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sábado, abril 26, 2025

Como as Práticas Regenerativas da Illy Criam Cafés Brasileiros Premiados

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Roberto Pastrovicchio

David Brussa, diretor de Qualidade Total e Sustentabilidade da illycaffè,

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A potência italiana do café, illycaffè, está reescrevendo a narrativa do café brasileiro por meio do foco na agricultura regenerativa. Em outubro de 2023, a Illy lançou o primeiro café certificado pelo Regenagri, um dos principais sistemas globais de verificação de agricultura regenerativa. Os resultados têm sido transformadores: fazendas brasileiras que implementam essas práticas regenerativas venceram o prestigiado Prêmio Internacional de Café Ernesto Illy por dois anos consecutivos, em 2023 e 2024.

A transformação é especialmente notável considerando a reputação histórica do Brasil. O país é há muito tempo o maior produtor mundial de café, respondendo por quase 38% do café global, com aproximadamente 4,2 milhões de toneladas métricas por ano (69,9 milhões de sacas de 60 quilos cada). Tradicionalmente, os grãos brasileiros raramente eram celebrados por sua qualidade excepcional. No entanto, com as práticas regenerativas, essas fazendas alcançaram um reconhecimento antes considerado impossível.

As práticas de agricultura regenerativa têm um significado ainda maior ao se considerar a pegada ambiental substancial da indústria do café. O cultivo ocorre em mais de 11 milhões de hectares no mundo todo, empregando cerca de 25 milhões de agricultores em 50 países do “cinturão do café”, dos quais 80% são pequenos produtores (menos de cinco hectares), vulneráveis às mudanças climáticas e à volatilidade de mercado.

A Forbes conversou com David Brussa, diretor de Qualidade Total e Sustentabilidade da illycaffè, sobre a abordagem abrangente da empresa em relação à agricultura regenerativa. A conversa aqui se baseia em uma entrevista anterior com Andrea Illy, em 2021, na qual ele mencionou ter feito um sabático para estudar agricultura regenerativa.

Três anos depois, a Illy levou o conceito de “Agricultura Virtuosa” da visão à implementação, demonstrando como essas práticas podem transformar os impactos ambientais e a qualidade do café. A adoção da certificação Regenagri é apenas uma manifestação desse compromisso mais amplo de transformar o cultivo do grão de uma prática potencialmente extrativa em uma regenerativa.

Nesta conversa também exploramos algumas das práticas regenerativas específicas da Illy, estratégias para adaptação às mudanças climáticas e abordagens inovadoras para educar os consumidores sobre sustentabilidade. Discutimos como a illycaffè garante remuneração justa aos agricultores que implementam essas práticas e os esforços para colaborar com a indústria como um todo para promover mudanças sistêmicas. Acompanhe a entrevista a seguir David Brussa:

A ideia de agricultura regenerativa está ganhando destaque no café. Quando falamos com Andrea Illy há cerca de três anos, ele mencionou ter tirado um sabático para estudar esse conceito, com base em sua formação como químico. O sr. pode nos contar como a visão da illycaffè sobre agricultura regenerativa evoluiu, particularmente em relação aos ecossistemas e comunidades cafeeiras?

O impulso regenerativo que vivenciamos agora vem de dois desenvolvimentos simultâneos. Primeiro, em 2018, o doutor Illy passou um ano estudando as melhores práticas sustentáveis no setor privado, especialmente na produção de café. Ele desenvolveu uma filosofia chamada “Agricultura Virtuosa” – uma forma de obter benefícios duplos para o meio ambiente e para a saúde humana. O conceito envolve produzir em harmonia com a natureza, reduzindo fertilizantes e pesticidas químicos, utilizando culturas de cobertura e consórcios, cuidando do uso da terra e aumentando a fertilidade para que o produto se torne mais saudável e de melhor qualidade.

Ao mesmo tempo, em 2019, nos tornamos uma empresa de benefício e iniciamos o processo para nos tornar uma B Corp certificada, o que foi conquistado em abril de 2021. Durante a avaliação do B Lab, descobrimos que empresas que pontuam abaixo de 80 são classificadas como “extrativas”, enquanto aquelas acima de 80 são consideradas “regenerativas”.

