Embalados pelo baixo nível de desemprego e pelo aumento da renda dos brasileiros, os shopping centers do país esperam fechar o ano com alta de 3,6% nas vendas em relação a 2023, quando o faturamento dos lojistas somou R$ 194,7 bilhões. O número supera com folga o aumento de 1,5% do ano passado. “A arrumação do cenário econômico deu fôlego maior para as pessoas poderem consumir”, diz o presidente da Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce), Glauco Humai. “Dos nossos quatro indicadores principais – emprego, renda, inflação e juros -, os primeiros três melhoraram consideravelmente”, afirma.
Nas estimativas da Associação Brasileira de Lojistas de Shopping (Alshop), o faturamento deste Natal deve crescer 5% na comparação anual, na esteira da alta de 11,4% na Black Friday apurada pela Abrasce. “O ano superou nossas expectativas”, diz Luis Augusto da Silva, diretor de relações institucionais da Alshop. Até agora, porém, as vendas médias dos shoppings ficaram abaixo da média do varejo. Nos primeiros três trimestres de 2024, segundo a Abrasce, as lojas de shoppings registraram respectivamente alta de 2,7%, queda de 1,3% e avanço de 2,3% na comparação com igual período do ano anterior. Já o índice Cielo do Varejo Ampliado (ICVA) aponta crescimento de 3,1%, 2,5% e 2,9% em cada um dos trimestres.
“Não é um descolamento absurdo, mas as vendas dos shoppings estão aumentando menos do que o varejo como um todo”, diz o consultor Eduardo Terra, sócio da BTR-Varese. “É que o crescimento do varejo se deu muito também pela expansão de redes fora dos shoppings, como atacarejos, grandes pet shops e farmácias”, afirma. Ainda assim, ele avalia 2024 como um “bom ano” para o setor. “Só não está sendo espetacular por conta da taxa de juros, que inibe haver mais gente comprando”, afirma.
Em grandes redes, como C&A, Chilli Beans e Cacau Show, o faturamento superou a média. A receita líquida da C&A cresceu 14,9% nos primeiros nove meses do ano, sobre o mesmo período de 2023, para R$ 5,08 bilhões. Considerando apenas a receita com itens de vestuário, a alta foi de 17,5%. A Cacau Show projeta que as vendas deste ano devem ficar 28% acima dos R$ 5,1 bilhões do ano passado, com aumento em torno de 20% se comparadas apenas as lojas existentes nos dois períodos, segundo Daniel Roque, vice-presidente de negócios da empresa. Por trás dos números, ele menciona, além da expansão da rede, a reforma e ampliação de lojas, com crescimento de serviços como cafeteria.
Nos primeiros 11 meses do ano, as vendas da varejista de óculos Chilli Beans, com quase 90% dos pontos de venda em shoppings, somaram R$ 1,15 bilhão – um crescimento de 14%, conta Thiago Maino, diretor comercial da franqueadora. A Black Friday foi destaque, com variação anual de 30%. Segundo o executivo, o bom desempenho vem da alta média de 17% nas datas comemorativas, em parte provocada por medidas como ajustes no mix de produtos, divulgação por influenciadores e distribuição de brindes.
Maino ressalta que parte das vendas do Natal foram antecipadas neste ano – a data de recebimento da primeira parcela do décimo terceiro salário coincidiu com a Black Friday. Luciana Medeiros, sócia da PwC Brasil, faz avaliação similar. “As compras de Natal estão sendo divididas entre a Black Friday e dezembro, com uma expectativa de vendas um pouco melhores que no ano passado, mas ainda com um foco em preços e promoções”, diz.
Neste segundo semestre, parte do varejo também se beneficiou do fim da isenção do imposto de importação para compras internacionais de até US$ 50, válida desde agosto. “Havia lojas sofrendo muito com o crescimento das plataformas asiáticas”, afirma Terra. A nova regra provocou queda de 40% nas importações de produtos antes isentos do imposto no primeiro mês de vigência da taxação e as manteve em nível cerca de 30% mais baixo do que no auge dessas remessas, mostram dados da Receita Federal.
A gente está num momento extremamente delicado e ainda é difícil de entender o que vai acontecer”
— Luciana Medeiros
Para o ano que vem, não há consenso sobre o rumo das vendas. Do lado positivo, há o desempenho deste segundo semestre. “É um ano que começa melhor do que os anteriores”, diz Medeiros. Jogam contra incertezas quanto ao ajuste fiscal proposto pelo governo e o consequente rumo dos juros e da inflação. “A gente está num momento extremamente delicado e ainda é difícil de entender o que vai acontecer do ponto de vista econômico”, acrescenta a executiva da PwC. Ressalva feita, ela anuncia um “otimismo cauteloso” para 2025. “Estamos vendo um final de 2024 um pouco melhor e um 2025 também um pouquinho melhor.”
O otimismo é menor para o presidente do Instituto Brasileiro de Executivos de Varejo (Ibevar), Claudio Felisone. “Existe uma preocupação grande do mercado em relação aos cortes de despesas públicas e o impacto do déficit na inflação, que força o Banco Central a ser mais contundentes com os juros”, diz. “Com as condições que estamos desenhando, tudo indica uma redução significativa nas vendas de varejo de modo geral.”
“O não ajuste fiscal tem trazido falta de confiança e o aumento da taxa de juros”, completa Terra. Ele pondera, porém, que um ajuste “muito duro” poderia ter impacto negativo para o varejo em 2025. E exemplifica: “Na Argentina, o ajuste fiscal agressivo deve trazer resultados no longo prazo, mas, por enquanto, o consumo está caindo entre 25% e 30%”. Para ele, a ausência de eleições em 2025 também pode frear as vendas sem os gastos públicos maiores típicos de anos eleitorais.
A geopolítica também pesa. “O cenário internacional deve ter mais peso do que nos últimos”, diz Humai. Ele menciona a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos, com possível aumento de barreiras econômicas, e eventuais escaladas dos conflitos no Oriente Médio e na Ucrânia, que podem comprometer cadeias produtivas e investimentos. Entre os pontos positivos, o presidente da Abrasce cita a regulamentação das apostas esportivas on-line, as chamadas bets, que “neste ano ficaram com parte da receita que iria para o varejo”. Tudo considerado, para 2025, ele prevê alta de vendas: “Vamos crescer com certeza”. Mas evita quantificar. “Pode ser mais ou pode ser menos. O Brasil tem uma volatilidade às vezes inexplicável.”
Apesar das incertezas, redes como C&A apostam em expansão. “Ainda não está 100% decidido, porque estamos num ciclo de orçamento, mas devemos abrir algo entre dez e quinze lojas em 2025, um número que consideramos saudável”, diz Fernando Brossi, vice-presidente de operações e serviços da varejista de moda.