Em 2025, os vencedores das eleições de 2024 pelo mundo terão a responsabilidade de colocar em prática suas promessas de campanha. Entre os principais líderes, está o novo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que, ao longo de sua trajetória, se posicionou de forma crítica em relação ao status quo, tanto internamente quanto no cenário internacional.
O mundo também começa o ano envolto em conflitos no Oriente Médio, na Ucrânia e no Sudão, deixando no ar a pergunta: será que veremos algum avanço em direção à paz?
A seguir, veja as previsões sobre o que podemos esperar nos próximos 12 meses.
Para começar, vamos olhar para os Estados Unidos.
Um novo mandato de Trump
Muito do que acontecerá em 2025 será determinado pelas ações de Donald Trump, que retorna à Casa Branca para um segundo mandato. Ele prometeu uma grande reformulação no governo, além de enfrentar duas grandes guerras e uma possível guerra comercial, caso cumpra suas ameaças sobre tarifas.
Anthony Zurcher, correspondente sênior da BBC para a América do Norte, destaca que, pelas primeiras nomeações de Trump, seu foco estará nas questões que dominaram sua campanha: restringir a imigração e combater déficits comerciais, utilizando tarifas como ferramenta para fortalecer economicamente os Estados Unidos.
Nomes como Stephen Miller, conhecido por sua postura anti-imigração, foram novamente chamados para a Casa Branca. Além disso, Tom Homan, que liderou a política de separação de famílias na fronteira durante o primeiro mandato de Trump, ocupa agora um cargo estratégico na área de imigração.
Na economia, escolhas como a de Scott Bessent, indicado como secretário do Tesouro, seguem uma linha mais tradicional, enquanto Peter Navarro (conselheiro de Comércio e Indústria), defensor do uso de tarifas, deve desempenhar um papel crucial.
Outras indicações incluem figuras como Tulsi Gabbard, diretora de Inteligência Nacional e crítica de políticas intervencionistas, e Robert F. Kennedy Jr., nomeado secretário de Saúde e conhecido por sua oposição às grandes farmacêuticas.
“A administração Trump parece se cercar de pessoas que foram críticos do governo atual, com a intenção clara de reconstruí-lo desde suas fundações. A forma como essas escolhas impactarão o cenário político e econômico dos Estados Unidos, e até mesmo do mundo, será um dos principais fatores a moldar 2025”, analisou Zurcher no programa.
Zurcher aponta também que lições foram aprendidas no primeiro mandato, quando faltou preparação e Trump precisou contar com republicanos mais tradicionais, gerando conflitos. Desta vez, ele está cercado por aliados leais que compartilham sua visão de populismo conservador.
Há também uma estratégia para evitar obstáculos legais e burocráticos, com planos claros para começar a implementar já nos primeiros dias de governo.
O que esperar da política externa de Trump
Na política externa, Trump prometeu “acabar com as guerras”.
“Os Estados Unidos têm sido o maior apoiador da Ucrânia desde a invasão russa em 2022. Trump, no entanto, tem demonstrado simpatia por Vladimir Putin e uma abordagem mais cética em relação ao apoio contínuo à Ucrânia. Ele prioriza o fim das hostilidades, mesmo que isso signifique concessões desfavoráveis para a Ucrânia”, diz o correspondente.
“No Congresso, os republicanos também estão mais céticos quanto ao apoio à Ucrânia, o que pode mudar drasticamente a posição americana no conflito. Isso forçará a Ucrânia a buscar formas de encerrar a guerra em termos menos ideais.”
Segundo Steve Rosenberg, editor da BBC na Rússia, para o país de Putin, as expectativas são mais baixas desta vez. Em 2016, acreditava-se que Trump transformaria as relações entre EUA e Rússia, mas o primeiro mandato trouxe mais sanções e relações tensas. Agora, com Trump menos limitado politicamente, há esperanças de que ele implemente políticas mais favoráveis a Moscou.
Putin, no entanto, continuará buscando vantagens, como manter territórios ucranianos ocupados e garantir que a Ucrânia não se junte à Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte). Internamente, o Kremlin tentará apresentar qualquer acordo como uma vitória para a Rússia, mesmo com sinais de cansaço da população após três anos de guerra.
E na China, segundo Laura Bicker, correspondente da BBC em Pequim, o país está se preparando para uma possível nova guerra comercial.
Embora isso preocupe o país, os chineses diversificaram sua economia desde a primeira guerra comercial, fortalecendo laços com países como Brasil, Índia e Austrália.
A China também busca consolidar sua influência global, investindo em infraestrutura em países da África, América do Sul e Sudeste Asiático.
