Os resultados de primeiro trimestre das companhias de capital aberto superaram as expectativas do mercado, impulsionados por uma atividade econômica ainda aquecida no Brasil, que ajudou empresas domésticas, e uma recuperação maior que a esperada das exportadoras. No entanto, os custos continuam fazendo sombra e apertando as margens das companhias.
Levantamento do Valor Data com 387 empresas não financeiras mostra que o lucro líquido consolidado subiu 30,3% no primeiro trimestre, para R$ 57,2 bilhões, enquanto as receitas de vendas e serviços avançaram 13,9%, para R$ 976,7 bilhões. Mas os custos aumentaram mais, 14,8%, para R$ 728,4 bilhões.
“A percepção que temos da temporada é que ela foi boa. Existia um medo de que a economia brasileira estava desacelerando e isso poderia comprometer os resultados, mas não foi isso o que se viu”, afirma Fernando Ferreira, estrategista-chefe da XP, ao Valor. Houve crescimento nos principais indicadores, tanto do ponto de vista anual quanto sobre o quarto trimestre de 2024.
Os analistas costumam dizer que há várias formas de se analisar os resultados das empresas, e uma das favoritas do mercado é ponderar as expectativas para a temporada. “A barra estava bem baixa, só 8% dos investidores do ‘buy side’ [gestores de recursos] que ouvimos esperavam uma temporada positiva e 29%, que não haveria mudança em estimativas”, diz Daniel Gewehr, chefe de pesquisa do Itaú BBA.
No levantamento do Valor Data, as companhias que atuam no mercado interno tiveram alta de 10,8% no lucro, enquanto as receitas aumentaram 10,4% e os custos subiram 10,1%. Nas exportadoras, o lucro teve expansão de 130,9%, o faturamento avançou 18,1% e os custos, 19,1%.
A grande surpresa da safra de resultados dos primeiros três meses do ano veio das companhias de varejo, setor doméstico muito correlacionado ao desempenho da economia, que mostraram números resilientes de consumo mesmo com o ambiente de juros altos e um período sazonalmente mais fraco por causa da “ressaca” das festas de fim de ano.
“Metade das empresas de varejo sob nossa cobertura teve resultado forte”, diz Carlos Eduardo Sequeira, chefe de pesquisa do BTG Pactual. “Nós não esperávamos essa força do varejo, nossa exposição no setor era pequena porque achávamos que a temporada não seria nada de mais e acabou sendo o setor que mais surpreendeu no trimestre.”
As companhias exportadoras de matérias-primas também apresentaram bons números trimestrais, mesmo que Petrobras e Vale tenham ficado um pouco abaixo do que esperava o mercado, sustentadas principalmente por uma estabilidade sequencial nos preços dos produtos e também por efeitos contábeis na dívida, advindos do câmbio favorável no período.
“Parte da explicação é que as expectativas para as exportadoras já tinham sido bastante reduzidas, após o quarto trimestre sentir efeitos daquela turbulência que tivemos nos juros e câmbio no fim do ano e alguns dos fatores que estão afetando hoje o cenário global, como menor cotação do petróleo, só acelerou em abril”, diz Ferreira, da XP.
Apesar de os resultados terem superado expectativas do mercado, a margem bruta mostrou deterioração sequencial trimestre a trimestre. Os analistas afirmam que o avanço da inflação é uma das causas desse movimento e um tema que continuará chamando a atenção do mercado ao longo deste ano por conta da atividade econômica resiliente.
“Essa tendência da resiliência da economia doméstica, pelo o que temos ouvido, não dá sinais de desaceleração, o que obviamente traz um desafio para o Banco Central”, diz Ferreira. Ele acredita que isso pode influenciar o desempenho dos resultados das companhias ao longo do ano.
“Os comentários dos executivos continuaram positivos, de uma maneira geral eles se mantêm razoavelmente otimistas”, diz Sequeira, do BTG. “Ainda estamos vendo uma economia bastante aquecida, há a expectativa de desaceleração ao longo do ano, mas pode ser um movimento menos intenso do que o mercado esperava no início de 2025.”
“É difícil falar o que vai acontecer nos próximos meses, mas temos visto uma maior estabilidade cambial, o ciclo de alta nos juros parece ter terminado, ainda vemos um consumo bem resiliente”, diz Daniel Gewehr, do Itaú BBA. “O sentimento dos executivos nas teleconferências de resultados melhorou em nosso levantamento, houve piora mesmo somente entre as exportadoras de commodities.”
Os analistas afirmam que os resultados acima do esperado no primeiro trimestre ajudaram no fluxo positivo de recursos que entra no Brasil nas últimas semanas, impulsionando o Ibovespa para patamares recorde. Eles notam que há uma rotação de carteiras favorecendo mercados emergentes em meio às incertezas da economia e das tarifas dos Estados Unidos.
“Acreditamos que vamos ver uma revisão para cima nas estimativas das empresas pelo consenso do mercado, principalmente agora com uma perspectiva de custo de capital mais baixo no ano”, diz Gewehr. No caso das exportadoras de commodities, no entanto, as expectativas são mais cautelosas para o Itaú BBA, uma vez que as companhias dependem de fatores do mercado externo.
“O governo tem feito esforços para manter a atividade econômica mais animada, com o empréstimo atrelado aos consignados, o Pé de Meia, resíduos de FGTS, entre outras iniciativas, o que pode fazer com que a economia desacelere menos rápido”, afirma Sequeira. “A intensidade dessa desaceleração é que fica difícil de definir, mas os juros alguma hora vão bater na economia real.”