Crédito, Dan Kitwood/Getty Images
- Author, Lisa Forsberg
- Role, The Conversation*
A secretária de Justiça do Reino Unido, Shabana Mahmood, está estudando uma possível “implementação nacional” da castração química para criminosos sexuais. Este procedimento reduz os níveis de testosterona com a intenção de reduzir a libido.
A proposta é uma das recomendações apresentadas na recente revisão independente sobre condenações que foi encomendada para investigar a superlotação das prisões e considerar alternativas ao encarceramento.
A análise constatou que 21% dos adultos que cumprem pena atrás das grades foram condenados por crimes sexuais, o que os torna uma proporção significativa da população carcerária. A ideia parece ser a de que a castração química tornaria a libertação dos infratores da prisão menos perigosa para a população.
Um programa piloto de castração química voluntária já está em andamento — e prestes a ser ampliado para 20 prisões britânicas. Mas, embora a revisão tenha enfatizado que o consentimento é um princípio fundamental da legislação médica, Mahmood estaria investigando se a castração química pode ser obrigatória. Isso levanta importantes questões éticas e jurídicas.
A castração química é ética?
A castração química é uma intervenção com dupla finalidade. Ela pode ser usada tanto para beneficiar aqueles que recebem substâncias redutoras de testosterona — os agressores sexuais podem achar que seus desejos sexuais são um problema, e querer, portanto, ter sua intensidade reduzida por meios médicos —, quanto para proteger a população.
Uma questão fundamental, então, é o que pretendemos alcançar com um programa de castração química na população carcerária. A castração química pode reduzir o risco de reincidência, mas não melhorar a vida de um agressor sexual. E pode fazer o oposto — melhorar seu bem-estar sem proteger o público de suas ações. Qual é o objetivo que estamos buscando?
Isso é importante porque a legitimidade ética da castração química está diretamente relacionada à sua finalidade. As intervenções médicas padrão são normalmente admissíveis do ponto de vista ético quando — e porque — se espera que elas beneficiem os receptores que consentem de forma considerada válida.
Se o objetivo não for beneficiar o receptor, mas proteger o público, a questão é mais complicada. Normalmente, não temos que dar consentimento para ser encarcerados ou colocados em quarentena, por exemplo. Estas são situações impostas pelo Estado. Então, será que podemos ignorar o consentimento no caso da castração química para pessoas que estão presas?

Crédito, Danny Lawson / PA
E, embora alguns criminosos possam preferir que seus desejos sexuais problemáticos sejam suprimidos, a castração química pode ter efeitos colaterais significativos, incluindo ganho de peso e mudanças de humor.
Se a castração química de fato reduzir os desejos problemáticos, os agressores sexuais podem se beneficiar dela, apesar dos efeitos colaterais.
Mas não está claro exatamente como esse “benefício” em potencial deve ser entendido. É benéfico para os agressores sexuais ter seus desejos sexuais atenuados? Evitar punições futuras conta como um benefício? Também pode ser benéfico para os criminosos que não consentirem com a intervenção? E será que é eticamente admissível fornecer castração química sem benefício para o receptor?
Precisamos de uma compreensão mais claramente articulada do benefício, e da sua relação com o consentimento, para determinar quando a castração química é eticamente admissível.
É legal?
A finalidade também é importante para a justificativa legal. As intervenções que usam meios médicos — como a castração química — geralmente são legais, mais uma vez, porque se espera que beneficiem os receptores. Portanto, novamente, a falta de clareza sobre quem “se beneficia” e como o benefício deve ser entendido é um problema.
Minha análise do arcabouço legal na Inglaterra e no País de Gales mostra que fornecer castração química a agressores sexuais pode ser consistente com as obrigações impostas às autoridades públicas do Reino Unido de acordo com a Convenção Europeia de Direitos Humanos (por meio da Lei de Direitos Humanos de 1998).
Esse pode ser o caso mesmo sem o consentimento dos receptores, especialmente quando o objetivo é a proteção pública. Mas aqui também é necessário esclarecer como o benefício ou o dano estão relacionados ao consentimento.
Um dilema para os médicos

Crédito, Getty Images
A implantação da castração química para agressores sexuais — seja voluntária ou obrigatória — também levanta dilemas éticos e legais para as pessoas que administram o programa.
O psiquiatra forense Don Grubin disse que a administração da castração química é “a respeito de médicos tratando pacientes, em vez de médicos fazendo um trabalho para as agências de justiça criminal, mas um efeito colateral é que a reincidência provavelmente vai ser reduzida”.
No entanto, não está claro que a castração química deva ser sempre entendida sobretudo como “médicos tratando pacientes” da maneira que normalmente esperamos nas intervenções terapêuticas.
A ideia de que os médicos, ao administrar a castração química, estão sempre agindo principalmente para beneficiar o receptor, e que a proteção pública na forma de redução do risco de reincidência é um mero efeito colateral, obscurece as questões éticas e legais em jogo.
Uma abordagem melhor é esclarecer os diferentes valores e deveres em jogo — e como os médicos e outras pessoas envolvidas na prestação deste serviço devem colocá-los na balança.
A castração química vai gerar, com frequência, deveres conflitantes, com os quais precisamos encontrar maneiras de lidar. É compatível com as obrigações profissionais realizar intervenções que não sejam do interesse clínico dos receptores, se isso beneficiar outras pessoas? As obrigações profissionais variam de acordo com a finalidade da intervenção?
A castração química expõe tensões nas obrigações éticas e legais que os provedores individuais e institucionais têm com os receptores e com a sociedade.
Estou analisando estas questões em uma pesquisa que investiga como devemos entender, avaliar e regulamentar intervenções com dupla finalidade. Estas são questões que o governo e aqueles que estão envolvidos na castração química de criminosos sexuais também precisam encarar de frente.
* Lisa Forsberg é pesquisadora no Uehiro Oxford Institute, na Universidade de Oxford, no Reino Unido.