O ano de 2024 foi marcado por eventos climáticos extremos e entrou para a História como o mais quente já registrado, segundo a Organização Meteorológica Mundial. Nesse período, o Brasil enfrentou a pior seca desde 1950, que atingiu Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais e São Paulo. Outras localidades, em especial o Rio Grande do Sul, enfrentaram as consequências do excesso de chuva.
Não é de surpreender que, além dos danos causados à vida e ao bem-estar de quem vive nessas áreas, o agronegócio também tenha sentido o revés. A safra de grãos, leguminosas e oleaginosas apresentou queda de 7,2% em 2024 em relação ao ano anterior, segundo o IBGE.
Esses números e recordes evidenciam o óbvio: clima e agronegócio estão intrinsecamente relacionados. A floresta é um ativo que precisa entrar na equação como fator que favorece a produção e atua como vacina contra as mudanças climáticas. Mas, assim como o agronegócio é vítima dos eventos climáticos, ele também pode participar de forma significativa no enfrentamento da crise.
É preciso transformar os sistemas alimentares, avaliando-os sob diferentes critérios, como seu papel para o desenvolvimento socioeconômico — da geração de emprego e renda à inclusão social — e sua contribuição para o meio ambiente, como a redução das emissões de gases de efeito estufa, a regeneração de solos e a proteção da biodiversidade. Essa trajetória demanda planejamento de longo prazo de governos e o envolvimento efetivo do setor privado, proporcionando investimentos conjuntos e a criação de um ecossistema de inovação tecnológica.
O Brasil tem tudo para ser referência mundial na transição de sua produção agropecuária, uma vez que já desenvolveu modelos capazes de aumentar a produtividade e, ao mesmo tempo, benéficos à agenda climática.
Essa jornada foi construída a partir de uma diversidade de planos, políticas e instrumentos que incidem sobre a produção agropecuária e seu território rural. Entre eles estão o Plano Safra, o Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa, o Plano Nacional de Identificação Individual de Bovinos e a plataforma AgroBrasil+Sustentável, além dos planos de combate ao desmatamento nos biomas, o Plano de Transformação Ecológica e o Plano Clima. Em âmbito privado, existem múltiplas iniciativas de empresas, produtores e sociedade civil já em curso.
Todas essas ações endereçam questões críticas para a produção, como investimentos, melhoria de produtividade, restauração florestal e controle da ilegalidade. O que falta, talvez, seja um olhar estratégico, capaz de dar coerência às políticas públicas, identificar gargalos e lacunas e promover sinergias e coordenação com as ações privadas.
Planos e políticas muitas vezes acontecem em paralelo, sem que exista um mínimo de interação e coordenação dentro do próprio governo, e sua continuidade está sempre à mercê de ciclos políticos.
Se esse olhar estratégico não é construído dentro da estrutura pública, torna-se necessário que a sociedade cobre esse nexo e uma visão de longo prazo que possa dar clareza a todos os atores interessados na transformação de nossa produção de alimentos e, assim, permitir que um ambiente de colaboração e engajamento prospere.
André Guimarães é diretor executivo do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia, Fernando Sampaio é diretor de sustentabilidade da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes. Ambos são integrantes do Grupo Estratégico da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura