Crédito, John Thompson
- Author, Charlie Jones
- Role, BBC News
James Hunt costumava passar os dias viajando a Londres, onde era coordenador de uma grande empresa de marketing.
Mas seus filhos, Jude e Tommy, foram diagnosticados com autismo quando eram pequenos e, desde então, ele cuida deles e dos pais em tempo integral.
James começou a escrever um blog sobre a vida da família há nove anos e agora tem mais de um milhão de seguidores nas redes sociais.
Nesta reportagem, ele conta sobre essa experiência e diz o que espera para o futuro dos filhos, que são adolescentes.
‘Tinha muito mais perguntas do que respostas’

Crédito, James Hunt
Quando meu filho mais velho, Jude, era bebê, ele engatinhava lentamente e não respondia quando lhe chamávamos pelo nome. Ele costumava olhar pela janela e parecia bastante distante. Era como se estivesse em outro mundo.
A mãe dele, Charlotte, minha ex-mulher, me falou das suas preocupações pela primeira vez quando ele tinha oito meses, mas eu pensei que ele estava um pouco atrasado por ter nascido prematuro.
Fomos ao médico várias vezes, até que em 2009 ele foi diagnosticado com autismo, quando tinha 18 meses.
Naquela época, a informação disponível era muito clínica; a maioria das coisas que líamos era do site do serviço de saúde britânico (NHS, sigla em inglês) e de revistas médicas. A gente não entendia direito o que estava escrito e tinha muito mais perguntas do que respostas.
Três anos depois, Tommy também foi diagnosticado com autismo, praticamente na mesma idade que o irmão.
A gente já sabia muito mais sobre autismo do que quando o Jude nasceu, mas eles eram crianças muito diferentes.
Não aproveitei tanto o primeiro ano de vida do Tommy porque passava grande parte do tempo o observando e buscando sinais.
Ele atingiu certos marcos muito mais rápido que o Jude, mas não fazia contato visual, se frustrava facilmente e gostava de brincar sozinho.
Na mesma época, Jude tinha quatro anos e começou a ter muitas crises e a se machucar fisicamente.
Jude não fala, o que tornava ainda mais difícil para ele explicar o que estava sentindo. Esse foi o período mais difícil da minha vida.
Ele costumava acordar à noite gritando e se batendo. Felizmente, à medida que Jude ficou mais velho, e aprendemos a atender às necessidades dele, a situação melhorou muito.
‘Decidimos separar as crianças’

Crédito, James Hunt
Infelizmente Tommy era um grande gatilho para Jude, por ser uma criança barulhenta e imprevisível. Ele se assustava com a automutilação e, em muitas situações, tínhamos que mantê-los longe um do outro.
Em 2016, minha esposa e eu tomamos uma decisão difícil: separar Jude e Tommy.
Nos sentimos culpados, como se estivéssemos fracassando. Mas, imediatamente após a separação, Jude se tornou uma criança diferente. Podíamos sentir que ele estava menos ansioso e soubemos, então, que aquela era a decisão certa.

Crédito, James Hunt
Atualmente, moro em um anexo à casa dos meus pais e ajudo a cuidar do meu pai, que tem Párkinson, e da minha mãe, que tem demência, mas que hoje vive em uma casa de repouso.
Na frente da casa mora minha ex-mulher, o que torna mais fácil para a gente cuidar das crianças. Eu fico com um dos meninos algumas noites da semana e depois a gente troca, e eu fico com o outro. Os dois precisam de cuidados individuais e é impossível para eles morarem juntos.
Nunca imaginei viver assim. Não sei se algum dia eles vão conseguir viver juntos, mas sei que eles sempre farão parte da vida um do outro.
Gostaria de estar com os dois ao mesmo tempo, mas não tenho muito tempo livre. Neste momento, essa é a melhor opção para eles.
A escola deles tem nos ajudado a fazer com que eles se divirtam mais juntos.

