- Author, Redação
- Role, BBC News Mundo
O secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, advertiu neste domingo (2/2) que o governo norte-americano tomará medidas contra o Panamá se a influência da China no canal não for reduzida.
O principal representante da diplomacia dos EUA se reuniu com o presidente panamenho José Raúl Mulino em uma visita oficial ao país.
De acordo com a agência de notícias AFP, Rubio informou no encontro que o presidente dos EUA, Donald Trump, sustenta que o Panamá violou os termos do tratado de devolução do canal concretizado em 1999.
Na reunião, “deixou claro que esse status quo é inaceitável e que, na ausência de mudanças imediatas, seria necessário que os EUA tomassem as medidas necessárias para proteger seus direitos sob o tratado”, disse a porta-voz do Departamento de Estado, Tammy Bruce.
O presidente panamenho declarou que o controle do canal não está em discussão.
“A soberania do Panamá não está em questão, isso é muito importante e expliquei isso em detalhes [a Rubio]”, afirmou. “O canal é operado pelo nosso país e assim continuará sendo”.
O Departamento de Estado dos EUA não esclareceu quais medidas seriam tomadas contra o Panamá. Mulino disse à imprensa que não vê uma ameaça de ação militar nem que o tratado esteja em risco.
Em 7 de janeiro, Trump deu sinais de que não vai desistir da ambição de obter o controle da Groenlândia e do Canal do Panamá e que não descartava o uso de força militar ou econômica para assumir o controle nos dois casos.
O Panamá foi, por muito tempo, uma província da Colômbia. Sua independência se tornou realidade em 1903 graças ao interesse norte-americano pelo projeto do canal. Os EUA garantiam que manteriam a independência do Panamá desde que o país concedesse a concessão perpétua do canal. Mas um acordo firmado em 1977 pelo então presidente Jimmy Carter estabeleceu a devolução para mãos panamenhas em 1999.
Embora o canal seja do Panamá, Rubio e Trump argumentam que a China ganhou tanto poder em torno da infraestrutura que poderia fechá-lo em um possível conflito, com consequências catastróficas para os EUA.
Mulino disse em outras ocasiões que não há “absolutamente nenhuma interferência chinesa” no canal.
Na reunião, também foram discutidos temas como imigração e crime organizado.
O Panamá se ofereceu para receber migrantes de outros países, desde que os custos das repatriações de não panamenhos sejam cobertos pelo governo norte-americano.
“Vamos explorar a possibilidade de ampliar o memorando de entendimento que assinamos em 1º de julho com o Departamento de Segurança Interna para articular mais a questão dos repatriados do Darién”, comentou o presidente.
Marco Rubio visita América Central
O chefe da diplomacia dos EUA, que é descendente de cubanos, visitará países da América Central e Caribe, com paradas em El Salvador, Guatemala, Costa Rica e República Dominicana.
Sua agenda estará focada principalmente em duas das preocupações fundamentais deste segundo mandato de Trump: o controle da imigração ilegal e o combate ao crime organizado.
Mas, com o Panamá, os interesses dos EUA vão além.
“Estão nos enganando no Canal do Panamá”, disse o republicano fazendo referência às taxas cobradas aos navios norte-americanos, antes mesmo de tomar posse da Casa Branca.
Se isso não mudar, ameaçou Trump, “exigiremos que o Canal do Panamá seja devolvido aos EUA em sua totalidade, rapidamente e sem questionamentos”.
E Trump parece não ter mudado nem um pouco essa posição. Em seu primeiro discurso após tomar posse, reiterou suas aspirações e acrescentou que “maravilhosos soldados da China” estão “operando amorosamente, mas ilegalmente, no Canal do Panamá”.
A estratégica via navegável, responsável por cerca de 5% do volume do comércio marítimo mundial, é administrada pela Autoridade do Canal do Panamá, uma entidade do governo panamenho, e não por soldados chineses.
Empresas chinesas têm uma presença significativa atualmente no Canal do Panamá, tanto pelo volume de carga que transita na via, tornando a China o segundo maior usuário após os EUA, como pelos investimentos significativos em portos e terminais adjacentes ao canal, como os de Balboa e Cristóbal.
Horas antes de embarcar para a Cidade do Panamá, Rubio reiterou que “o presidente Trump está bem claro de que quer administrar o canal novamente”.
Mulino, por sua vez, enfatizou que a soberania do Canal do Panamá é e continuará sendo dos panamenhos.
“Não posso negociar e muito menos abrir uma negociação sobre o canal”, disse.
De acordo com o New York Times, estava previsto que Rubio também se reunisse com o próprio administrador do Canal do Panamá.
Histórico do canal
Os EUA construíram o Canal do Panamá no início do século 20 e controlaram seu funcionamento até 1999.
Isso aconteceu depois que o Panamá se tornou independente da Colômbia, com o apoio dos EUA. Washington fomentou as ambições separatistas após a rejeição do congresso colombiano à concessão para a construção do canal, pela qual os americanos haviam oferecido US$ 40 milhões.
O Panamá declarou sua independência em 3 de novembro de 1903, para depois assinar o tratado Hay-Bunau Varilla com os EUA.
Nesse acordo, os EUA se comprometeram a manter a independência do Panamá, enquanto era dada a concessão perpétua do canal, além do domínio da chamada Zona do Canal.
No entanto, as tensões entre os dois países não demorariam a aparecer. Na prática, o Panamá ficou dividido: os americanos e suas famílias viviam em uma zona separada, regida por suas próprias leis, enquanto trabalhavam na obra, inaugurada em 1914.
Essa zona era inacessível para os panamenhos sem uma permissão especial, o que alimentou o ressentimento da população local em relação aos privilégios dos chamados “zoneítas”.
Com o tempo, esse mal estar se traduziu em protestos pela recuperação do controle do canal.
A situação explodiu em 9 de janeiro de 1964, quando estudantes panamenhos tentaram içar sua bandeira em uma escola da zona, mas foram detidos pela polícia americana, o que resultou em uma repressão violenta.
Esse incidente, conhecido como o “Dia dos Mártires”, foi o catalisador para que, mais de três décadas depois, o Canal do Panamá fosse finalmente transferido para o Panamá.
Após longas negociações, em 7 de setembro de 1977, com a assinatura do presidente dos EUA, Jimmy Carter, e do líder panamenho, general Omar Torrijos, ambas as partes assinaram o acordo.
Foi estabelecido que a soberania da Zona do Canal ficaria sob a legislação do Panamá e que a transferência do controle do canal para o país centro-americano ocorreria em 31 de dezembro de 1999.