Resumo da notícia
Rocelo Lopes afirma que a cripto já resolve a exclusão financeira ignorada pelos bancos.
Truter domina 70% dos estabelecimentos que aceitam Pix na Argentina, segundo o executivo.
Regulação atual pode “matar startups”, alertou Rocelo ao comentar as novas exigências para VASPs.
O empresário Rocelo Lopes participou do Blockchain Conference Brasil e discutiu os rumos do mercado cripto. Durante uma entrevista ao Cointelegraph Brasil com o youtuber Felipe Escudero, ele comentou sobre inclusão financeira, inovação e desafios do setor.
Lopes fez um alerta sobre o impacto da nova regulação cripto no Brasil e afirmou que o modelo atual pode sufocar a inovação no país. Segundo ele, as exigências milionárias para licenças privilegiam apenas grandes empresas e ameaçam a existência de novos empreendedores.
“Como empresário, temos caixa para pagar licença. Se fosse 180 milhões, eu pagaria. Mas e o Rocelo de 10 anos atrás?”
Ele lembrou que o ecossistema cripto nasceu de pequenos grupos, de estudantes com ideias ousadas e de equipes reduzidas, e destacou que o novo ambiente regulatório praticamente elimina essa possibilidade.
Para Rocelo, o governo deveria adotar um sistema progressivo, permitindo que startups operem por alguns anos sob limites de volume e fiscalização gradual, até conseguirem crescer e se estruturar.
“Poderia ser assim: você é uma startup? Opera dois anos sem licença, com teto de volume. Depois sobe de categoria.”
Na visão dele, o movimento regulatório atual favorece uma espécie de oligopólio cripto, semelhante ao sistema bancário tradicional, algo que considera extremamente prejudicial ao futuro do setor.
O executivo também defendeu que somente uma regulação equilibrada, com espaço para inovação e crescimento gradual, permitirá que o país retome sua posição de destaque no cenário cripto internacional.
Truther
Ele também afirmou que criou a Truter porque “a gente pensou como é que a gente bota esse cara no sistema financeiro”, referindo-se a trabalhadores excluídos do sistema bancário tradicional.
Lopes explicou que muitos imigrantes, ambulantes e autônomos não conseguem abrir uma conta. Segundo ele, essa realidade atinge sírios, venezuelanos e brasileiros que mudam de estado. Ele destacou que “o cara quer vender um produto na praia e não consegue receber”, porque não tem conta e precisa pagar para usar a de terceiros.
Rocelo lembrou que no Rio de Janeiro alguns trabalhadores “alugam conta dos outros para poder receber Pix e pagam 10%”. Para ele, isso mostra que a exclusão bancária é profunda e cotidiana. Ele disse que muitos precisam “descer pro asfalto” para trabalhar, mas acabam impedidos por limitações criadas pelo sistema tradicional.
Nesse cenário, ele defende que a Truter cria um caminho seguro. A plataforma permite que alguém receba um Pix e escolha manter o valor em real tokenizado ou convertê-lo em dólar digital. Ele explicou que vários usuários dizem: “eu não sei o que é USDT, eu não sei o que é Bitcoin, mas eu quero ter o real para pagar minhas contas”.
Ele reforçou que muitos preferem ficar em dólar. Segundo ele, o estrangeiro que chega ao Brasil diz: “eu quero receber Pix e virar dólar”. Além disso, ele destacou que “a custódia é sempre do usuário”, porque, em suas palavras, “se a custódia não é sua, o dinheiro não é seu”.
Pagamentos com cripto
Rocelo afirmou que o modelo criado no Brasil já está sendo replicado em outros países. “A gente vai copiar na Argentina, na Rússia, no México”, disse. Mas isso só funciona onde existe sistema de pagamentos instantâneos comparável ao Pix. Ele lembrou que “são só 12 países no mundo que têm isso”.
A conversa avançou para o papel do Bitcoin. Ele disse que o sistema tradicional exclui quem tem nome sujo ou não tem conta. Porém, “o Bitcoin veio justamente para esse cara que tem um problema”. Ele explicou que o white paper de Satoshi Nakamoto já mostrava essa intenção. “Ele inventou um sistema de pagamento ponto a ponto para derrubar essa mística”, comentou.
Ele rebateu a ideia de que QR Codes vieram das fintechs. “Começou com o Bitcoin, o pagamento por QR Code”, afirmou. E acrescentou que o Bitcoin abriu novas possibilidades, mas trouxe problemas de volatilidade e velocidade. Nesse ponto, ele destacou que as stablecoins resolveram parte desses desafios.
Rocelo comparou o sistema tradicional a uma ilha fechada. Ele explicou que existe outra ilha, a da criptoeconomia. “Vamos fazer uma ponte para ligar uma ilha à outra”, disse. Para ele, essa conexão vai moldar o futuro dos pagamentos. Ele acredita que, em dez anos, “vamos ver stablecoin, Bitcoin e moeda fiduciária juntas na maquininha”.
Ao comentar a operação na Argentina, ele revelou um dado expressivo: “Hoje a gente detém 70% do mercado argentino” nas operações com Pix para turistas. Ele contou que brasileiros ficam surpresos ao ver a aceitação de Pix no país e que comerciantes oferecem grandes descontos para pagamentos digitais.
Segundo ele, muitos lojistas argentinos não querem peso. “O argentino não quer peso, ele quer USDT”, contou. Ele relatou que parceiros financeiros chegaram a telefonar dizendo: “ninguém veio trocar USDT por peso”. Para Rocelo, isso mostra a perda de confiança na moeda local.
Ele lembrou um episódio marcante em Bariloche. Um comerciante o abraçou para agradecer, dizendo: “você evitou que eu fechasse minha empresa”. Em Mendoza, três adegas ofereceram um jantar porque a tecnologia ajudou o comércio local diante da crise. Esses momentos, segundo ele, mostram o impacto real das ferramentas de pagamento.
Privacidade
A entrevista avançou então para o tema da privacidade. Rocelo explicou que a Truter escolheu a rede Liquid, do ecossistema Bitcoin, como base para sua stablecoin. Isso porque “a Liquid é a única blockchain que traz privacidade”. Ele frisou que a rede não permite bloqueio de contratos. “Não posso bloquear carteira nenhuma. Não tem como fazer isso”, afirmou.
Ele contou que a empresa integrará Liquid com Lightning Network, tudo operando por baixo dos panos. “O usuário não precisa se preocupar com canal, com nada disso”, disse. Ele também comentou que pretende colaborar com Adam Back para ajustar o protocolo e permitir taxas zero: “nosso incentivo é manter a rede funcionando com privacidade”.
O debate então seguiu para regulação. Ele comentou a MP que aumentaria impostos e derrubaria isenções. Porém, ela caducou. Em seguida, surgiu a nova lei das VASPs, que exige licenças milionárias. Ele lembrou que isso pode ser fatal para novos empreendedores. “O Rosselo de 10 anos atrás não teria 17 milhões para pagar licença”, afirmou.
Ele criticou a falta de diálogo. “Poderia ter sido feita uma categoria para startups”, disse. Segundo ele, empresas pequenas deveriam ter tempo para crescer antes de enfrentar custos altos. Ele afirmou que parte das associações do setor pensa apenas no próprio interesse. “Eles defendem meia dúzia preocupada com o próprio umbigo”, declarou.
Rocelo acredita que o Brasil deveria estar na liderança global do setor. Para ele, o mercado começou há pouco e todos os países têm chance igual. Mas barreiras regulatórias atrapalham. Ele afirmou que é preciso unir empresas grandes e pequenas em torno de uma agenda comum.