Apesar de ser vista como parte de um “eixo de poder” com Rússia, Irã e Coreia do Norte, a China deseja projetar uma imagem de liderança global independente, contrastando com os EUA.
Bicker aponta que, olhando de fora, países como Rússia e China, que querem ver a União Europeia e a Europa mais amplamente — e, de forma geral, o Ocidente – mais divididos, fraturados e enfraquecidos, não estão exatamente desapontados com o que estão vendo.
Eles observam a evolução na Alemanha, na França, e o impacto que isso tem na UE e na liderança dentro da Otan. Eles também olham para o retorno de Donald Trump à Casa Branca em janeiro e as divisões que isso pode causar no Ocidente.
“A turbulência na Europa não afeta diretamente o que Donald Trump pensa. Ele não é um fã da União Europeia — isso ele já deixou bem claro. Ele é fã, segundo suas próprias palavras, de tarifas. Trump diz que tarifas são ‘a palavra mais bonita do dicionário’ no que lhe concerne.”
“Donald Trump, como sabemos, não acredita em situações de “ganha-ganha”, onde ambas as partes na negociação ou no debate, por assim dizer, possam vencer. Ele acredita que há apenas um vencedor, e ele quer que seja ele. Ele quer que sejam os Estados Unidos. Ele vê a Europa de duas maneiras que o irritam profundamente.”
Sobre gastos com defesa, Donald Trump não está sozinho entre os presidentes dos EUA nesse ponto — sente que a Europa, por muito tempo, tem sido dependente dos Estados Unidos, especialmente dentro da aliança militar da Otan.
“Ele acredita que os países europeus não gastam o suficiente com sua própria defesa, confiando demais na força militar dos EUA.”
Na prática, explica, vemos isso na Ucrânia. São 50 países que têm doado ajuda à Ucrânia, militar e de outros tipos. Quando analisamos a ajuda militar, os EUA são, de longe, o maior doador, contribuindo com mais de 50%.
Trump diz: “Pessoal, isso não é justo. Esta é uma guerra que está acontecendo na Europa. Vocês não podem esperar que façamos tudo isso.”
O segundo ponto que o irrita, explica a correspondente, é o comércio.
Trump não gosta de déficits comerciais. Ao observar a UE — e também o Reino Unido —, os EUA são o maior parceiro comercial. Quando se trata da UE, há um déficit comercial: a UE exporta mais para os Estados Unidos do que importa deles. Durante seu primeiro mandato, Trump ficou furioso com isso, fez várias ameaças e impôs tarifas em setores como o do aço.
Desta vez, ele diz que quer impor tarifas abrangentes, de 20% sobre todas as importações, e possivelmente mais altas para setores como veículos elétricos. Isso preocupa muito a Alemanha, cuja economia já é frágil e depende bastante da indústria automobilística. Isso gerou uma espécie de pânico na Europa.
No comércio, a Europa tenta mostrar disposição em comprar mais gás natural liquefeito (GNL) e equipamentos militares dos EUA, à medida que aumenta seus gastos com defesa.
“Além disso, a Europa busca intermediários que possam dialogar com Trump e criar uma ponte entre Europa e Estados Unidos. Mas esses intermediários não virão da França ou da Alemanha neste momento.”
O conflito entre Israel e Hamas, que continua a afetar a região, tem gerado uma série de questões complexas, com os reféns sendo uma das principais preocupações.
Durante a guerra, a principal dúvida era sobre quantos reféns ainda estavam vivos, se poderiam fornecer provas de vida e como as trocas de prisioneiros entre Israel e Hamas aconteceriam. Em meio a essas incertezas, as exigências de Israel, como a presença militar na Faixa de Gaza, permanecem no centro das discussões.
Apesar disso, há uma esperança de que 2025 seja o ano em que finalmente um acordo seja alcançado, trazendo os reféns de volta para casa e encerrando o sofrimento das famílias e a agonia dos palestinos em Gaza.
Apoio a Israel
Em relação à sustentabilidade militar de Israel em 2025, a situação parece ser de continuidade. Israel já demonstrou sua disposição em agir de acordo com seus interesses, realizando ações militares no Líbano, Síria e Iêmen.
Com a política externa de Israel claramente definida e assertiva, é provável que esses ataques se mantenham, caso os interesses israelenses sejam ameaçados.
O governo de Israel, especialmente sob a liderança de Benjamin Netanyahu, tem sido fortalecido, com o apoio dos Estados Unidos, que, sob a presidência de Donald Trump, provavelmente continuará a apoiar as ações israelenses, especialmente em relação à expansão dos assentamentos na Cisjordânia e nas Colinas de Golã.
