O presidente do Banco Central (BC), Gabriel Galípolo, afirmou, durante seminário no Rio, que a autoridade monetária “ainda precisa de tempo” para avaliar como os dados vão evoluir para tomar uma decisão sobre os juros.
“É óbvio que partir do momento que a gente vai chegando próximo do fim do ‘guidance’ (projeção), a gente vai se distanciando da costa, digamos assim, e o barco tende a balançar um pouco mais. Você vai passando a ter espectros possíveis que são mais amplos, mas acho que a gente ainda precisa de tempo. A gente está com nossa rota de planejamento até a próxima reunião bastante definida e vamos ganhar tempo para ver como os dados vão reagindo e o que é sinal e o que é ruído”, disse.
O Copom elevou a taxa básica de juros de 12,25% para 13,25% ao ano na última reunião e manteve a sinalização de mais uma alta de 1 ponto percentual (p.p.) na reunião de março.
Galípolo foi questionado sobre a valorização recente do real e as projeções de inflação que constam na ata do Copom, que utilizam o câmbio em R$ 6 evoluindo a partir da paridade do poder compra como um dos pressupostos. O Copom projeta inflação de 4% para o terceiro trimestre de 2026.
Em sua resposta, Galípolo afirmou que a pergunta era “perfeita” para explicar as decisões de política monetária e relatou que o perguntaram por que o Copom não fez uma elevação de 3 pontos percentuais em uma única reunião. “Esse processo, como a gente acabou de falar, é dinâmico. Variáveis externas, variáveis internas então você vai dando o antibiótico para o paciente a cada 12 horas para entender como o paciente vem reagindo e poder ter tempo para fazer esse tipo de análise.”
O presidente do BC disse que não está no mandato da autoridade monetária reduzir volatilidade no mercado, mas “seria bom que ele não agregasse”. Ainda na resposta sobre a valorização do real, Galípolo disse que o mercado tem uma velocidade de reação que é obrigado a fazer, “mas se o Banco Central, para usar uma expressão lacaniana, que é entrar nesse estágio do espelho, sem saber quem é ele quem é o outro, ele vai fazer reflexo que vai repercutir e amplificar essa volatilidade, então é bastante importante que o nosso tempo seja um tempo de poder analisar como esses dados vão se depurar e andar ao longo do tempo e não fique produzindo mudanças de direção de maneira muito brusca.”
Ainda sobre o câmbio, Galípolo explicou que o tema principal da atuação da autoridade monetária no mercado em dezembro era monitorar o que efetivamente tinha de saída de remessas e o nível do estresse do cupom cambial. Segundo o presidente do BC, o monitoramento servia para garantir a “equivalência” entre as atuações do BC.
“Naquele momento, todas as mensurações do Depin (Departamento de Reservas Internacionais) indicavam essa necessidade de a gente dar liquidez para essa saída para poder manter os devidos canais de transmissão equivalência entre o swap e spot”, disse.
O BC vendeu US$ 21,6 bilhões no mercado à vista e US$ 11 bilhões em leilões de linha (venda com compromisso de recompra) em dezembro. Galípolo lembrou que, em 2023, foi a primeir vez que o BC não fez nenhuma intervenção no câmbio e em dezembro de 2024, foi a maior intervenção.
O presidente do BC citou o ex-presidente do Federal Reserve (Fed) Ben Bernanke. “Bernanke disse que não existem ideólogos nem numa trincheira de guerra nem no Banco Central, lá você faz o que é preciso ser feito.”
Galípolo chegou a citar a coluna do economista Márcio Garcia no Valor que explica bem o que estava acontecendo em dezembro.
Galípolo também afirmou, durante o evento, que a hipótese de que as reformas econômicas feitas nos últimos anos permitiram uma elevação do Produto Interno Bruto (PIB) potencial depende de mais investigação e tempo. Galípolo mencionou que o Brasil está crescendo há alguns anos acima do que esperava e acima da estimativa de crescimento potencial do país e que há várias explicações que tentam abordar o tema.
“Uma que é bastante recorrente é imaginar que as reformas que ocorreram nos últimos anos produziram ganhos e que isso permitiu uma elevação do PIB potencial, do crescimento potencial da economia. Todos nós temos carinho por essa interpretação e desejo por essa interpretação, o FMI fez uma revisão sobre o que entende ser o crescimento potencial do país, acho ótimo, mas eu sou daqueles que acho que essa hipótese depende de mais investigação e mais tempo.”
Galípolo afirmo que “é lógico” imaginar que as reformas produziram esse ganho, mas “olhando para os dados é difícil encontrar evidências de ganhos de produtividade além do setor agro. Acho que tem um pouco de dificuldade de encontrar evidências, por isso consumo essa hipótese com um pouco de parcimônia.”
O presidente do BC ainda apontou que há uma segunda questão que é o tema fiscal que se fragmenta no tema dos precatórios e na discussão sobre a composição da política tributária e fiscal ao longo de 2024. Galípolo explicou que havia uma discussão sobre o impacto dos precatórios na economia.
“Lembro que a gente passa a fazer conversas, nessas conversas de conjuntura que a gente faz no Banco Central, e diversas instituições falavam ‘não, olha, lá atrás, quando se postergou o pagamento, a gente não fez nenhum tipo de revisão sobre PIB nem nada desse tipo então agora também não vamos fazer uma revisão para cima. Esse era o diagnóstico original sobre precatórios e isso foi mudando rápido ao longo do ano conforme foi se estimando que sim, os precatórios tinham um efeito de impulso fiscal significativo.”
Sobre a composição da política fiscal em 2024, Galípolo afirmou que as revisões maiores feitas nas projeções do relatório Focus entre o que se esperava no início de 2024 e o que será realizado, foram de crescimento econômico e na inflação. O presidente do BC aponta que as revisões do resultado primário e na relação dívida/PIB não foi tão acentuada.
“Sei que é preciso considerar todos os impactos, tanto do crescimento maior, como questão das reservas, mas até ele veio melhor do que se imaginava, vamos imaginar esses dois números aqui.”
Nesse cenário, Galípolo afirmou que provavelmente para o mesmo nível de gasto fiscal que já se imaginava no começo de 2024, o impulso foi maior. “Impulso fiscal para o mesmo nível de gasto acho que foi maior do que se imaginava, talvez porque existia um componente distributivo na política de transferência de renda que acaba colocando dinheiro na mão de quem tem propensão a consumir mais elevada.