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sexta-feira, outubro 18, 2024

Francês exige transparência de produtos que compra

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Economia circular, gestão de resíduos, compras de segunda mão, rastreabilidade, comércio justo. Se estes termos parecem ter entrado na moda recentemente, eles já fazem parte da vida de europeus há décadas. Na França, o movimento de consumo consciente surgiu a partir da década de 1970, mas é a partir dos anos 1990 que ganhou impulso, com a consolidação de organizações como Greenpeace e iniciativas como o selo de comércio justo lançado pela Fundação Max Havelaar.

“Os consumidores começaram a exigir mais transparência sobre a proveniência e o impacto dos produtos que adquiriram”, explica Charles Znaty, porta-voz do Medef, um grupo que reúne empresas francesas, e CEO na Europa da marca brasileira de chocolates Dengo. De acordo com o executivo, o consumo consciente na França tem favorecido a produção local e o apoio às pequenas e médias empresas envolvidas em práticas sustentáveis. “A principal organização sindical patronal francesa, da qual sou porta-voz, fez do compromisso com o crescimento sustentável a sua razão de ser”, afirma.

Entre os fatores que contribuíram para a intensificação do movimento nos últimos anos, Znaty cita crises ambientais e políticas públicas que visam promover a sustentabilidade e reduzir o desperdício. A Prefeitura de Paris, por exemplo, publica uma lista de endereços para um consumo consciente e sustentável, e uma página no site do Ministério da Economia da França anuncia: “Ao consumir com responsabilidade, você pode agir todos os dias para preservar o meio ambiente”.

Znaty destaca ainda certificações e rotulagem adequada dos produtos. “O desenvolvimento de rótulos como ‘orgânico’ ou ‘fair trade’ [comércio justo] facilitou o acesso a produtos que atendem a critérios éticos”, diz ele. Outros fatores não negligenciáveis, segundo o empresário, são as redes sociais e meios de comunicação. “Essas plataformas têm desempenhado papel fundamental na educação dos consumidores e na divulgação de práticas responsáveis.”

Um estudo da PwC revela que quase a metade dos consumidores franceses compra bens de segunda mão, o que demonstra interesse crescente em práticas sustentáveis. Violaine Desgranges, gerente de loja da Bis Boutique Solidaire, com quatro pontos em Paris e uma oficina de 1.100 m2 nos subúrbios da cidade, confirma a tendência. A empresa registrou um volume de negócios de 3 milhões (R$ 18,4 milhões) em 2023. “Nossa clientela é muito diversificada. De quem quer avançar para o consumo ético a consumidores que têm poucos recursos. Há também pessoas em busca de pechinchas”, afirma a gerente.

Para Desgranges, o consumo responsável é uma tendência em alta em toda a França. “As pessoas estão cada vez mais preocupadas com as alterações climáticas e a ecologia. A segunda mão é um bom começo para evitar o consumo de fast fashion, que em última análise é caro e nada ético”, afirma. Segundo ela, há também mais preocupação com o custo de vida. “Nossas lojas permitem que muitas pessoas se cuidem, se vistam bem, enquanto prestam atenção ao seu orçamento.”

Preço continua a ser uma barreira, mas uma proporção significativa está disposta a pagar mais por produtos locais ou sustentáveis, aponta Znaty. É o caso da arquiteta Cécile Marchand. Ela diz que consome pouco, então não se importa de pagar mais caro por um produto sustentável. “De carne a roupas e objetos, eu não consumo muito, então, quando compro, fico mais atenta à procedência e ao circuito que o item fez para chegar até as minhas mãos do que ao preço em si”, sublinha.

Muitos franceses já foram educados assim e continuam com práticas herdadas de seus pais. “Fui criada numa família que já consumia de maneira responsável, sustentável, evitando desperdício, reutilizando objetos. A gente não necessariamente consumia de segunda mão, mas evitava o consumo fútil”, lembra a diretora artística Delphine Glachant. “Ao crescer e adquirir mais consciência política e climática, passei a dar ainda mais atenção ao planeta, às mudanças climáticas e ao consumo responsável.”

A Agência de Transição Ecológica do governo francês publica desde 2004 o Greenflex, barômetro de consumo responsável, para ajudar as empresas a entender melhor a relação dos franceses com o consumo e com a sociedade. Segundo a edição deste ano, quatro em cada cinco franceses pensam que a crise climática os obriga a rever seus modos de vida e de consumo e 77% se dizem engajados ou preocupados com o consumo consciente.

O exemplo francês contagiou a engenheira ambiental Camila Miranda e a assistente social Maria Martins, que moram no país europeu. “No Brasil, morava em um apartamento grande e, ao chegar aqui, constatei a quantidade de coisas que possuía, muitas das quais quase não usava. Ao chegar aqui, morava em um quarto de serviço, e isso me ensinou a evitar compras desnecessárias, otimizando tudo: roupas, utensílios de cozinha, decoração e cosméticos. Adotei produtos multiuso e aprendi a valorizar o essencial”, conta a engenheira.

Entre os hábitos que ela passou a adotar estão escanear produtos para verificar ingredientes e evitar substâncias nocivas, além de optar por alimentos com menos aditivos e roupas de tecido natural. Ela também prioriza produtos locais. “No Brasil, sentia que era muito caro adotar hábitos mais sustentáveis. Aqui, esses hábitos se tornaram mais acessíveis.”

Martins conta que mudou seu comportamento após se informar sobre o impacto de uma alimentação convencional no organismo e no meio ambiente. “Em menos de dois anos, passei a comprar tudo orgânico, a olhar os rótulos, o score nutricional e utilizar app que avalia a qualidade do alimento. Hoje minha alimentação é 90% orgânica. Só não como orgânico quando não estou em casa”, relata.

Ela também dá preferência a produtos locais e a estabelecimentos que combatem o desperdício, usa embalagens reutilizáveis ou que não são de plástico e faz triagem seletiva do lixo. “Uma verdadeira mudança de pensamento que aconteceu graças ao acesso à informação e aos produtos sustentáveis, o que era mais difícil de ter no Brasil”, completa.

Para Znaty, da Dengo, o comportamento cada vez mais exigente do consumidor europeu é uma ocasião para empresas brasileiras. “Vejo isso como oportunidades reais para fortalecer os vínculos entre as práticas agrícolas sustentáveis brasileiras e os consumidores europeus”, afirma. “É essencial comunicar claramente o impacto dos nossos produtos.”

[Fonte Original]

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