmbio era pôr a perder o grande declínio inflacionário, que deu cacife político decisivo ao novo governo. Em dezembro de 2023, quando Milei assumiu, o índice de preços ao consumidor foi de 25,5% no mês e 211% em 12 meses. A maxidesvalorização inicial, seguida de um congelamento virtual, derrubou a inflação a 2,5% em novembro, enquanto que a de 12 meses foi de 31,4%.

Peso valorizado derruba os preços, mas tem várias contraindicações em geral, e outras particulares no caso argentino. A Argentina não tem reservas internacionais, e as que possui são fruto do maior acordo de ajuda já feito pelo Fundo Monetário Internacional com um país, de US$ 45 bilhões. Retirando obrigações, elas ainda são negativas. Por isso, uma das metas fixadas na extensão do acordo com o Fundo, que emprestou mais US$ 20 bilhões à Argentina, foi a de recomposição das reservas, que o regime de câmbio semifixo impediu Milei de cumprir até agora e o obrigou a pedir waiver na última revisão periódica do entendimento.

Sem reservas e com o peso valorizado, as importações explodiram, o saldo comercial, única fonte garantida de dólares, minguou, e a pressão pela desvalorização seguiu outro caminho que não a via do aumento de preços — o da penúria de divisas fortes.

O governo fez a escolha realista por um caminho intermediário, diante da demanda de cumprimento da promessa eleitoral de 2023, de liberação total do câmbio, ainda reivindicada por empresas e analistas privados. Haverá alguma pressão sobre os preços domésticos no curto prazo em um momento em que a inflação ainda não está domada, mas sob controle diante da baixa temperatura da economia. A Argentina cresceu 3,3% no terceiro trimestre do ano, mas a base de comparação é baixa, e não tem havido aceleração das atividades econômicas. O risco de uma nova escalada inflacionária ainda é baixo.

O governo se comprometeu a comprar US$ 10 bilhões para formar reservas no ano. O plano é injetar pesos correspondentes na economia sem esterilizá-los, isto é, sem enxugar essa oferta com a emissão de títulos públicos. Como um dos motivos principais de contenção da inflação foi a interrupção da emissão monetária pelo Banco Central, que não teve mais de cobrir os enormes déficits públicos, a esperança da equipe de Milei é a de que o câmbio se valorize.

Um dos desafios dos governos argentinos é tornar o peso confiável. A moeda argentina é o dólar, para onde correm todas as economias ao menor sinal de elevação dos preços ou de instabilidade política. Para isso, o BC teve de elevar acima de 100% a taxa de juros nominal no início do governo, e hoje ela está em 29%, em linha com a inflação no ano, de 27,9%. Manter a inflação baixa é a melhor forma de fortalecer a moeda, mas isso leva tempo em um país que conviveu por muito tempo com uma inflação crônica.

Para deter as fontes de emissão, o governo Milei obteve o primeiro superávit primário anual em mais de uma década, interrompeu por completo os investimentos públicos, corrigiu as aposentadorias abaixo da inflação, aumentou as tarifas públicas, eliminou subsídios e jogou pesado para que os acordos salariais não fossem corrigidos plenamente pela inflação passada. O resultado, porém, foi um crescimento débil, sem que haja um motor claro a impulsionar a expansão. Milei acredita que desregulamentação radical, mais reformas, como a de impostos e trabalhista, fará por si só com que o crescimento venha por meio dos investimentos privados. Mas isso ainda não aconteceu.

O governo conta com a reação da balança comercial e os investimentos em petróleo e energia para alavancar as atividades. A correção cambial prometida ajudou a reduzir o risco-país a um dos menores níveis desde 2018 (550 pontos, ante 193 do Brasil), assim como a vitória eleitoral governista. Sem crescimento, porém, o investimento externo não virá, e este é um enorme ponto de interrogação sobre o sucesso das reformas liberais de Milei.

[Fonte Original]

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