Ações, dólar e títulos americanos despencaram, em uma ampla retirada de dinheiro do país. O índice S&P fechou em baixa de 2,36%, o Nasdaq caiu 2,55%, e o Dow Jones perdeu 2,48%. O DXY, indicador que mede o desempenho da moeda americana em relação a uma cesta das seis principais divisas estrangeiras, caiu 1% e chegou ao nível mais baixo desde 2022, com investidores correndo para euro, franco suíço e libra — sinal de declínio da confiança nos EUA. A moeda europeia está no nível mais alto em relação ao dólar em mais de três anos.
Investidores voltaram a fugir de títulos do Tesouro americano e cobraram juros mais altos para adquirir papéis de prazo mais longo. E o ouro, visto como refúgio, subiu mais 3,16% e bateu um novo recorde: US$ 3.435 a onça troy (31,1g). No ano, a valorização do metal é de 29%.
No Brasil, os mercados não abriram por causa do feriado de Tiradentes.
— Se Powell for demitido haverá uma enorme injeção de volatilidade nos mercados financeiros e a mais dramática fuga de ativos dos EUA que se pode imaginar. Não só a independência do Fed estará claramente sob ameaça, como a perspectiva de desdolarização e afastamento da hegemonia dos EUA será cada vez mais realista — disse Michael Brown, estrategista sênior da corretora Pepperstone.
Trump tem criticado Powell repetidamente e sugere ter autoridade para destituí-lo, o que é contestado pelo próprio Powell e por especialistas. Na semana passada, o republicano lançou uma rajada de críticas contra o presidente do Fed por “não cortar os juros com rapidez suficiente” após o Banco Central Europeu reduzir sua taxa básica em 0,25 ponto percentual, para 2,25%: “Se eu quiser tirá-lo, ele sai rapidinho, pode acreditar,” disse Trump.
Em um discurso, Powell afirmou que o Fed precisa observar a dinâmica da economia e os possíveis efeitos inflacionários persistentes e recessivos do tarifaço. E disse “esperará por maior clareza antes de considerar qualquer ajuste na política monetária,”
Pesquisa global de gestores do Bank of America mostrou o maior número registrado de investidores globais que planejam diminuir suas participações em ações dos EUA desde que a coleta de dados começou, em 2001: 73% dos entrevistados disseram acreditar que o excepcionalismo dos EUA atingiu o pico.
São crescentes as preocupações sobre o futuro econômico do país após o tarifaço.
— Mesmo que haja uma redução (das tarifas) a partir daqui, o estrago já está feito. Não há como colocar o gênio de volta na lâmpada — diz Arun Sai, estrategista sênior da Pictet Asset Management.
“Se as tarifas pesarem sobre as margens de lucro das empresas americanas e sobre a renda real dos consumidores americanos, como acreditamos que acontecerá, elas podem corroer a excepcionalidade e, por sua vez, romper o pilar central da força do dólar”, afirmaram analistas do Goldman Sachs em relatório.
—A fuga do dólar decorre de preocupações com a independência do Fed e da falta de anúncios de acordos comerciais — afirmou Thierry Wizman, estrategista global da Macquarie Global Service. (Com Bloomberg News e agências)
O quadro de crise se instalou após Trump afirmar, na plataforma Truth Social, que não há “praticamente” nenhuma inflação e que era hora de “cortes preventivos” nos juros, reforçando suas críticas ao Fed.
A última leitura do principal indicador de inflação acompanhado pelo banco central americano continua acima da meta perseguida pela autoridade monetária. A divulgação de uma nova leitura está prevista para a próxima semana.
O medo vem sendo ecoado por elites dos fundos de hedge, dedicados a oferecer investimentos que ofereçam proteção contra a volatilidade dos ativos de mercado. Paul Singer, fundador da Elliott Investment Management, alertou recentemente em um evento privado em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos, que o dólar dos EUA pode perder seu status de moeda de reserva, segundo pessoas presentes.
Repreender o Fed corre o risco de politizar a política monetária dos EUA de uma forma que os mercados acham profundamente perturbadora, disse Christopher Wong, estrategista de câmbio do Oversea-Chinese Banking Corp.
— Francamente, demitir Powell beira o inacreditável — disse Wong. — Se a credibilidade do Fed for posta em dúvida, isso pode corroer gravemente a confiança no dólar.
Juristas afirmam que um presidente não pode demitir o presidente do Fed facilmente, e Powell já afirmou anteriormente que não renunciaria se fosse pressionado por Trump.
O peso da guerra comercial
A ofensiva tarifária de Trump também tem sido um peso para os mercados dos EUA em meio a preocupações com uma possível recessão. Um ETF amplamente acompanhado que acompanha o S&P 500 é o segundo pior desempenho entre 45 produtos específicos por país desde o início do segundo mandato de Trump, segundo o Bespoke Investment Group. O SPDR S&P 500 ETF Trust caiu cerca de 15% nesse período, enquanto um ETF da BlackRock que acompanha o mercado de ações alemão subiu 11%.
As vendas desta segunda ocorreram em meio a um volume fraco — cerca de 20% abaixo da média recente — devido ao feriado da Páscoa e à temporada de resultados corporativos ainda em andamento, com investidores buscando pistas sobre o futuro da economia. Os mercados de ações da Europa estavam, em sua maioria, fechados por causa do feriado.
Isso contrastou com sessões anteriores neste mês, quando várias quedas do S&P 500 ocorreram com volumes recordes de negociação.
“A economia global está sendo abalada por uma guerra comercial iniciada pelos EUA, o que acreditamos gerar um choque econômico suficientemente grande para ameaçar a continuidade da expansão” da economia, escreveu, em relatório, Bruce Kasman, economista-chefe do JPMorgan Chase. “Embora indiquemos um risco maior de recessão global, também enfatizamos que esse resultado provavelmente não se concretize imediatamente.”
O petróleo WTI, preço de referência no Golfo do México, caiu mais de 2%, abaixo de US$ 64 o barril.
Em um sinal de que investidores estão migrando seus investimentos para fora dos EUA, o Deutsche Bank AG informou que clientes chineses reduziram suas participações em Treasuries, como são chamados os títulos públicos americanos, preferindo dívida europeia.
Títulos europeus de alta qualidade, títulos do governo japonês e ouro devem ser as principais alternativas aos Treasuries, segundo Lillian Tao, chefe de macroeconomia da China e vendas de mercados emergentes globais no banco.