O Orçamento de 2025 prevê R$ 8,5 bilhões em emendas parlamentares de comissão “paralelas”, vinculadas oficialmente ao Executivo, mas controladas, na prática, pelo Legislativo, aponta um relatório da Transparência Brasil. O mecanismo foi criado por um acordo entre o Palácio do Planalto e o Congresso e vai na contramão das exigências do Supremo Tribunal Federal (STF) para aumentar a transparência no pagamento de emendas.
Segundo a Transparência Brasil, é a primeira vez que esse mecanismo é adotado em quatro anos nas emendas de comissão, cuja indicação é realizada pelos colegiados do Congresso, da Câmara dos Deputados ou do Senado. Com isso, o volume de emendas de comissão chega ao maior patamar desde 2020, destaca o relatório. A mesma prática já é usada desde 2021 nas emendas de bancada.
“A criação das emendas de comissão ‘paralelas’ é mais uma das manobras do Congresso Nacional para manter o poder sobre fatia considerável do orçamento federal após o STF julgar o orçamento secreto inconstitucional”, disse a Transparência Brasil, em relatório, destacando o agravante de ter sido viabilizada por acordo com o Executivo. “É um escárnio com a demanda da sociedade por mais transparência e moralidade nos gastos públicos”, completou.
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Essa manobra foi possibilitada por uma instrução normativa, assinada pelo relator do Orçamento de 2025, senador Ângelo Coronel (PSD-BA), que estabeleceu regras excepcionais para apresentação de emendas. Pela norma, Coronel ficou responsável por definir o código das emendas de comissão.
As emendas de comissão “paralelas” não receberam o identificador de resultado primário RP 8, que identifica gastos decorrentes de emendas de comissão, mas sim os códigos RP 2 (R$ 4,5 bilhões) e RP 3 (R$ 4,0 bilhões), que são referentes a gastos do governo federal. As RP3 são destinadas a gastos do governo com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
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Dessa forma, na execução orçamentária, os recursos das emendas de comissão “paralelas” poderão se misturar aos demais gastos do governo federal identificados como RP 2 e RP 3, caso o Executivo não estabeleça uma forma de rastreá-los, aponta a entidade.
Para Transparência Brasil, é necessário que o governo federal adote um identificador único para diferenciar as emendas “paralelas” de seus demais gastos discricionários na execução das despesas. Mantida a divisão atual, a prática se assemelha ao “Orçamento Secreto”, proibido pelo STF.
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“Se o governo não adotar tal prática, agirá de forma contrária às determinações do Supremo Tribunal Federal (STF) quanto à obrigatoriedade de total transparência e rastreabilidade do orçamento e mais um orçamento secreto será estabelecido”, disse a entidade no relatório.
“É lamentável que dois poderes da República simulem esforços para estarem em conformidade com o ordenamento constitucional e as decisões do STF relativos a emendas elaborando regras e, ao mesmo tempo, ignorando-as e contornando-as em benefício próprio”, criticou a Transparência Brasil no documento.
Ações genéricas
Do total de R$ 8,5 bilhões, a Transparência Brasil aponta que R$ 7,1 bilhões são direcionados para ações genéricas. O destino final do dinheiro só é conhecido quando os presidentes das comissões do Congresso enviam ofícios aos ministérios para distribuição dos recursos, em um processo definido pela entidade como “pouco transparente e pouco articulado com o planejamento federal”, o que favorece o uso político, segundo a Transparência.
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De acordo com o levantamento, órgãos que tradicionalmente são usados para acomodar interesses políticos na distribuição de emendas aparecem entre os 10 maiores destinatários das emendas de comissão “paralelas”.
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É o caso de Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), com R$ 242 milhões, Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf),com R$ 218 milhões, e Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs), com R$ 154 milhões.
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Na divisão da verba, mais da metade, um montante de R$ 4,9 bilhões, foi destinada ao Senado, liderado por Davi Alcolumbre (União-AP). O valor é, inclusive, maior do que o total de emendas de comissão da Casa Legislativa, que somam R$ 3,8 bilhões. Na Câmara, presidida pelo deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) são R$ 2,8 bilhões em emendas de comissão RP 2 e RP 3.