A escalada da violência na cidade do Rio de Janeiro é uma realidade triste e perigosa. Desde os últimos meses de 2024, Fiocruz e UFRJ vivem um cenário de intensificação de operações policiais nas comunidades vizinhas. Só no início deste ano, a Fiocruz já precisou acionar seu plano de contingência três vezes e recomendar trabalho remoto noutras duas ocasiões para proteger seus servidores e alunos. Numa delas, agentes das forças de segurança invadiram o campus de Manguinhos sem aviso ou autorização durante uma operação policial. Cerca de 90% das edificações da instituição já foram atingidas por projéteis de arma de fogo.
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Na UFRJ, o cenário não é diferente. O cancelamento de aulas, a suspensão de pesquisas e a insegurança no trajeto de estudantes e servidores fazem parte do dia a dia da instituição, que trabalha na finalização de um plano de contingência para lidar com emergências em contextos de violência armada.
A violência impacta todos indistintamente. Nossos trabalhadores, alunos e parte da população atendida por nossos serviços têm sido obrigados a lidar com a rotina de confrontos. São afetados diretamente, como ocorreu com a servidora da Fiocruz atingida por estilhaços em janeiro deste ano, ou indiretamente, quando têm de interromper seus trajetos, cancelar compromissos e voltar para a casa com medo.
Para os moradores das comunidades afetadas, os resultados podem ser ainda mais graves. Além das perdas humanas irreparáveis, escolas e postos médicos frequentemente são obrigados a fechar, restringindo o acesso a educação e saúde.
Essa situação, que deveria ser de exceção, tem se tornado cada vez mais parte da rotina da cidade. Consequentemente, aprofundam-se as desigualdades, e limitam-se substancialmente as oportunidades que deveriam ser garantidas para todos, sem qualquer tipo de distinção territorial. Enquanto isso, no Supremo Tribunal Federal (STF), o julgamento crucial da ADPF das Favelas pode estabelecer critérios para operações policiais em comunidades fluminenses.
É fundamental reconhecer que o atual modelo de segurança, baseado no confronto armado, já demonstrou seus limites. O número de vidas perdidas — sejam policiais, moradores ou trabalhadores — evidencia a urgência de uma abordagem pautada em inteligência e prevenção. O enfrentamento à criminalidade precisa ser eficaz, mas também estratégico, humano e alinhado a políticas públicas que reduzam desigualdades estruturais. O Rio de Janeiro não pode ser refém de uma política de segurança baseada no improviso e na força bruta.
Como instituições estratégicas do Estado brasileiro, a Fiocruz e a UFRJ reiteram a necessidade de uma política de segurança comprometida com a melhoria da vida de nossa população. Nos colocamos à disposição para contribuir de forma estratégica em ações coordenadas entre governo, sociedade civil e instituições de pesquisa e ensino, a fim de transformar a realidade de violência atual e de assegurar que a integridade de nossos trabalhadores e das comunidades que nos cercam sejam respeitadas. Que possamos juntos superar os desafios que a violência nos impõe.
*Mario Moreira é presidente da Fiocruz, Roberto Medronho é reitor da UFRJ