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quinta-feira, abril 24, 2025

Filme com Tom Hardy que levou 100 milhões de espectadores aos cinemas e arrecadou 5 bilhões de bilheteria — na Netflix

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Em um cenário saturado por universos cinematográficos interligados, heróis de moral cristalina e vilões reduzidos a arquétipos unidimensionais, “Venom” ousa romper com a previsibilidade ao se instalar numa zona de turbulência narrativa. Longe de propor uma revolução estética ou conceitual dentro do gênero, o longa-metragem protagonizado por Tom Hardy escolhe um caminho mais sinuoso e ambíguo: o de um filme que se recusa a obedecer aos parâmetros estabelecidos. Aqui, o protagonismo não pertence ao salvador clássico, mas a um corpo em disputa, habitado por forças que jamais se harmonizam por completo. Essa tensão constante entre dominação e cumplicidade, repulsa e atração, é a centelha que alimenta a estranha vitalidade da obra.

Tom Hardy, com sua fisicalidade instintiva e entrega sem freios, encarna Eddie Brock como um sujeito em ruínas, emocionalmente esfarelado e socialmente deslocado — um terreno fértil para a invasão simbiótica que dá origem à criatura titular. O encontro entre humano e alienígena não é romantizado nem suavizado: trata-se de uma colisão violenta e grotesca, marcada por diálogos internos que beiram o esquizofrênico. E é justamente essa dissonância — entre o grotesco e o hilário, o monstruoso e o tragicômico — que confere ao filme uma identidade instável, mas singular. “Venom” rejeita a estética asséptica dos super-heróis polidos e assume sua própria desordem como proposta narrativa.

É verdade que a estrutura do roteiro não escapa de armadilhas comuns ao gênero: o antagonista genérico, os confrontos previsíveis, os diálogos expositivos. Contudo, a força do filme não reside na trama em si, mas na performance desconcertante de Hardy e na dinâmica imprevisível entre Brock e o simbionte. A voz cavernosa e sarcástica da criatura serve como uma espécie de comentário metalinguístico, zombando dos clichês que o próprio filme, em parte, reproduz. Essa autoconsciência contida — nunca explícita demais, mas sempre insinuante — impede que “Venom” se leve a sério a ponto de afundar em pretensões que não pode sustentar. Ao contrário: seu mérito está em rir de sua própria aberração.

É justamente no desalinhamento entre forma e conteúdo que “Venom” encontra seu pulso. O primeiro ato, dedicado a estabelecer o ambiente urbano decadente e o estado psíquico do protagonista, constrói uma base quase realista, que depois é obliterada pela entrada abrupta do simbionte. Essa transição brusca, que poderia soar como falha de coesão, se revela coerente com a proposta do filme: não há evolução gradual, apenas colisão — uma ruptura interna que redefine a própria lógica do universo apresentado. Ao invés de sugerir uma redenção clássica, a jornada de Brock é sobre adaptação ao caos, sobre fazer as pazes com o que há de mais indomável em si.

Enquanto outros títulos do universo Marvel apostam em lapidar seus protagonistas até torná-los ícones de virtude ou sacrifício, “Venom” faz o movimento oposto: celebra o inacabado, o contraditório, o impulsivo. A criatura que dá nome ao filme não é um símbolo do mal, mas uma manifestação exagerada dos impulsos reprimidos, uma metáfora crua daquilo que nos habita e que, frequentemente, tentamos domesticar. Ao deixar que essa presença escura permaneça em cena sem purificação moral, o filme se arrisca — e, nesse risco, encontra sua potência.

Não há, aqui, uma direção ousada ou uma fotografia memorável. Os efeitos visuais, embora competentes, não subvertem padrões. O que há é uma recusa instintiva em se comportar como mais um produto industrializado do gênero. Essa recusa se traduz em pequenos gestos — na crueza de certos diálogos, no humor que emerge do absurdo, na tensão latente que nunca se resolve. E, sobretudo, na disposição de permitir que seu protagonista se mantenha ambíguo até o fim, sem precisar justificar cada escolha por meio de arcos redentores ou lições edificantes.

Se há algo que diferencia “Venom” de seus pares, é justamente essa recusa em agradar. O filme não tenta ser grandioso, nem transformador. Ele apenas se permite existir como um híbrido desconcertante entre comédia involuntária, terror corporal e ação caótica — e nessa mistura disforme, encontra algo que poucos blockbusters conseguem: autenticidade. Talvez não seja um clássico. Talvez nem devesse aspirar a isso. Mas ao aceitar a própria estranheza como identidade, “Venom” é como um corpo estranho que pulsa com vida própria — e que, por isso mesmo, é impossível de ignorar.

Filme:
Venom

Diretor:

Ruben Fleischer

Ano:
2018

Gênero:
Ação/Aventura/Ficção Científica

Avaliação:

8/10
1
1




★★★★★★★★★★

[Fonte Original]

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