O Congresso deixou de lado, por pressão das plataformas digitais, o Projeto de Lei das Redes Sociais, que já deveria ter sido aprovado. Paradoxalmente, demonstra mais agilidade ao tratar da inteligência artificial. Os senadores aprovaram um Projeto de Lei (PL) regulamentando o desenvolvimento e uso da IA no Brasil. O projeto, de autoria do senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), seguiu para avaliação da Câmara dos Deputados.
O texto determina regras a ser seguidas por empresas que usarem IA e estabelece como se dará a supervisão delas. Tecnologias classificadas como de alto risco, que podem causar danos, deverão ter regulação mais restrita. Entre elas, o PL inclui concessão de serviços públicos, seleção de estudantes, recrutamento de trabalhadores ou veículos autônomos. Quem desenvolver sistemas com tais finalidades será obrigado a realizar testes de avaliação. A preocupação é evitar discriminação e acidentes. Em caso de dúvidas ou problemas, deverá implementar medidas corretivas. A responsabilidade de regular IAs de alto risco será de um novo organismo do governo, o Sistema Nacional de Regulação e Governança de Inteligência Artificial (SIA).
Atendendo à demanda da opinião pública, o PL proíbe o uso de ferramentas de IA para o poder público avaliar ou classificar cidadãos no acesso a bens e serviços. Armas autônomas e avaliação de risco de cometer crime também são banidas pela legislação. O uso da biometria é permitido somente para capturar fugitivos, cumprir mandados de prisão e para flagrantes de crimes com penas de mais de dois anos de prisão.
Questionados se o país deveria garantir a regulamentação de IA, 50% dos brasileiros responderam que sim, de acordo com pesquisa de opinião feita pelo Instituto Ipsos para a Fundação Luminate. Apenas 19% se disseram contrários, enquanto outros 31% afirmaram ser neutros ou não saber. Quanto mais a população se informa sobre IA, mais defende a regulação. As respostas na Argentina, na Colômbia e no México seguem o mesmo padrão.
O interesse da população pela IA é prova de que o potencial transformador da nova tecnologia é avassalador. Estimular seu uso é um dos caminhos da geração de riqueza e do desenvolvimento, e o Brasil não pode ficar fora dessa corrida. O desafio é regular com sabedoria para manter o direito à liberdade dentro dos parâmetros estabelecidos pelos princípios constitucionais.
Embora o texto de Pacheco tente evitar a omissão cometida com as redes sociais, peca no sentido oposto: estabelece restrições demais para uma tecnologia cujos contornos e impactos ainda estão indefinidos. É verdade que a IA oferece riscos e desperta preocupações, mas criar regras e limites exagerados no atual estágio poderá acabar inibindo seu desenvolvimento ou, pior, impor categorias e disciplinas que rapidamente se tornarão obsoletas diante da realidade.