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Práticas regenerativas no cultivo da café estão mudando o setor dos especiais

Para nós, qualidade e sustentabilidade são duas faces da mesma moeda, com a ética como a borda que as conecta. Em nosso plano plurianual, estamos atualmente no que chamamos de “período da circularidade”. Em cerca de cinco anos, nosso foco será a restauração – recuperar o que o ser humano já danificou. Depois, em aproximadamente dez anos, trabalharemos na conservação – manter o que empresas e entidades públicas já recuperaram e restauraram.

O sr. poderia detalhar alguns projetos específicos que estão sendo implementados nas regiões cafeeiras para reformar as práticas agrícolas?

Em outubro de 2023, lançamos a seleção Arábica do Brasil, certificada como agricultura regenerativa pelo Regenagri. Trata-se de um produto 100% Arábica de produtores certificados.

O conceito de agricultura regenerativa surgiu na Pensilvânia, pelo Instituto Rodale, há mais de 50 anos, e envolve mais de 180 práticas diferentes. Estudamos essas práticas para identificar quais poderiam ser aplicadas à produção de café, uma vez que os cafeeiros são plantas perenes com vida útil de 20 a 30 anos, diferente das culturas anuais.

Após três anos de trabalho, identificamos 18 práticas e, em nossa última viagem à África, descobrimos mais duas. Nossa lista de práticas regenerativas para o café inclui, por exemplo, podar os galhos com tesoura em vez de facão; fazer consórcios com árvores grandes que geram sombra e reduzem a evaporação da água; criar terraços em terrenos inclinados para reter água; substituir fertilizantes químicos por orgânicos, gerando sinergia com a pecuária; utilizar bioestimulantes para aumentar naturalmente a fertilidade do solo; evitar o revolvimento da terra para preservar a microbiota; e usar culturas de cobertura para atrair predadores naturais de pragas.

Essas práticas reduzem a evaporação, ajudando o café Arábica a absorver umidade pelas raízes, crucial para o crescimento e maturação dos grãos. Estamos testando essas abordagens em plantações na Etiópia, Guatemala, Costa Rica e em nove localidades no Brasil, medindo benefícios como redução de gases de efeito estufa, aumento da biodiversidade, saúde dos trabalhadores e produtividade.

Também introduzimos técnicas de agricultura de precisão, com sensores que medem condições do solo, temperatura do ar e umidade. Comparamos essas áreas monitoradas com seções convencionais para quantificar os benefícios. Esse avanço ganhou força, em parte, porque muitos filhos de agricultores, que estudaram no exterior e retornaram durante a COVID-19, trouxeram novas ideias tecnológicas.

Além dos aspectos ambientais, o que vocês estão fazendo para impactar positivamente os agricultores em termos regenerativos, especialmente quanto à remuneração e aos benefícios?

Há 90 anos, a illycaffè reconhece que qualidade tem um custo e deve ser recompensada com um prêmio. Compramos café com base na qualidade, utilizando o valor da commodity como base, acrescido de um prêmio de qualidade ligado à produção. Hoje, buscamos não apenas qualidade, mas “qualidade superior e sustentável”.

Nossa forma de remuneração já está incorporada ao nosso modelo de negócios, independentemente das flutuações do mercado. Se você quer qualidade e sustentabilidade, deve pagar mais, caso contrário, os produtores não se sentem motivados a melhorar. Nossos contratos peer-to-peer, sejam anuais ou plurianuais, permitem que a Illy trabalhe lado a lado com os produtores e pague o valor real do café.

Operamos com o que chamamos de “processo de compras sustentáveis”, desenvolvido em conformidade com duas diretrizes internacionais da ISO: a ISO 26000 de responsabilidade social corporativa e a ISO 20400 de compras sustentáveis. Por meio desse processo, capacitamos os produtores não só em qualidade, mas também em práticas sustentáveis. Ensinamos a gerenciar recursos, controlar custos, coletar dados primários para cálculo de pegada de carbono e uso de água, e a escolher os insumos mais benéficos e menos prejudiciais quando os tratamentos são necessários.

