Com Lula de volta a Brasília e o projeto de corte de gastos passando raspando por um Congresso que não esconde a má vontade, o almoço de fim de ano do governo deve se dar com forte cheiro de fritura no ar. Isso porque o começo de 2025 transformará a reforma ministerial em pauta prioritária em Brasília, com o tempo correndo contra o relógio para contemplar os arranjos feitos para a troca da guarda na Câmara e no Senado e, no mundo ideal, já tentar amarrar os partidos para as eleições de 2026.
Os rumores se intensificaram nos últimos dias, e aqueles cujas pastas são incluídas na bolsa de apostas das trocas se apressam em negar que estejam na lista de cortes do presidente. A mesma agonia foi vista no ano passado, quando muitos conseguiram se segurar na base da amizade e do voto de confiança de que fariam os programas de suas pastas deslancharem a contento se recebessem nova chance.
As especulações não poupam, de novo, nem o vice-presidente Geraldo Alckmin. Depois que Ricardo Lewandowski deu um jeito de que viesse a público seu incômodo com a possibilidade de perder o cargo que não queria ocupar, mas que foi convencido por Lula a aceitar, ensaia-se um desenho em que Rodrigo Pacheco deixe o Senado para ocupar o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio no lugar de Alckmin.
Em algum momento, a falta de cuidado do entorno de Lula com o vice provocará uma crise real. Depois da experiência traumática do PT com Michel Temer, o partido parece dar pouco valor à lealdade absoluta demonstrada por Alckmin em todos os momentos, desde a campanha. O descaso faz com que sejam quase permanentes os balões de ensaio sobre nomes de diferentes partidos que poderiam ocupar a vice em 2026. Nesses cenários traçados por quem tem claro interesse no Jaburu, Alckmin sairia para o governo de São Paulo ou o Senado. Só falta saber se alguém combinou com ele. É o tipo de cogitação que, se passa de fato pela cabeça de Lula, mostra que a reforma ministerial pode ser causa de mais crise, e não solução para os problemas concretos do governo.
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Além da já detectada falha de comunicação — que, diga-se, não se deve exclusivamente ao ministro Paulo Pimenta e muitas vezes começa no próprio Alvorada —, há problemas concretos na Saúde, a mais importante pasta da Esplanada, e no Trabalho, para ficar só em duas áreas.
O risco é que, se houver a substituição de Nísia Trindade, as razões podem ser as erradas, e o resultado pior. Ninguém de boa-fé discute a respeitabilidade da ministra, mas seria tapar o sol com a peneira desconsiderar os graves problemas de gestão que, após dois anos, remanescem na pasta de maior Orçamento do país. A campanha para derrubá-la atende antes a interesses fisiológicos do Congresso, viciado na dopamina das emendas, que a uma preocupação legítima com o andamento dos programas e da rede de saúde.
No caso de Luiz Marinho, nenhuma prévia da reforma feita por quem acompanha o raciocínio de Lula o inclui nas listas de quem pode ir para a casa. Isso mostra que, por mais que o governo detecte a dificuldade de compreender como funciona o novo mundo do trabalho, não está interessado em virar esse jogo.
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A lógica que preside a reforma em início de gestação é dar ainda mais espaço a partidos como União Brasil, PSD, Republicanos e MDB. Resta a pergunta: o upgrade que essas siglas podem ter será acompanhado de um termo de compromisso de apoio a Lula daqui a dois anos? Nada indica que sim. Pelo contrário: esses partidos usarão a visibilidade e a caneta ofertadas pelo petista para fazer política em suas bases e negociar a valores ainda mais altos seu apoio a um dos lados da polarização em 2026.
Se a maior crise de Lula hoje é de confiança, e aqui não se trata apenas do famigerado mercado, mas também do eleitorado em geral, como mostram as pesquisas, essa lógica de reforma ministerial não deverá ajudar em nada. Com boa chance de ainda atrapalhar.