Tradicionalmente, o aspecto sustentável de grandes obras logísticas surgia apenas no momento de solicitar o licenciamento ambiental. O cenário mudou: o Plano Nacional de Logística 2050 (PNL 2050) consolida uma nova visão, que considera as preocupações com a sociedade e os ecossistemas como premissas estruturantes, inseridas logo nas fases iniciais de planejamento e estudos de viabilidade de qualquer obra.
A abordagem visa evitar impactos cumulativos, enquanto promove soluções compatíveis com a diversidade ambiental, social e territorial do país. Assim, integra clima e justiça territorial como parte integrante das estratégias do setor e redefine prioridades para a infraestrutura de transportes.
Construído de forma interministerial, sob a coordenação do Ministério dos Transportes (MT), o PNL 2050 tem como objetivo equilibrar a matriz de transportes, valorizando modais de maior capacidade e eficiência, como ferrovias, hidrovias, cabotagem e portos. A diretriz é estruturar corredores integrados, capazes de conectar áreas produtoras, centros de consumo e mercados internacionais, com ganhos de eficiência e redução de custos.
Além disso, o plano busca superar a lógica exclusiva de escoamento de commodities, promovendo uma logística mais equilibrada regionalmente, capaz de contribuir para o desenvolvimento local e o bem-estar da população.
Parte desse trabalho incluiu a apresentação de uma Avaliação Estratégica do PNL 2050, documento que consolida o diagnóstico do sistema de transportes brasileiro. “A cada cinco anos, atualizamos e aprimoramos os planos de transporte rodoviário e ferroviário. Com isso, conseguimos integrar os diversos modais de maneira mais lógica, com uma matriz que realmente retrata a realidade do país”, afirma George Santoro, secretário-executivo do MT.
O plano, construído a partir de matrizes origem-destino de cargas e passageiros, modelos de simulação da rede nacional de transportes e análises de fluxos logísticos, também incorporou a escuta da sociedade, com dez encontros técnicos realizados nas cinco regiões do país, entrevistas com representantes do setor produtivo e cinco consultas públicas.
O documento agora entra em consulta pública para receber contribuições até 18 de janeiro, por meio da Plataforma +Brasil. Depois dessa etapa, em março, o governo vai divulgar o cenário-meta do PNL 2050, com um conjunto de projetos que serão escolhidos com o objetivo de resolver os 12 problemas abrangentes da matriz de transporte.
Dos 12 principais desafios que se apresentam para o setor de logística nacional e que foram mapeados pela avaliação estratégica, três estão diretamente ligados a questões sociais e ambientais: o transporte como grande emissor de gases poluentes, o custo logístico para a sociobiodiversidade e a vulnerabilidade às mudanças do clima.
A fim de atender a essas dificuldades estruturais, o PN L 2 050 pretende avançar com a ampliação e a modernização do uso de indicadores socioambientais e climáticos no processo de planejamento. A abordagem supera a análise restrita às emissões de gases de efeito estufa e passa a considerar riscos climáticos, resiliência da infraestrutura, impactos sociais e justiça territorial.
Esses elementos passam a orientar a priorização de projetos e a avaliação de alternativas logísticas, fortalecendo a transparência e a tomada de decisões baseada em evidências. Assim, posicionam a logística como instrumento da agenda de mitigação das emissões e da transição energética, incentivando modais mais eficientes e de menor intensidade de carbono, como ferrovias e hidrovias.
A dimensão social do planejamento foi fortalecida com a institucionalização do diálogo com comunidades impactadas, por meio da Assessoria de Participação Social e Diversidade (Aspad). Consultas públicas, escutas qualificadas e debates regionais acompanham todo o ciclo do plano.
Esses esforços são concretizados em um momento de expansão dos investimentos, como aponta o Barômetro da Infraestrutura Brasileira, estudo realizado pela EY em parceria com a Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib): o trabalho identificou, em 2024, um aumento de 15,30% em termos reais em logística e transporte, telecomunicações, energia e saneamento básico.
O total de R$ 259,3 bilhões é o maior registrado desde o pico identificado em 2014. Ao todo, há mais de 500 novos projetos em estruturação em diferentes regiões do país, envolvendo cerca de R$ 800 bilhões em investimentos.
Em paralelo, o MT tem implementado medidas para integrar sustentabilidade, inovação e resiliência climática em sua infraestrutura. Entre as principais iniciativas está a Portaria nº 622/2024 , que estabelece que ao menos 1% da receita bruta dos novos contratos de concessões rodoviárias federais seja destinada a ações de sustentabilidade, de forma a incentivar a eficiência energética, o uso de fontes renováveis, a preservação da fauna e da flora e alternativas sustentáveis para coleta e descarte de resíduos.
Envolve também a Portaria nº 689/2024, que atualiza os critérios para enquadramento de projetos rodoviários e ferroviários prioritários para emissão de debêntures incentivadas — a ação inclui o apoio a projetos alinhados à agenda verde, capazes de atrair financiamento privado. Passa ainda pelo Plano Clima Setorial, que reúne ações de mitigação e adaptação às mudanças ambientais, focadas na redução de emissões de carbono, na promoção de modais mais sustentáveis, na modernização da infraestrutura e na gestão de riscos climáticos.
Envolve ainda a integração à Taxonomia Sustentável Brasileira (TSB) e se apoia na cooperação internacional para infraestrutura resiliente, com base em parcerias com instituições multilaterais, como Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Banco Mundial e Coalizão para Infraestrutura Resiliente a Desastres (CDRI). Essas colaborações visam consolidar o Brasil como referência global em transportes de baixa emissão e infraestrutura preparada para eventos climáticos extremos.
Os 12 problemas abrangentes do transporte no país, identificados pelo governo federal:
- Transporte como grande emissor de gases poluentes
- Obstáculos para expansão da cabotagem
- Custo logístico para a sociobiodiversidade
- Dependência do modo rodoviário
- Obstáculos para expansão das hidrovias
- Subutilização do modo ferroviário
- Baixa qualidade das estradas vicinais
- Depreciação do estoque de capital
- Obstáculos à multimodalidade
- Falta de segurança pública
- Falta de mão de obra
- Vulnerabilidade às mudanças do clima
O Plano Nacional de Logística 2050 é o principal instrumento de planejamento de longo prazo do setor de transportes no Brasil. Coordenado pelo Ministério dos Transportes, o plano orienta investimentos públicos e privados, define prioridades para a infraestrutura logística e busca integrar eficiência econômica, sustentabilidade ambiental e desenvolvimento regional.