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No início deste mês, após o anúncio das tarifas do “Dia da Libertação” feito pelo presidente Donald Trump — que apagou trilhões de dólares dos mercados globais de ações —, Elon Musk demonstrou sua insatisfação ao confrontar o conselheiro comercial linha-dura de Trump, Peter Navarro, e compartilhar no X um vídeo do economista pró-livre mercado Milton Friedman.
Kimbal Musk, irmão mais novo de Elon, de 53 anos, foi bem mais direto. Chamou Trump de “o presidente americano que mais aumentou impostos em gerações”. Criticou a “tarifa-imposto de Trump”, dizendo que ela encarecia produtos do dia a dia. Pediu a demissão de Navarro. Em um dos posts, Kimbal chegou até a questionar a inteligência de Trump.
Foi uma mudança e tanto de postura. Nos últimos meses, Kimbal parecia totalmente alinhado com a agenda de Trump, elogiando repetidamente o governo e os esforços de seu irmão em desmantelar agências federais como chefe do Departamento de Eficiência Governamental. Mas, até um ano atrás — antes de Elon declarar apoio a Trump e se tornar seu maior doador de campanha —, Kimbal dizia não ser apoiador do ex-presidente.
Dentro da Musktocracia: Os leais e visionários que enriqueceram ao lado de Musk
Com uma fortuna de US$ 363 bilhões (R$ 2,10 trilhões na cotação atual), Elon Musk é o homem mais rico da história. E há um grupo seleto — funcionários, investidores e seguidores — que enriqueceram junto com ele. Kimbal é um deles.
Seguir os passos de Elon tem sido lucrativo para Kimbal, um chef de formação que costuma ser fotografado com seu tradicional chapéu de caubói. Graças a pequenas participações nas duas maiores empresas do irmão — SpaceX e Tesla — Kimbal tem um patrimônio estimado em US$ 900 milhões (R$ 5,22 bilhões). No auge da Tesla, em dezembro, ele chegou a valer cerca de US$ 1,3 bilhão (R$ 5,8 bilhões).
Kimbal entrou para o conselho da Tesla em 2004, recebendo generosos pacotes de ações. Desde 2010, já vendeu US$ 262 milhões (R$ 1,5 bilhão) em ações da empresa, mas ainda mantém uma participação avaliada em US$ 380 milhões (R$ 2,2 bilhões). Ele também foi membro do conselho da SpaceX de 2002 até 2022; vendeu US$ 100 milhões (R$ 580 milhões) em ações da empresa no mercado secundário e seu restante vale cerca de US$ 200 milhões (R$ 1,16 bilhão), segundo estimativas da Forbes.
Kimbal faz parte da chamada Musktocracia, uma elite de centimilionários e bilionários que devem sua fortuna, em parte ou totalmente, a Elon Musk. Nela estão nomes como os investidores Marc Andreessen e Larry Ellison, além de conselheiros e primeiros funcionários das empresas de Elon.
Comparado ao irmão, os próprios empreendimentos de Kimbal tiveram bem menos sucesso. Embora ele não tenha comentado para essa reportagem (não respondeu aos pedidos de entrevista), a Forbes conversou com oito pessoas que trabalharam diretamente com ele nos últimos 20 anos. Descreveram Kimbal como alguém de personalidade tranquila, que prefere cozinhar a lidar com grandes negócios ou criar empresas de tecnologia — mas que sempre acaba sendo puxado para a órbita de Elon.
“Sempre pareceu que o Elon pisava no Kimbal, e que tudo o que o Kimbal queria era cozinhar”, disse uma pessoa que trabalhou com ele quando era CEO da OneRiot, uma startup de redes sociais, entre 2006 e 2010.
Essa pessoa lembra de um episódio em que Kimbal considerava demitir 10% da equipe de engenharia — aparentemente por sugestão de Elon — mas voltou atrás após receber críticas internas. “Ele não entendia como sistemas eram construídos. Não entendia de engenharia… Estava enlouquecendo as pessoas”, conta. “Ele só queria cozinhar.”
Da paixão pela cozinha à conexão com o poder
Essa paixão pela culinária levou Kimbal a fundar dois negócios na área. The Kitchen, um restaurante farm-to-table com sede em Boulder, foi inaugurado em 2004 e se expandiu para outras três cidades, com boas críticas da imprensa e do público. Em 2016, ele criou a Square Roots, uma empresa de agricultura urbana que cultiva vegetais em contêineres. Entre 2017 e 2022, levantou US$ 90 milhões em investimentos.
Entre os investidores estavam a Valor Equity — firma de private equity liderada por Antonio Gracias, amigo e apoiador de Elon — e a Craft Ventures, de David Sacks, investidor inicial da SpaceX e hoje membro do governo Trump como “czar” de cripto e IA. Apesar disso, a Square Roots teve pouco retorno: demitiu a maior parte da equipe em 2023, fechou várias unidades e anunciou uma mudança de modelo de negócio para “agricultura como serviço”.