A transferência de conhecimento ocorre diretamente por meio da nossa Università del Caffè da illycaffè e também por meio de plataformas online no Brasil, onde compartilhamos semanalmente informações sobre novas tecnologias e melhores práticas. As práticas regenerativas já fazem parte desse conteúdo repassado aos nossos fornecedores.

A mudança climática é uma preocupação central para o cultivo do café. Como a Illy está pensando em se adaptar a essas mudanças, especialmente quanto a possíveis deslocamentos nas regiões produtoras?

A mudança climática é hoje uma realidade diária que precisamos enfrentar, não apenas porque áreas antes úmidas agora estão secas, mas porque estamos vivendo variações climáticas extremas e rápidas que confundem as plantas.

Trabalhando com práticas agrícolas regenerativas, identificamos várias estratégias eficazes de adaptação. Por exemplo, recomendamos aos produtores manter cafeeiros mais antigos em vez de substituí-los a cada 10 anos, pois as plantas mais velhas têm raízes mais profundas e são mais resilientes à absorção de umidade. Sugerimos padrões diversos de culturas de cobertura para reter umidade, reduzir a temperatura do solo e melhorar a saúde das plantas.

Estamos também identificando e sugerindo variedades de café mais resistentes à seca ou à umidade excessiva, conforme a região. Para áreas com ventos fortes, indicamos o plantio de árvores altas como quebra-ventos para reduzir a evaporação. Além disso, estamos introduzindo bioestimulantes e conduzindo análises químicas de pH e microelementos para otimizar as condições de cultivo.

Esse é um trabalho altamente específico, que depende das características únicas de cada plantação, como localização, tipo de solo e variedade de café. Estamos desenvolvendo soluções de adaptação climática que ajudem os cafeeiros Arábica a permanecerem vivos e férteis, mesmo diante das mudanças.

Olhando para o futuro, estamos explorando o uso da inteligência artificial na agricultura. Diferente dos processos industriais, em que a melhoria contínua ocorre diariamente, na agricultura cada safra começa do zero. Estamos coletando dados abrangentes de campos específicos usando sensores que monitoram condições climáticas, química do solo, saúde das plantas e qualidade dos grãos. Ao identificar correlações entre esses fatores, pretendemos ajudar os produtores a selecionar as melhores práticas para suas condições específicas, em vez de depender da tentativa e erro.

Passando para o lado do consumidor, experimentei recentemente seu café regenerativo do Brasil. Como vocês estão comunicando a importância da agricultura regenerativa aos consumidores, e como tem sido a receptividade?

Essa é uma questão crucial, pois se os consumidores não entenderem o que estamos fazendo, todo o nosso esforço será em vão. Quando nos tornamos B Corp, tivemos uma boa aceitação. E quando lançamos a lata de café regenerativo nas lojas, o sucesso foi ainda maior. Os consumidores comparam os produtos na prateleira, e nossas informações aprimoradas — incluindo QR codes com vídeos e explicações detalhadas — ajudam a transmitir de forma eficaz a história da sustentabilidade. Os QR codes oferecem informação completa de forma prática e são especialmente atraentes para os clientes mais jovens.

Neste ano, estamos promovendo a Seleção Arábica do Brasil no mercado HoReCa (Hotéis, Restaurantes e Catering) na Itália e no exterior. Um fato interessante é que, nos últimos nove anos, realizamos o Prêmio Internacional de Café Ernesto Illy em Nova York, reconhecendo os melhores cafés das nove origens do nosso blend (os mais adquiridos ao longo do ano).