Com a volta de Trump à Casa Branca em 2025, a política de apoio incondicional a Israel deve continuar, especialmente com a nomeação de uma equipe que compartilha da visão de extrema-direita de Netanyahu.
A construção de assentamentos na Cisjordânia deve ser incentivada, com discursos sobre a colonização de Gaza surgindo no horizonte. Para Israel, 2025 pode ser um ano decisivo para o cumprimento de seus objetivos políticos e territoriais.
“Israel deixou absolutamente claro que agirá em seu próprio interesse, seja isso significando a invasão terrestre de 2024, os ataques no coração de Beirute. Isso significa atacar os houthis do Iêmen, de onde quer que eles estejam atacando alvos israelenses. Significa entrar na Síria, mesmo enquanto a Síria celebra o fim de meio século ou mais do regime repressivo da família Assad, um momento muito sensível também”, diz Lyse Doucet, correspondente-chefe internacional da BBC.
Lyse Doucet lembra que Israel realizou centenas de ataques a mísseis e invadiu o território sírio, ocupando a zona de segurança desmilitarizada, apesar dos apelos das Nações Unidas e de outros países para recuar.
“Então, 2024 foi um ano em que todas as linhas vermelhas foram cruzadas e Israel estabeleceu sua própria linha vermelha, que não permitirá nenhuma ameaça à sua soberania. E então acho que isso continuará, e ficou claro que continuará atacando no Líbano se sentir que seus interesses estão ameaçados novamente. Este é um Israel muito fortalecido e muito assertivo, colocando Israel em primeiro lugar.”
A queda de Assad e o futuro no Oriente Médio
Apesar dos desafios, o povo sírio parece seguir em frente com um otimismo cauteloso. Embora ainda não esteja claro quem é o governante de fato, com Ahmed al-Shara assumindo a liderança sob o nome de guerra de Abu Mohammed al-Jilani, ele ainda não expandiu seu governo para incluir outros grupos fora do Hayat Tahrir al-Sham (HTS), com o qual ele tem forte vínculo.
Isso cria incertezas sobre o futuro da administração síria, especialmente porque Shara e seu grupo continuam buscando a remoção das sanções internacionais, o que é essencial para a recuperação do país. Até que isso aconteça, a Síria, com 90% de sua população abaixo da linha da pobreza, permanecerá em crise, sem acesso a recursos básicos.
Enquanto isso, outros países como Catar, Egito e Arábia Saudita têm desempenhado papéis importantes como mediadores no Oriente Médio. O Catar, por exemplo, se considera uma potência mediadora e mantém relações com diversos grupos, como o Talebã e o Hamas, além de manter uma forte aliança com os Estados Unidos.
O Egito, com seu interesse direto na estabilidade de Gaza, também se envolve, buscando equilibrar suas relações com os EUA e lidar com questões internas, como o combate ao extremismo islâmico. Esses países continuarão, sem dúvida, a moldar a dinâmica regional em 2025, em um contexto onde a diplomacia será essencial para os interesses de todas as partes.
Os maiores conflitos na Africa
Na África do Sul, em 2024, vimos o Congresso Nacional Africano (CNA) perder o controle total na África do Sul, após 30 anos no poder. Além disso, a crise humanitária alimentada pela guerra civil no Sudão continua a se intensificar.
Em maio, o país viu a formação de um governo de unidade nacional, após a queda do CNA nas eleições.
Alan Kasujja, apresentador do podcast Africa Daily da BBC, explica que as expectativas para o CNA não eram altas. “Sabíamos que o CNA estava lutando em várias frentes. Perderam muitos assentos importantes e as pessoas esperavam que enfrentassem dificuldades para formar o governo”, afirmou.
O que ninguém previu foi o resultado de 40% dos votos, que foi um grande choque para muitos. Com isso, o CNA teve que se unir ao Partido da Aliança Democrática (AD), com quem teve desentendimentos nos últimos 30 anos. Kasujja observou que muitos estavam surpresos com o sucesso inicial da aliança. “Muitas pessoas com quem conversei estão agradavelmente surpresas. Está funcionando, de certa forma”, afirmou.
No entanto, a aliança enfrenta desafios, especialmente em questões políticas como a educação. “O africâner deve continuar sendo uma língua de instrução? A AD acha que sim, enquanto o CNA se opõe a isso”, explicou Alan Kasujja.
Apesar das divergências, os dois partidos estão colaborando em várias áreas. “Ambos são partidos centristas, o CNA sendo centro-esquerda e a AD centro-direita, o que facilitou essa colaboração”, acrescentou. A expectativa é que a aliança continue funcionando em 2025.
Sobre o Sudão, o apresentador relembrou que a situação do país frequentemente é citada como uma “guerra esquecida”.