O novo projeto de Kimbal, a Nova Sky Stories, que faz shows de drones com luzes, também se apoia nas conexões de Elon. Seu cliente mais notável é o fundo soberano do Catar, que anunciou em janeiro um contrato com a empresa para realizar apresentações no país pelos próximos dois anos. Esse mesmo fundo investe na X e na xAI, de Elon, e a Qatar Airways firmou recentemente parceria com a Starlink, sua empresa de internet via satélite. A Nova Sky também já prestou serviços para a Tesla, incluindo um show para promover os carros autônomos em outubro passado, além de eventos como a inauguração da Gigafactory em Austin e o lançamento da Cybertruck.
Uma infância na África do Sul e a aproximação com Elon
Na infância, na África do Sul dos anos 70 e 80, enquanto Elon lia ficção científica, Kimbal, 15 meses mais novo, já cultivava o gosto pela cozinha. Aos 11 anos, preparou seu primeiro prato: frango assado com batatas fritas.
“Minha mãe fazia pão integral, iogurte natural e abóbora cozida. Tipo, as coisas mais nojentas possíveis para uma criança”, lembrou Kimbal em entrevista ao podcast de Lex Fridman. “Então perguntei: ‘Posso cozinhar?’ E ela disse: ‘Claro, se quiser, pode cozinhar’.”
Cozinhar também lhe dava algo que ele valorizava: tempo em família à mesa.
“Foi quando percebi o poder disso: de todas as formas, essa era a única que me permitia ter conexão com minha família.”
Depois do ensino médio, mudou-se para Toronto com a mãe, a irmã e Elon. Na faculdade, seguiu os passos do irmão para a Queen’s University, em Ontario. Elon se transferiu dois anos depois para a Universidade da Pensilvânia, mas Kimbal ficou e se formou em administração em 1995. Ainda na faculdade, ajudou Elon a fundar a primeira startup: a Zip2.
Trabalhando em um pequeno escritório em Palo Alto, os dois dormiam no local, tomavam banho na YMCA e, segundo a biografia de Walter Isaacson, brigavam constantemente — até fisicamente. Em uma briga, Kimbal chegou a morder a mão de Elon e arrancar um pedaço de pele.
“Amo muito meu irmão, mas trabalhar com ele era difícil”, contou a Isaacson.
Eles venderam a Zip2 em 1999 por US$ 307 milhões. Kimbal recebeu US$ 15 milhões. Enquanto Elon fundava a X.com (que depois virou o PayPal), Kimbal se mudou para Nova York para estudar no French Culinary Institute. A rotina lembrava a série The Bear, com chefes gritando com os alunos.
“Tinha dias que eu pensava: ‘Não aguento mais’. Dizia aos meus amigos: ‘Tenho que ir para a escola de culinária ser gritado por seis ou sete horas seguidas’”, lembrou no podcast.
Sempre de volta à órbita de Elon
Mesmo após se formar, Kimbal voltou a se envolver com Elon, juntando-se à SpaceX. Jim Cantrell, um dos primeiros funcionários da empresa, lembra de sua presença nas primeiras reuniões do projeto Mars Oasis — um plano frustrado de enviar uma estufa a Marte.
“Ele aparecia muito. Elon meio que o via como um consigliere. Ele falava pouco, era quieto”, contou Cantrell.
Entre 2005 e 2008, Kimbal manteve um blog sobre os avanços da SpaceX e, às vezes, cozinhava para a equipe. “Ele não tinha um papel operacional no dia a dia”, disse um funcionário da época. Ainda assim, foi listado como executivo da empresa em documentos oficiais até 2022. Segundo especialistas, Elon pode ter feito isso como forma de garantir renda extra ao irmão.
Fracassos, lealdade e o verdadeiro amor: a comida
Ao mesmo tempo, Kimbal se tornou investidor e CEO da startup Me.dium, depois renomeada como OneRiot — que acabou sendo vendida em 2011 para o Walmart em um “leilão de liquidação”.
“Os investidores não lucraram nada”, disse uma fonte. O próprio Kimbal reconheceu o erro: “Era como mastigar serragem todo dia.”
Em 2008, quando a Tesla enfrentava dificuldades, Elon pediu ajuda a Kimbal, que vendeu US$ 375 mil (R$ 2,17 milhões) em ações da Apple e investiu na montadora.
Mas, em meio a tudo isso, Kimbal nunca abandonou sua verdadeira paixão: a The Kitchen. Em 2010, fundou o braço social do restaurante, o Big Green, para levar alimentação saudável a crianças. Desde então, o restaurante cresceu e chegou a outras cidades.
“Tive uma ótima experiência com o Kimbal. Aprendi muito”, disse Chapin Rebbe, gerente executivo da The Kitchen entre 2020 e 2024. “Ele era bem envolvido. Conversávamos toda semana.”
Mesmo entre aqueles que criticam sua capacidade como empresário, todos disseram algo parecido: Kimbal é um cara legal, querido por todos. Mas, segundo um ex-funcionário da OneRiot, ele nunca confrontaria Elon — nem mesmo em privado.
“Se a situação ficava complicada, ele não era quem entrava para resolver. Era tipo a Suíça. Tinha o poder para fazer algo, mas só ficava lá, parado.”