São sensatas as medidas adotadas pelo governo para pôr ordem no uso de ensino à distância (EaD) em cursos de nível superior. A nova regulação pretende exigir padrões mínimos de qualidade, para que o EaD deixe de ser uma forma de distribuir diplomas sem valor no mercado de trabalho. O decreto assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva proíbe que cursos de medicina, Direito, enfermagem, psicologia e odontologia possam ser feitos à distância. Também passam a ser obrigatórias provas presenciais ao final dos cursos.
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O EaD deu um salto com a pandemia sem que a regulação acompanhasse a expansão tecnológica. Evidentemente a tecnologia tem seu valor. É adequada a regiões remotas como a Amazônia e também como ferramenta pedagógica para atingir um contingente maior de alunos. Mas é preciso haver mecanismos de aferição do aprendizado. Depois de quase triplicar nos últimos oito anos, de 1,7 milhão para 4,9 milhões de alunos, é fundamental fazer os ajustes necessários no sistema de ensino superior do país.
Em 2023, do total de estudantes matriculados em cursos de graduação no Brasil, 3,3 milhões estudavam à distância e apenas 1,6 milhão assistiam a aulas presenciais. A distorção é evidente, pois diversas áreas exigem interação direta com professores e experiência prática. É o caso da enfermagem, curso que 41% faziam à distância em 2023 — e agora passará a ser obrigatoriamente presencial. Talvez o maior símbolo das distorções seja a educação física: dos 283 mil alunos, 204 mil estudavam à distância.
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Ainda na área de saúde, as faculdades de farmácia, biomedicina e fisioterapia poderão adotar um novo modelo semipresencial, com metade das aulas à distância, 30% on-line e ao vivo — com não mais de 70 alunos por sala — e 20% presenciais. O mesmo modelo valerá para os cursos de licenciatura. Não era mais possível continuar com um modelo em que a carga horária do EaD não parava de aumentar, enquanto o aprendizado prático se resumia a estágios.
Os polos que as universidades especializadas em EaD são obrigadas a manter para atendimento a alunos vinham sendo negligenciados. “O decreto exige uma quantidade de professores e mediadores formados na área compatível com o número de estudantes”, afirma nota técnica do Instituto Península, especializado em análise do trabalho docente. “Isso corrige problemas antigos, de quando pessoas sem a formação certa acompanhavam alunos, o que prejudicava a qualidade do ensino.” No período de transição de dois anos, as universidades terão de equipar tais polos com sala de recepção, espaço para estudos, laboratórios e sinal de internet.
As normas adotadas no decreto vão na direção correta. Agora, é imprescindível que o MEC considere as mudanças como o início de uma fase de aperfeiçoamento, para que os estudantes brasileiros possam tirar o melhor benefício tanto da tecnologia quanto do conhecimento e da experiência transmitidos presencialmente.