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O ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, entregou o cargo nesta sexta-feira (2/5). Esta é a 11ª troca de ministros no governo Lula desde o início do atual mandato, em janeiro de 2023.
“Tomo esta decisão com a certeza de que meu nome não foi citado em nenhum momento nas investigações em curso, que apuram possíveis irregularidades no INSS. Faço questão de destacar que todas as apurações foram apoiadas, desde o início, por todas as áreas da Previdência, por mim e pelos órgãos de controle do governo Lula”, publicou no X.
“Espero que as investigações sigam seu curso natural, identifiquem os responsáveis e punam, com rigor, aqueles que usaram suas funções para prejudicar o povo trabalhador.”
Embora não haja indícios de sua participação direta, ele passou a ser pressionado politicamente — o presidente Luiz Inácio Lula da Silva estaria insatisfeito com como reagiu à crise.
O Planalto divulgou nota sobre a demissão logo após Lupi ter se manifestado.
“O presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebeu, na tarde desta sexta-feira, 2 de maio, o pedido de demissão do ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, durante audiência no Palácio do Planalto. O presidente convidou o ex-deputado federal Wolney Queiroz, atual secretário-executivo da Previdência, para ocupar o cargo de ministro. A exoneração de Lupi e a nomeação de Wolney serão publicadas ainda hoje em edição extra do Diário Oficial da União.”
No dia 23 de abril, o então presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, foi demitido a pedido de Lula após se tornar alvo de uma operação da Polícia Federal (PF) e da Controladoria-Geral da União (CGU). Stefanutto havia sido indicado ao cargo por Lupi em julho de 2023.
A investigação apura um esquema de descontos indevidos em aposentadorias e pensões entre 2019 e 2024. Estima-se que os valores descontados somem R$ 6,3 bilhões, mas ainda não está claro quanto desse montante foi obtido ilegalmente.
Segundo pesquisa da AtlasIntel divulgada na quinta-feira (1/5), 85,3% dos brasileiros acreditavam que Lula deveria demitir Lupi após as denúncias de fraudes no INSS.

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Na quarta-feira (30/4), deputados de oposição protocolaram um pedido de abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Câmara. Para ser aberta, o pedido precisa ser deferido pelo presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), que ainda não se manifestou sobre o assunto.
Lupi é presidente licenciado do PDT, partido que comanda desde junho de 2004, após a morte de Leonel Brizola.
Ao longo da carreira, foi ministro do Trabalho e Emprego, secretário de Transportes da Prefeitura do Rio de Janeiro, deputado federal e primeiro suplente do senador Saturnino Braga. Também integrou o Conselho de Administração do BNDES, presidiu os conselhos curadores do FAT e do FGTS e atualmente é membro do Conselho de Administração da multinacional Tupy S.A.
Guerra de narrativas
Segundo a PF e a CGU, aposentados e pensionistas do INSS eram vítimas de um esquema de descontos indevidos em seus benefícios. As cobranças, feitas por associações e sindicatos, muitas vezes ocorreram sem a autorização dos segurados.
Esses descontos ocorrem de maneira legal quando os aposentados aceitam se associar a alguma instituição em troca de benefícios, como serviços médicos e atividades de lazer.
Mas, segundo as investigações, tanto associações reais como instituições de fachada criadas há pouco tempo passaram a incluir entre seus associados milhares de aposentados sem seu consentimento.

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Investigações passadas do Ministério Público já apuraram descontos indevidos em 2018 e 2019, ainda nos governos de Michel Temer (MDB) e de Jair Bolsonaro (PL), mas em escala menor do que a observada na fraude revelada agora.
Na guerra de narrativas, autoridades da gestão petista e parlamentares governistas enfatizam que, segundo a CGU e a PF, o esquema teve início em anos anteriores ao mandato de Lula (2023-2026) e argumentam que apenas no atual governo o esquema foi investigado e interrompido.
“O esquema que visava fraudar o INSS foi implementado durante o governo Bolsonaro. A maioria das entidades suspeitas surgiu entre os governos Temer e Bolsonaro. A única gestão que topou investigar e desmantelou a rede foi a do presidente Lula. Entendeu ou quer que eu desenhe?”, postou o senador Humberto Costa (PT-PE) na rede social X.
Em suas falas, o lado petista deixa de citar que o volume desviado cresceu fortemente a partir de 2023 e que a diretoria do INSS deixou de adotar medidas efetivas para interromper os descontos, segundo a própria CGU.
Já parlamentares ligados a Bolsonaro buscam associar o escândalo apenas à gestão Lula e já protocolaram na Câmara de Deputados um pedido de abertura de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar o esquema. Sua instalação, porém, depende do aval do presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB).
“Onde tem escândalo, pode apostar que tem a digital do PT. Mensalão. Petrolão. Escândalo da Eletrobras. Fundos de pensão. Correios. E agora, um esquema bilionário de cobrança indevida no INSS, que chega a R$ 6,3 bilhões. Não, isso não é coincidência. É modus operandi”, disse o líder da oposição na Câmara, Luciano Zucco (PL-RS), na rede social X.

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O que a oposição não aponta é que, segundo a CGU, a maioria das instituições suspeitas de envolvimento no esquema foram autorizadas a aplicar os descontos nas aposentadorias em convênios realizados com o INSS no governo anterior.
Por outro lado, bolsonaristas destacam o fato de uma das instituições suspeitas, o Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos (Sindnapi), ter como vice-presidente o irmão de Lula, José Ferreira da Silva, o Frei Chico, embora ele não tenha sido alvo da operação da PF.
O Sindnapi nega qualquer ilícito e diz que denunciou ao ministro da Previdência Social, Carlos Lupi (PDT), os indícios de ilegalidade nos descontos associativos em junho de 2023, durante reunião do Conselho Nacional da Previdência Social.
Ata do encontro obtida pelo Jornal Nacional confirma que a denúncia foi feita pela então conselheira Tonia Galleti, coordenadora do Departamento Jurídico do Sindnapi.
Questionado sobre essa denúncia pelo jornal O Globo, Lupi disse que, como a conselheira, outras pessoas também o avisaram sobre a existência de denúncias, mas era preciso ter “fatos concretos para serem investigados”.
Valores descontados dispararam no governo Lula
Os indícios de fraude foram identificados pela CGU devido ao forte aumento de cobranças e reclamações, que começaram a subir em 2022 e depois saltaram fortemente a partir de 2023.
Segundo um relatório da controladoria produzido em setembro de 2024, mas divulgado apenas agora, o valor anual médio descontado pelas associações entre 2016 e 2021 ficou em R$ 523,8 milhões, sendo o maior valor desse período registrado em 2018 (R$ 617 milhões).
Em 2022, último ano do governo Bolsonaro, houve uma primeira alta mais expressiva, quando os descontos somaram R$ 706,2 milhões, aumento de 32% ante 2021 (R$ 536,3 milhões).
Depois disso, o crescimento se acelerou no governpo Lula, atingindo R$ 1,3 bilhão em 2023, aumento de 84%.
O relatório projetava que em 2024 os descontos chegariam a R$ 2,6 bilhões, dobrando em um ano.
O relatório da CGU acusa o INSS de não tomar medidas eficazes para interromper os descontos ilegais.