A Câmara dos Deputados aprovou nesta quinta-feira (19/12) uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que é parte do ajuste fiscal proposto pelo governo federal. O texto agora segue para o Senado.
A PEC aprovada estabelece medidas para conter o gasto com supersalários, reduz repasses ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), e limita o reajuste do abono salarial, repasse previdenciário concedido anualmente a trabalhadores com renda mensal de até dois salários mínimos.
O texto final, no entanto, limitou as economias esperadas com as mudanças no Fundeb e com o controle dos supersalários.
A PEC foi aprovada em segunda votação com 348 votos favoráveis e 146 votos contrários. Eram necessários 308 votos a favor para a aprovação.
A Câmara vota ainda hoje projeto de lei que trata de mudanças no reajuste do salário mínimo e no Benefício de Prestação Continuada (BPC), benefício pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda.
Na quarta-feira, já havia sido aprovado um projeto de lei que estabelece limites para gastos com pessoal e incentivos tributários, quando houver déficit nas contas públicas. O texto aprovado também possibilita congelar uma parcela das emendas parlamentares não impositivas.
Além do pacote fiscal em votação no Congresso, o governo anunciou, em paralelo, uma reforma na tabela do imposto de renda, mas essa proposta só será encaminhada ao Parlamento em 2025.
O objetivo das mudanças nas despesas públicas, segundo o ministro da Fazenda Fernando Haddad, é cumprir o arcabouço fiscal — regra que limita o crescimento dos gastos.
O governo tem apresentado sucessivos anos de contas no vermelho, ou seja, está gastando mais do que arrecada, o que têm aumenta a dívida pública.
Críticos dizem que isso aumenta a desconfiança dos investidores na solidez fiscal do governo e alimenta a alta do dólar, o que deve impactar a inflação no país. A moeda americana atingiu novo recorde na quarta-feira (18/12), quando fechou a R$ 6,26.
Nesta quinta-feira, a moeda americana perdeu força, fechando a R$ 6,12, após intervenção do Banco Central e diante da aprovação do pacote fiscal.
Confira as principais medidas já aprovadas do pacote fiscal e o que ficou para 2025.
Abono Salarial
O abono salarial é um benefício de até um salário mínimo pago a trabalhadores que atendem certos requisitos.
Um dos critérios em vigor limita o pagamento a abono pessoas que ganham até dois salários mínimos (R$ 2.824).
A proposta do governo, aprovada na Câmara, fixa uma renda de até R$ 2.640 para ter direito ao abono salarial e institui uma cláusula para que o valor seja corrigido anualmente pela inflação até chegar em 1,5 salário mínimo.
A projeção, segundo o governo, é que isso aconteça em 2035.
Fundo da Educação Básica
O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) é um fundo que redistribui recursos para a educação básica pública.
A proposta original enviada pelo Executivo, previa que 20% do que a União transfere aos Estados, Distrito Federal e municípios para o Fundeb deveria ser investido na educação em tempo integral. Atualmente, o recurso pode ser aplicado em outras políticas educacionais.
O relator reduziu o montante obrigatório que deverá ser aplicada na educação em tempo integral para 10% em 2025. Com a mudança, a economia gerada deverá ser menor do que a originalmente estimada.
A partir de 2026, Estados e municípios terão de destinar 4% de aportes próprios ao Fundeb para o ensino integral.
Com isso, o governo federal repassa aos governos locais a responsabilidade pelo programa aos governos locais, economizando recursos.
Limites aos supersalários
O pacote do governo inclui limites para os supersalários no serviço público, que ocorre quando servidores e autoridades conseguem driblar o limite constitucional, hoje em R$ 44 mil.
Isso geralmente é feito como pagamento de benefícios enquadrados como “indenizações”, que ficam de fora do teto remuneratório, algo especialmente comum no Poder Judiciário.
Uma proposta de emenda constitucional (PEC) aprovada na Câmara prevê que somente poderão ser pagos valores acima do limite quando forem indenizações previstas em lei ordinária, aplicadas nacionalmente a todos os Poderes.
Isso visa impedir decisões administrativas, criadas por cada órgão ou instituição, criando benefícios para suas categorias.
O texto aprovado, no entanto, teve uma mudança em relação à versão enviada inicialmente pelo governo.
