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domingo, maio 18, 2025

A morte precoce do presidencialismo de coalizão

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No debate público, tornou-se recorrente a ideia de que o presidencialismo de coalizão está esgotado — “morreu” — e de que, para ser compreendido, precisa ser rebatizado. Esse argumento ganhou força recentemente, depois de o deputado Pedro Lucas Fernandes (União-MA) recusar o convite para assumir o Ministério das Comunicações no governo Lula. Comentou-se que, hoje, vale mais a pena permanecer como deputado que aceitar um cargo ministerial.

No entanto essa leitura simplifica demais a dinâmica institucional. A relação entre Executivo e Legislativo pode ser avaliada com base em três parâmetros fundamentais — e o governo Lula enfrenta dificuldades em dois deles. A percepção de crise no presidencialismo de coalizão, portanto, precisa ser qualificada: não foi necessariamente o modelo que fracassou, mas sim sua implementação atual, marcada por falhas em aspectos cruciais da articulação política.

O primeiro parâmetro é institucional e diz respeito à gestão da coalizão. Lula montou uma aliança ampla (16 dos 19 partidos do Congresso), ideologicamente heterogênea (do PSOL ao União Brasil), mas concentrou poder no PT, que ficou com 22 ministérios, enquanto os principais aliados receberam apenas três pastas cada. Essa configuração elevou os custos de coordenação e intensificou a pressão por emendas orçamentárias — instrumento que, desde as reformas iniciadas em 2014, o governo já não pode mobilizar da mesma forma para construir sua base legislativa.

O segundo parâmetro combina dimensões institucionais e políticas e se refere à articulação do governo em contexto de crescente fortalecimento do Congresso desde meados dos anos 2000. Com parlamentares cada vez mais engajados na formulação de políticas públicas, o Executivo deveria adotar uma estratégia proativa — e não reativa, como tem sido a regra, sendo frequentemente surpreendido no processo legislativo. No caso da anistia aos acusados de golpe, reportagens revelam que o Supremo Tribunal Federal (STF) precisou intervir, cobrando do governo uma atuação mais incisiva para barrar o avanço da proposta.

O terceiro parâmetro é contextual e trata da disposição das lideranças do Congresso ao diálogo com o Executivo. A saída de Arthur Lira da presidência da Câmara e a ascensão de Hugo Motta, somada à influência de Davi Alcolumbre no Senado, poderiam facilitar a vida do governo, mas esse movimento ainda não se concretizou totalmente. Soma-se a isso a baixa popularidade do presidente, que reduz seu capital político nas negociações com o Legislativo.

Esses três parâmetros mostram que ainda há margem para ação por parte do governo. É possível reconfigurar a coalizão, mesmo com um Congresso majoritariamente à direita. Para isso, seria necessário reduzir o peso do PT na distribuição de cargos e espaços. Também é viável construir uma articulação mais proativa, com maior presença em comissões e no plenário, assumindo o protagonismo do processo legislativo. Sem testar mudanças nesses dois parâmetros — a configuração da coalizão e a estratégia de articulação política —, é precipitado decretar o fim do presidencialismo de coalizão.

*Beatriz Rey é pós-doutoranda na Universidade de São Paulo e pesquisadora associada à Fundação POPVOX, nos EUA

[Fonte Original]

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