Crédito, John Thompson
Jude tem 16 anos e gosta de música e de fazer viagens longas de carro escutando a rádio. É um dos poucos lugares que se sente seguro e consegue relaxar.
Teve situações que ele ficou muito ansioso para viajar e a gente acabou ficando em casa, mas hoje ele está bem.
Tommy tem três anos e é travesso, divertido e tem curiosidade por tudo que o cerca. Gosta de folhear livros e de quebra-cabeças. Não é de falar muito, mas usa um dispositivo de comunicação.
Faz pouco tempo que tive um dos melhores dias da minha vida com Jude e Tommy.
Nas últimas vezes que tentamos fazer algo para celebrar o Natal, nada deu certo e foi muito trabalhoso para eles. Mas ano passado foi diferente. Fomos ver o Papai Noel e pudemos criar muitas memórias especiais.

Crédito, James Hunt
Faz nove anos desde que comecei a compartilhar histórias das nossas vidas na internet, em um blog semanal. Depois abri uma conta no Facebook, Instagram e TikTok.
No início, era uma forma de mostrar aos meus amigos e à família como nossa vida realmente era. Jude e Tommy tinham dificuldade de ir a eventos sociais, então paramos de ir.
Nunca consegui encontrar palavras para explicar e queria mostrar o orgulho que sentia deles, por isso, comecei a escrever.
Nunca imaginei o quanto essas palavras ressoariam em outras histórias e o quanto isso me ajudaria.
Aprendi muito mais sobre autismo e me conectei com pessoas do mundo. Descobri uma paixão em ajudar outras famílias.
Tenho tido sorte de poder ganhar a vida através das redes sociais. Tive que deixar meu trabalho anterior para cuidar dos meus meninos.
No ano passado, comecei uma linha de roupas com mensagens positivas sobre autismo, deficiências e neurodivergência. Adoro receber mensagens de pessoas que contam ter visto alguém usando um dos moletons e que isso deu início a uma conversa.
Abri uma loja em Burnham-on-Crouch, no leste da Inglaterra, onde fazemos as roupas, empacotamos e enviamos os pedidos.
É um lugar que as pessoas podem visitar, temos uma sala sensorial na loja, e muitos pais vêm aqui para conversar um pouco.
Todas as pessoas que trabalham na loja são pais, cuidadores ou pessoas autistas, para que possam compartilhar suas experiências com os clientes.
‘Aprendi a valorizar as coisas simples da vida’

Crédito, James Hunt
Tenho buscado me concentrar nas coisas positivas e não pensar tanto no futuro, mas às vezes é muito difícil.
Vai ser um grande desafio quando eles deixarem a escola aos 19 anos.
Isso me dá muito medo, porque vou ter que confiar em um grupo de pessoas totalmente novo.
Espero que eles possam frequentar uma universidade de meio-período, mas isso é uma grande incógnita e decisões importantes precisarão ser tomadas.
Sinto que preciso viver para sempre para cuidar deles, e esse é o maior medo da maioria dos pais. Jude e Tommy vão precisar de apoio à vida toda, mas comecei a perceber que nem sempre vou ser capaz de fornecer isso a eles.
Não sei como será o futuro, mas tenho que pensar em como ajudá-los a viver de forma mais independente possível e prepará-los para quando eu não estiver mais aqui.
O autismo fez com que passássemos por altos e baixos que jamais imaginei.
Isso tem me ensinado a apreciar e aproveitar as coisas simples da vida, e eu só quero que as crianças sejam felizes.
Quando me lembro como se senti quando eles foram diagnosticados, gostaria de ter dito a mim mesmo que tudo ficaria bem.
Os primeiros anos podem ser assustadores. Você sente que não sabe o que está fazendo. Não guarde tudo para você, encontre pessoas com quem possa se abrir. Seus amigos e familiares querem te ajudar, mas ainda não sabem como.
Você passará pelos dias mais desafiadores e difíceis da sua vida, mas vai aprender muito com seus filhos, e seu amor por eles o ajudará a superá-los.