O mês de abril registrou o menor número de acordos de financiamento de startups de criptomoedas em quatro anos. Mais do que um declínio inesperado em um momento de alta do mercado e crescente adoção institucional, a tendência revela a falência do modelo de financiamento baseado em investimentos milionários de fundos de capital de risco (VCs), afirmou Guilherme Matarazzo, sócio da Tupix Capital, em um artigo publicado na Exame.
Matarazzo aponta que o modelo tradicional de investimento dos fundos de capital de risco se revelou ineficiente nas duas pontas, tanto para os investidores quanto para os fundadores.
Nesse modelo, os investidores aportam capital em fundos de investimento que, por sua vez, elegem os projetos a serem financiados em troca de participação acionária.
Segundo Matarazzo, o modelo é ineficiente para os investidores porque eles “têm seu capital imobilizado por 10 a 15 anos e arcam com taxas de 2% de administração e 20% sobre os lucros, para obter um retorno que segue a lógica de Pareto, segundo a qual 80% das startups fracassam ou geram ganhos insignificantes, enquanto os 20% restantes precisam compensar essas perdas, pagar os custos de administração do fundo e também gerar o lucro para seus cotistas.”
Em paralelo, valuations inflacionados devido à saturação do mercado reduzem os ganhos potenciais. Assim, além de representar uma aposta de longo prazo, os custos e incertezas desse modelo têm se tornado cada vez maiores.
Matarazzo cita dados da Cambridge Associates, empresa de consultoria e gestão de investimentos, para comprovar sua tese. Os retornos de fundos de capital de risco nos Estados Unidos estão em queda de 2,7% nos últimos três anos, enquanto, por exemplo, os índices Nasdaq e o S&P500 valorizaram 8,5% e 10,5% no mesmo período, respectivamente.
Na teoria, a vantagem de investir em fundos de capital de risco de baixa liquidez e risco elevado deveria ser compensada por retornos superiores, mas os dados mostram que esse não tem sido o caso.
Os fundadores também não se beneficiam do modelo. A garantia de capital para avançar com o negócio vem acompanhada de um alto custo gerencial, uma vez que, geralmente, as startups “cedem participações expressivas, perdem controle sobre o negócio e ainda são obrigadas a oferecer preferência em eventos de liquidez”, diz Matarazzo.
Tokenização pode criar um novo paradigma
Matarazzo sugere que o mercado precisa adotar modelos que concedam maior liquidez e flexibilidade para investidores e fundadores. E a resposta pode estar em um setor do mercado de criptomoedas em ascensão, afirma o executivo:
“A tokenização permite que startups levantem capital de forma descentralizada, acessando uma base global de investidores.”
A estruturação econômica desses tokens (tokenomics) permite que os fundadores ofereçam aos investidores participação sobre a receita e direitos de governança. Tokenomics mais sólidos potencializam a atração de investidores ao estabelecer métricas de valuation confiáveis, assim como ocorre nos mercados tradicionais.
Os VCs, por sua vez, ganham a possibilidade de entrar e sair de posições com facilidade em mercados secundários públicos, seja por meio de exchanges centralizadas ou descentralizadas, destaca Matarazzo:
“Essa capacidade de rotacionar a carteira no mercado secundário representa um ganho de eficiência, permitindo que investidores ajustem suas posições com agilidade e fundadores mantenham maior controle sobre a evolução do projeto. O resultado é um modelo de Venture Capital mais dinâmico, responsivo e alinhado às demandas do mercado contemporâneo.”
Na prática, os investidores operam em ciclos mais curtos, visto que o tempo médio de desenvolvimento de projetos na Web3 é de dois a cinco anos; têm acesso à liquidez imediata; e possuem flexibilidade para alterar seus portfólios.
Por sua vez, os fundadores podem fazer captações públicas acessando uma ampla base de usuários por meio de ICOs (ofertas iniciais de moedas) e IDOs (ofertas iniciais via DEX); têm maior controle sobre os fundamentos econômicos do projeto, limitando a diluição de seu próprio capital; e podem estabelecer parâmetros de governança concedendo poder de decisão aos detentores dos tokens, de acordo com os princípios de descentralização do mercado de criptomoedas.
Matarazzo argumenta que o principal benefício da tokenização para financiamento de projetos é o alinhamento de incentivos – “não apenas investidores e fundadores, mas também os usuários, colaboradores e membros da comunidade de um projeto.”
“No modelo tradicional, esses grupos perseguiam objetivos diferentes: investidores buscavam retornos financeiros e uma saída lucrativa; fundadores priorizavam o crescimento do negócio e a manutenção do controle; enquanto usuários desejavam um produto de qualidade, porém sem participar dos ganhos financeiros”, explica o executivo.
A tokenização cria um ciclo virtuoso de cooperação, elevando o comprometimento entre todas as partes e o potencial de sucesso dos projetos, conclui Matarazzo.