Por sete anos, o Brasil nunca venceu. Em 2023, um produtor brasileiro certificado em práticas agrícolas regenerativas ganhou o prêmio. Em 2024, outro produtor brasileiro venceu novamente – desta vez, uma fazenda com práticas regenerativas, mas sem certificação, que atendeu aos nossos critérios de avaliação. Essa vitória consecutiva é significativa para o setor, pois o Brasil sempre foi visto como líder em quantidade, e agora está demonstrando liderança também em qualidade, desafiando outros países produtores a elevarem seus padrões.

Ao servir esse café em cafeterias e restaurantes, os baristas podem contar aos clientes que estão provando um café brasileiro premiado, cultivado de forma regenerativa. Isso cria uma narrativa envolvente e diferencia estabelecimentos que desejam destacar sua sustentabilidade. Embora o nosso blend da illy continue sendo o principal produto, com um processo de compra 100% sustentável, a Seleção Arábica oferece qualidade superior e sustentabilidade elevada para os consumidores que buscam essas características.

Acreditamos que transmitir conhecimento por meio do produto é uma forma eficaz de gerar valor para os clientes. Toda a cadeia de custódia é certificada pelo Regenagri, evitando qualquer risco de greenwashing e protegendo nossa reputação.

O sr mencionou estar trabalhando em práticas pré-competitivas e como o reconhecimento do café brasileiro despertou discussões no setor. Como estão colaborando com a indústria para disseminar práticas regenerativas de forma mais ampla?

Atualmente, apenas cerca de 0,2% das terras agrícolas são certificadas pelo Regenagri, o que é muito pouco. Estamos atuando de forma pré-competitiva com empresas como Nestlé, JDE Peet’s e Keurig Dr. Pepper (KDP), por meio da Global Coffee Platform, para desenvolver um protocolo de fazenda regenerativa chamado “Regncoffee”. Esse esforço colaborativo visa demonstrar que o cultivo adequado do café pode aumentar a sustentabilidade econômica, social e ambiental, ao mesmo tempo em que reforça a resiliência do mercado e o valor do produto.

Precisamos padronizar e definir um método comum para medir e avaliar se um produtor é verdadeiramente regenerativo. Como mencionei, a agricultura regenerativa não é um status estático, mas um processo de melhoria contínua. Ao ser certificado, o produtor precisa atingir uma pontuação mínima (de 65%) e, depois, aumentar esse percentual em reavaliações anuais, demonstrando progresso contínuo.

Um dos grandes desafios da indústria do café é sua estrutura: cerca de 30 mil produtores são responsáveis por apenas 20% da produção mundial de café, enquanto os outros 80% vêm de 12 milhões de pequenos agricultores com menos de dois hectares. Para impulsionar mudanças em escala, empresas como a Illy se comprometem a comprar café de produtores que adotam práticas regenerativas, garantindo mercado e preços premium. Isso assegura uma renda justa aos agricultores, essencial já que, por muitos anos, os preços de mercado ficaram abaixo dos custos de produção.

O doutor Illy também está liderando o desenvolvimento de um fundo de resiliência para o café, combinando recursos públicos e privados para apoiar pequenos produtores que muitas vezes vivem na pobreza e recebem apenas de 5% a 10% do valor total da cadeia do café. A filosofia é ajudar o elo mais fraco da cadeia, trabalhando não apenas com fornecedores diretos, mas com toda a cadeia de valor.

Adotamos essa abordagem com uma mentalidade de stakeholders, buscando soluções vantajosas para torrefadores, produtores e para o planeta. Essa postura pré-competitiva reflete nossa crença de que a sustentabilidade tática é um beco sem saída, enquanto o negócio é o que cria os recursos para buscar a verdadeira sustentabilidade – o que chamamos de “estado BC” (Benefit Corporation, B Corp, Negócio de Benefício, Colaborativo e de Benefício Comum).

Essa filosofia está enraizada na abordagem da Illy. Como empresa de benefício e B Corp, entendemos a importância de trabalhar lado a lado com os produtores em uma relação peer-to-peer, em vez da dinâmica tradicional cliente-fornecedor, baseada em exigências. Essa abordagem colaborativa se estende não só ao café verde, mas a todos os nossos processos de compras.



[Fonte Original]

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