A proposta inicial falava em lei complementar em vez de lei ordinária. A diferença é que a lei complementar é mais difícil de ser aprovada.
Além disso, permite que eventuais benefícios já previstos em leis ordinárias hoje sejam mantidos.
As mudanças atenderam à pressão de categorias afetadas e foram criticadas por parlamentares que entenderam que elas enfraquecem a possibilidade de limitar os supersalários do funcionalismo público.
“Com a aprovação da proposta de emenda com o texto atual, todas as resoluções do CNJ [Conselho Nacional de Justiça] e do CNMP [Conselho Nacional do Ministério Público] que garantem salários ilegais, inconstitucionais, com impacto de mais de R$ 12 bilhões ao ano no bolso do trabalhador mais pobre, vão ser mantidas”, disse o deputado Kim Kataguiri (União-SP).
Dentro do pacote fiscal, a Câmara aprovou na quarta-feira um projeto de lei para estabelecer travas para o crescimento de despesas com pessoal e para incentivos tributários.
Essas travas serão acionadas se for registrado déficit primário – quando o governo gasta mais do que arrecada, considerando receitas e despesas não financeiras.
O texto aprovado também permite o congelamento de até 15% do valor destinado a emendas parlamentares não impositivas (que não são de liberação obrigatória).
A proposta do governo autorizava congelar até 15% de todas as emendas, mas os deputados, que controlam a destinação desses recursos, reduziram o impacto dessa medida.
Além disso, o texto autoriza o uso de superávit de cinco fundos nacionais para pagar a dívida pública por seis anos (2025 a 2030).
A proposta original previa oito fundos, mas foram excluídos no Congresso o Fundo da Marinha Mercante, o Fundo Nacional Antidrogas e o Fundo Nacional de Aviação Civil.
Para o governo conseguir aprovar esse projeto de lei, houve um acordo para derrubar o Seguro Obrigatório para Proteção de Vítimas de Acidentes de Trânsito (SPVAT), antigo DPVAT, que tinha sido recriado em maio.
Aposentadoria de militares
Segundo a proposta do governo, alguns benefícios serão extintos, como a transferência de pensão e a morte ficta, que permite que parentes de militares desligados continuem a receber pensão, como se o militar estivesse falecido.
Também será fixada, em 3,5% da remuneração, a contribuição do militar para o Fundo de Saúde. Além disso, será estabelecida uma idade mínima de aposentadoria para militares, aos 55 anos.
O impacto das medidas que afetam os militares, segundo o governo, é de cerca de R$ 2 bilhões por ano.
No entanto, Haddad afirmou na quarta-feira (18/12) que o Congresso não deve votar nesta semana o projeto de lei que altera a previdência dos militares.
Assim, expectativa agora é de que a discussão da mudança fique para 2025, já que o recesso legislativo começa em 23 de dezembro.
Imposto de Renda
Em paralelo ao corte de gastos, o governo anunciou mudanças na tabela do Imposto de Renda a partir de 2026. Essas propostas ainda serão enviadas ao Congresso em 2025.
Uma delas é a isenção do imposto de renda para quem ganha até R$ 5 mil por mês. Atualmente, o limite de isenção é de R$ 2.824 (dois salários mínimos).
Além disso, aqueles que ganham de R$ 5 mil até R$ 7,5 mil mensais pagarão uma alíquota menor.
Para compensar a queda na arrecadação com a medida, que deve ter um impacto de R$ 35 bilhões, contribuintes que têm uma renda superior a R$ 50 mil por mês vão passar a pagar um pouco mais. Será estipulada uma alíquota mínima de 10%.
Além disso, a isenção do imposto de renda por razões de saúde será limitada àqueles que ganham até R$ 20 mil por mês.
Não haverá mudanças nas deduções de gastos com saúde no imposto de renda, que continuam sendo permitidas em todas as faixas de renda.
Essas mudanças, segundo Haddad, garantem que a perda estimada na arrecadação de R$ 35 bilhões seja compensada.
O ministro da Fazenda ressaltou que o objetivo da reforma do imposto de renda é manter uma neutralidade fiscal.
“Não visa nem aumentar e nem diminuir arrecadação, mas busca justiça tributária”, declarou.