“É impossível falar sobre a África sem mencionar a crise humanitária no Sudão”, disse. “É horrível o que está acontecendo lá.”
Mais de 11 milhões de pessoas foram deslocadas, muitos refugiados se encontram no Egito e Uganda, e a situação parece longe de melhorar.
A crise sudanesa continua a ser um dos maiores desafios da região, com poucas perspectivas de resolução, enquanto milhões de pessoas continuam a sofrer as consequências do conflito.
Em agosto, houve tentativas de negociações. Mas as pessoas simplesmente não compareceram. Alguns analistas acreditam que 2025 pode ser ainda mais difícil para o Sudão.
Atualmente, há uma pequena abertura, com caminhões sendo autorizados a entregar alimentos em algumas regiões.
Os aeroportos voltaram a operar em algumas partes do país, no norte, permitindo o fluxo de ajuda humanitária. Mas, de modo geral, enquanto a guerra não parar, muitos problemas continuarão afetando o Sudão.
A África agora é o continente mais jovem do mundo, e em 2024 vimos uma série de protestos no Quênia e na Nigéria, principalmente por parte de millennials e da Geração Z por conta da falta de oportunidades.
“Ninguém esperava que o problema no Quênia persistisse até agora. Começou com a introdução de uma proposta de lei fiscal pelo governo. Muitos jovens se opuseram, pois sentiram que o governo de William Ruto já estava sobrecarregando a população com impostos. E as pessoas estão lutando.”
“Existe, de fato, um grande problema com o custo de vida no mundo inteiro, não só na África, mas em todo lugar. Esses países têm enfrentado dificuldades. Quando você vê que os jovens são a maioria, não têm empregos e a classe política está ostentando sem se preocupar com a situação da maioria, isso sempre vai gerar problemas”, diz Kasujja.
Ele explica que jovens de todas as classes sociais se uniram, protestando contra o governo.
“Agora, se não nos levantarmos contra o governo, os problemas que herdaremos serão muito maiores do que os que vemos atualmente”, diz , mencionando também que a mesma situação se repete na Nigéria.
“Isso vai continuar em todo o continente, a menos que os governos mostrem algum nível de resposta à situação dos jovens. Tivemos ministros no Quênia exibindo seus cintos e relógios caros na televisão, e os jovens pensaram: ‘Por que você está usando um relógio de 50 mil dólares enquanto mal consigo pagar comida?'”
Kasujja aponta sobre os avanços no combate ao HIV na África Subsaariana, um dos lugares mais afetados pela doença. O novo medicamento para prevenção e tratamento do HIV, que seria administrado apenas duas vezes por ano, está causando grande expectativa.
“Para nós, isso é algo muito pessoal. Sou da época em que o HIV era visto como uma sentença de morte. Quando você ouve que há um medicamento que pode mudar isso, é um marco.”
O clima
Na sequência, o editor de clima da BBC, Justin Rowlatt, fala sobre os desafios e esperanças em relação às metas climáticas globais.
Ele comenta que, embora as emissões de gases de efeito estufa ainda não tenham atingido seu pico, há uma chance de que isso aconteça em 2025.
“Este é um momento civilizacional. Nossa economia sempre foi baseada em combustíveis fósseis. Se conseguirmos atingir o pico das emissões e começar a reduzi-las, isso será um grande avanço para a sociedade.”
Sobre a China, Rowlatt destaca que, apesar de ser o maior emissor do mundo, também é líder mundial em energia verde, com grandes investimentos em energia renovável. A expectativa é que esses investimentos possam ajudar a diminuir as emissões de carbono do país, o que teria um grande impacto global.
No entanto, a chegada de Donald Trump à presidência dos EUA novamente levanta preocupações sobre o futuro das políticas climáticas.
“Trump sempre foi cético sobre as mudanças climáticas, e sua postura em relação à energia verde não é clara. Ele tem dito que vai reverter muitas das políticas do governo Biden, o que pode atrasar a transição energética”, afirma.
O ano de 2025 será crucial para o futuro do clima. “Os países têm até fevereiro para apresentar seus compromissos nacionais de redução de emissões. Esperamos que sejam ambiciosos, pois isso determinará a trajetória dos próximos anos”, conclui Rowlatt.
Ele também menciona as esperanças em torno de eventos climáticos importantes em 2025, como a COP 30 no Brasil, que poderá ser decisiva para o futuro do planeta.
“Esperamos que, durante a COP 30, os países realmente se comprometam a cortar suas emissões de carbono de maneira ambiciosa”, afirma.”Será um ano muito importante para as questões climáticas, e estamos todos atentos ao que acontecerá.”