A Argentina vendeu ontem US$ 1 bilhão em bônus denominados em pesos para investidores estrangeiros, os recursos ajudarão a reforçar as reservas do banco central um mês depois que o governo do presidente Javier Milei suspendeu a maioria dos controles cambiais. Os Bonte para 2030 foram colocados pagando um cupom (juro nominal) de 29,5%, bem acima da taxa esperada pelos bancos locais, entre 22% e 23%, uma indicação de incerteza ainda elevada do mercado com relação à Argentina.
A demanda total pela emissão foi de US$ 1,694 bilhão, com propostas de 146 investidores externos. O ministro da Economia da Argentina, Luis Caputo, afirmou que o leilão representa o “retorno da Argentina ao acesso ao mercado internacional” após sete anos de ausência e uma reestruturação, em 2020, que elevou os custos dos empréstimos, embora título seja em pesos — ou seja o investidor receberá em pesos e não em dólar — e não tenha sido emitido sob uma jurisdição estrangeira.
Mesmo assim, muitos analistas disseram que o leilão de ontem demonstrou um maior apetite pela dívida argentina.
“A taxa ficou acima do esperado, considerando que se trata de um título de cinco anos — ele vence em 2030 — e a expectativa é de menor inflação”, disse Kevin Sijniensky, analista da consultoria Econviews. “Avaliamos que houve boa demanda e esperamos novas emissões deste tipo nos próximos leilões de títulos do Tesouro. Para este momento, esta foi a alternativa encontrada pelo governo para aumentar suas reservas internacionais sem intervir na banda de flutuação do dólar. Mas foi uma solução cara, sim”, afirmou.
“Aparentemente, os investidores internacionais têm depositado muita fé na política econômica do presidente Javier Milei”, disse Dante Moreno, analista econômico da consultoria EPyCA. “Mas se ele não atingir seu objetivo político nas eleições legislativas de outubro, que é o de aumentar sua base de apoio conquistando mais cadeiras de deputados e senadores, as dúvidas sobre a capacidade de manter sua agenda devem aumentar, reduzindo perspectivas econômicas e financeiras”, acrescentou ele.
“O governo avaliou que poderia passar em um teste de reentrada no mercado internacional de dívida com esta emissão, de até US$ 1 bilhão, um valor limitado”, observou Moreno. “E há a necessidade de arrecadar dólares para cumprir com uma das condições do Fundo Monetário Internacional [FMI], de acumular reservas em dólares além de empréstimos de entidades internacionais”, afirmou.
Os investidores estrangeiros, porém, ainda têm dúvidas sobre se a política cambial de Milei, que fortaleceu significativamente o peso em termos reais no ano passado, levará à acumulação sustentável de reservas em moeda estrangeira pelo banco central — necessárias para pagar o serviço da dívida até que a Argentina possa retornar de fato aos mercados de capitais internacionais.
“Em cinco anos, não sabemos qual será o regime monetário”, disse Christine Reed, gestora de fundos de dívida de mercados emergentes da Ninety One. Em dois anos, haverá eleição presidencial e muitas das mudanças feitas pelo governo Milei foram implementadas por decretos. Essas mudanças podem ser facilmente desfeitas em outro governo, acrescentou ela.